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Os primeiros dias do governo de Jair Bolsonaro foram pródigos em celeumas, muitas delas injustificadas. Foi assim com o reajuste do salário mínimo, em que o presidente foi “culpado” de aplicar a regra estabelecida por Dilma Rousseff. E, da mesma forma, com a discussão primária sobre o que evidentemente era uma metáfora da ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves, que usou cores de roupa de crianças para se referir às naturais diferenças entre os sexos – curiosamente, a dimensão que o assunto tomou levou a imprensa a ignorar a real notícia vinda de seu ministério naquele dia, o cancelamento de um contrato milionário entre a Funai e uma universidade federal para a criação de uma “criptomoeda indígena”. No entanto, em um caso a indignação é tão justificada que mesmo apoiadores do presidente manifestaram seu descontentamento: a nomeação de um filho do vice-presidente da República para uma assessoria da presidência do Banco do Brasil.

Antônio Hamilton Rossell Mourão, filho do general Hamilton Mourão, foi nomeado pelo novo presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, para uma das três posições de assessor especial a que Novaes tem direito. O salário é de R$ 36,3 mil, maior até que o do vice-presidente, e três vezes maior que os vencimentos de Rossell até agora. Ele seguirá realizando a mesma função que vinha exercendo, na área de agronegócio, mas passará a aconselhar diretamente o presidente do banco.

O brasileiro não elegeu Bolsonaro e Mourão para que fossem apenas um pouquinho melhores que Lula e Dilma

Rossell Mourão, justiça seja feita, não é nenhum Lulinha, o “Ronaldinho” do ex-presidente Lula que foi catapultado da irrelevância para a vida de milionário. O filho do vice-presidente é formado em Administração, com pós-graduação nas áreas de agronegócio e desenvolvimento sustentável. Funcionário de carreira do BB, tendo ingressado no banco por concurso 18 anos atrás, ele trabalha com agronegócio dentro da instituição há 11 anos.

Mas não são as qualificações de Rossell Mourão que estão em jogo, e sim a mensagem que sua nomeação envia à sociedade, especialmente quando o vice-presidente defende a decisão, alegando que, durante os governos petistas, Rossell tinha sido perseguido por ser filho de um militar que se indispôs com o Planalto – Mourão chegou a ser exonerado da chefia do Comando Militar do Sul após críticas à presidente Dilma Rousseff. A colunista Madeleine Lacsko, da Gazeta do Povo, mostrou, no entanto, que a realidade é um pouco diferente: Rossell Mourão recebeu várias promoções durante governos petistas, mas, quando teve a oportunidade, não se candidatou aos cargos que o ajudariam a chegar à assessoria especial da presidência do banco.

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A nomeação não é ilegal, pois não configura nepotismo, mas é certamente imoral. O brasileiro não elegeu Bolsonaro e Mourão para que fossem apenas um pouquinho melhores que Lula e Dilma, até porque superar o petismo no campo moral e econômico não é nada difícil. O que o eleitor espera são mudanças reais na forma de se fazer política no Brasil, o que também inclui as nomeações para cargos comissionados. O deputado federal eleito Paulo Martins (PSC-PR), aliado de Bolsonaro, resumiu a questão em mensagens publicadas em seus perfis nas mídias sociais: “Acredito na qualificação do profissional, mas a Presidência e a Vice-Presidência exigem sacrifícios, inclusive de familiares. A mensagem transmitida é a da promoção de um filho de um poderoso, por mais que o filho tenha seu brilho”.

Diz a lenda que o presidente Castello Branco, ao saber que seu irmão, funcionário da Fazenda Nacional, havia recebido um carro dos colegas, mandou que o presente fosse devolvido. Por telefone, o irmão argumentou que isso o desmoralizaria no cargo, ao que o marechal respondeu que ele já não tinha mais cargo: “Afastado você já está; estou decidindo se você será preso ou não”. Verdadeira ou não, a história reforçou uma imagem de austeridade do militar, e poderia inspirar Mourão, para que repense a maneira como vem lidando com a nomeação de Rossell e adote a postura que o brasileiro espera do vice-presidente.

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