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O senador Roberto Rocha (PSDB-MA), relator da PEC 110/2019 no Senado.
O senador Roberto Rocha (PSDB-MA), relator da PEC 110/2019 no Senado.| Foto: Beto Barata/Agência Senado

Enquanto a reforma do Imposto de Renda, aprovada na Câmara e em análise no Senado, continua extremamente controversa, a PEC 110/19 pode ter um caminho um pouco mais tranquilo. O substitutivo do senador Roberto Rocha (PSDB-MA) já conta com apoio de entidades que representam os interesses dos municípios e dos secretários estaduais de Fazenda – a divisão do bolo tributário entre União, estados e municípios é sempre tema sensível e capaz de enterrar qualquer reforma –, e passou a ter o aval do ministro Paulo Guedes após algumas alterações feitas pelo relator, em comum acordo com representantes dos governos estaduais.

A PEC 110 surgiu no Senado, aproveitando a versão do ex-deputado Luiz Carlos Hauly para a PEC 293/04 e que chegou a ser aprovada na Câmara antes de acabar arquivada. Originalmente, ela previa o fim da CSLL, incorporado ao Imposto de Renda Pessoa Jurídica, e a unificação de nove tributos cobrados pelas três esferas da Federação (IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, CSLL, Cide-Combustíveis, salário-educação, ICMS e ISS) em um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e um “imposto seletivo”. Na versão mais recente, a simplificação é menor: PIS e Cofins virariam a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), federal; ICMS e ISS se tornariam o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), subnacional (configurando, assim, o chamado “IVA dual”); e o IPI seria transformado no “imposto seletivo”. Além disso, também estão previstas mudanças em outros dois tributos estaduais: o IPVA, com a cobrança sobre embarcações e aeronaves; e o ITCMD, que seria progressivo.

Simplificação e transparência são importantes, mas, sozinhas, não farão a reforma tributária de que o Brasil realmente necessita

Embora a simplificação seja menor que na versão original, Rocha defendeu a proposta, afirmando que o Brasil ainda é um dos poucos países sem um IVA e que a reforma deixará a tributação mais transparente para o cidadão. “Os impostos indiretos são próprios de países não democráticos, porque mascaram a arrecadação. Imposto direto, que o cidadão conhece, sente e sabe é o Imposto de Renda – quando você recebe o contracheque está lá –, o IPTU, o IPVA”, disse em evento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) na manhã desta terça-feira.

Simplificação e transparência são qualidades essenciais para a reforma tributária – o modelo brasileiro de tributação sobre a produção e o consumo permitem que o brasileiro tenha, no máximo, uma estimativa do valor de impostos embutidos no que adquire, ao contrário do que ocorre em outros países, onde a tributação é acrescentada no momento de pagar pelo item. Mas simplificação e transparência, sozinhas, não farão a reforma tributária de que o Brasil realmente necessita, e é este o ponto que nem a PEC 110 isoladamente, nem o conjunto de projetos de lei e PECs de reforma tributária apresentadas no Congresso Nacional parecem dispostos a enfrentar.

No mesmo evento, Rocha afirmou ter consciência de que, hoje, a maior parte da arrecadação do país vem dos impostos sobre produção e consumo. Toda a discussão recente sobre os combustíveis e o peso da tributação sobre seu preço final fizeram parte da população acordar para essa verdade. No entanto, esse tipo de tributo – seja oculto, seja transparente – é o que mais está em desacordo com o princípio da “justiça tributária”, que pode ser resumido na expressão “quem tem mais paga mais”. O rico que abastece seu automóvel ou compra alimentos paga, em cada litro de combustível ou quilo de arroz, o mesmo valor em impostos que os demais brasileiros, sejam da classe média ou pobres – valor que pode ser irrisório para o rico, mas que faria muita diferença para o orçamento dos mais pobres. O problema não é que esses tributos existam, mas que respondam por uma parcela da arrecadação total muito maior que impostos sobre patrimônio ou renda, que são cobrados de forma mais proporcional às posses de cada contribuinte e, assim, estariam em maior conformidade com a ideia de “justiça tributária”, necessária em um país desigual como o nosso.

O mais provável, à medida que avancem os projetos de reforma tributária hoje no Congresso, é que os progressos acabem se resumindo mais à simplificação e à transparência – necessárias, é preciso repetir – e a alguns ganhos específicos, como a correção de ao menos parte da defasadíssima tabela do Imposto de Renda Pessoa Física e, talvez, da desoneração da folha de pagamento, removendo um entrave para a geração de empregos. Ficará a impressão de que teria sido possível ir muito mais longe, reorientando a tributação brasileira para algo igualmente simples e transparente, mas também mais justo e que não onerasse demais os brasileiros mais pobres. No entanto, esta é uma tarefa complexa; com a intenção do Congresso de encerrar a discussão sobre a reforma até o fim do ano, parece impossível que uma guinada tão drástica seja feita em apenas um mês e meio.

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