| Foto: Lula Marques/Agência PT

A segunda votação da PEC do Teto no Senado, prevista para esta terça-feira e que deve concluir a tramitação da proposta de emenda constitucional desejada pelo governo como meio de controle dos gastos públicos, exibe as peculiaridades da política brasileira atual: uma oposição fraca, incapaz de se impor no Legislativo ou nas ruas, dá a oportunidade ao governo federal de conseguir realizar as reformas necessárias, mas as maiores dificuldades para Michel Temer surgem de dentro do próprio governo e derivam das escolhas do presidente da República.

CARREGANDO :)

A chance de ouro que Temer pode desperdiçar para fazer o país avançar veio do esfacelamento das esquerdas. Derrotado fragorosamente nas urnas de outubro, a presença do PT na cena política foi drasticamente reduzida, graças à rejeição que a legenda cultivou durante os desgovernos de Lula e Dilma, marcados pela corrupção. As divergências internas sobre o rumo que o partido deve tomar consomem as energias que seus quadros poderiam usar fazendo oposição. Outros partidos de linhagem esquerdista foram igualmente levados pela enxurrada – com a possível exceção do PSol, que chegou a disputar o segundo turno no Rio de Janeiro, mas também acabou derrotado.

O governo vive uma crise que não se deve a nenhum fator externo

Publicidade

Enquanto isso, manifestantes invadiram escolas e pretendiam realizar uma “primavera secundarista” que murchou graças a decisões judiciais e, principalmente, à oposição vinda da própria comunidade escolar e da opinião pública. Os gritos de “fora, Temer” também não encontram acústica suficiente; seus protestos só reúnem a militância tradicional que orbita o petismo e invariavelmente terminam em violência e vandalismo, como ocorreu em Brasília em 29 de novembro e em Curitiba no último domingo. A greve geral anunciada para 25 de novembro foi um fiasco.

Caminho aberto para Temer conseguir realizar as reformas impopulares, mas necessárias? Não necessariamente. A PEC do Teto deve ser aprovada, é verdade; no entanto, o governo vive uma crise que não se deve a nenhum fator externo, mas à própria incapacidade de saber distinguir entre o interesse público e o interesse privado. Foi o caso de Geddel Vieira Lima, poderoso ministro da Secretaria de Governo que buscou servir-se do cargo para defender o interesse particular de ganhar vista privilegiada para a Baía de Todos os Santos do alto de um edifício embargado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Encontrou a resistência do ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero, que preferiu deixar o cargo e expôs a pressão que recebeu.

Temer também parece também não ter percebido a seriedade do problema e enrolou o quanto pôde para, por fim, aceitar uma carta de demissão de Geddel, quando já balançava a credibilidade que o presidente procurava evocar junto à opinião pública. O episódio lembrou o início de seu governo, quando Temer se viu obrigado a afastar quatro ministros, todos eles enrolados na Lava Jato ou dispostos a “estancar a sangria” produzida pela operação. Nem por isso abandonou seus auxiliares, dentre os quais o senador Romero Jucá, o primeiro a cair, mas “absolvido” posteriormente com a designação de líder do governo no Senado. E que não se esqueça de Renan Calheiros, o presidente do Senado de quem Temer depende para conseguir fazer passar qualquer medida de seu interesse no Congresso.

Calheiros, Geddel, Jucá... é apoiado em gente desse quilate que Michel Temer espera deixar um legado para o país? Em políticos que desfiguraram as Dez Medidas Contra a Corrupção, que pretendiam fazer passar uma absurda lei sobre abuso de autoridade, e que agora aparecem – ao lado do próprio Temer – em delações vazadas para a imprensa que mostram as entranhas da relação entre políticos e empreiteiras? Se falhar, este governo não terá a quem culpar, a não ser a si próprio.

Publicidade