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Avenida Cândido de Abreu, em Curitiba (PR)
A avenida Cândido de Abreu, em Curitiba, teria projeto-piloto para transformar vias em áreas de lazer aos finais de semana| Foto: Pedro Ribas/SMCS

Resumo desta reportagem:

  • O vereador Professor Euler (MDB), de Curitiba, enviou à prefeitura da capital uma sugestão para que a Avenida Cândido de Abreu seja fechada para carros aos domingos.
  • Outro parlamentar, Marcos Vieira (PDT), elaborou um projeto que expande o modelo para outras vias de Curitiba. O objetivo é criar novas áreas de lazer para os moradores nos finais de semana.
  • Especialistas em urbanismo dizem que a ideia é interessante, mas questionam como o projeto seria viabilizado em Curitiba e se a Cândido de Abreu é o melhor local para a iniciativa.
  • A prefeitura já tem um projeto itinerante de lazer, que fecha ruas uma vez por mês nas regionais. Há, ainda, um projeto para requalificar a Cândido de Abreu.

A Câmara de Vereadores de Curitiba encaminhou à prefeitura da capital paranaense uma sugestão para que a Avenida Cândido de Abreu, no Centro Cívico, seja fechada para carros aos domingos, transformando-se em um espaço de lazer para pedestres. A ideia, apresentada pelo vereador Professor Euler (MDB), é de que o fechamento da avenida funcione como um projeto-piloto, no trecho entre a Rua Lisymaco Ferreira da Costa e a Praça Rio Iguaçu.

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Sugestão semelhante foi apresentada pelo vereador Marcos Vieira (PDT), que elaborou um projeto de lei criando o programa “Rua para Todos”. A proposta, que aguarda apreciação dos parlamentares, prevê que ruas escolhidas pela prefeitura fiquem fechadas entre as 10h e as 16h, sempre aos domingos e feriados.

Várias cidades do Brasil e do mundo têm iniciativas desse tipo. Em São Paulo (SP), por exemplo, um projeto chamado Ruas de Lazer existe desde os anos 1970, permitindo que a população organize e execute atividades de lazer e recreação em 62 vias da cidade. Em 2016, outro projeto instituiu o fechamento da Avenida Paulista para carros aos domingos e feriados.

Para que o fechamento seja autorizado, é preciso que pelo menos 80% dos moradores da região concordem com a medida e assinem um abaixo-assinado. Além disso, a via não pode ter templos, hospitais ou cemitérios, ou tenha pontos de linhas regulares de ônibus, por exemplo.

Em Curitiba, a prefeitura já tem um projeto itinerante para fechar ruas e oferecer atividades de lazer. A iniciativa, porém, acontece apenas uma vez por mês (veja detalhes abaixo).

Participação dos moradores

Maria Carolina Maziviero, professora do departamento de Arquitetura e Urbanismo e da pós-graduação em Planejamento Urbano da Universidade Federal do Paraná (UFPR), afirma que esse tipo de projeto pressupõe uma inversão de lógica no uso do espaço público.

“O foco não deve ser o fato de a rua estar fechada para carros, mas sim de estar aberta para as pessoas. A ideia é que a cidade precisa ser devolvida para os moradores, sobretudo para comunidades locais, para quem de fato usa aquele espaço”, afirma.

Por isso, segundo a professora, essas iniciativas pressupõem algum grau de autonomia da população. “De forma geral, esses projetos são ótimos, mas é preciso deixar claro quem vai ser o protagonista. Se for a comunidade, são os próprios moradores que vão propor as atividades. Mas, se a prefeitura colocar muitas regras, acaba limitando um pouco essa forma de democratização do espaço. É preciso transferir um pouco o poder para as pessoas”, avalia Maziviero.

O vereador Professor Euler diz que é importante que a prefeitura estabeleça algumas normas, para que o projeto mantenha seu propósito e não “vire bagunça”. “Por exemplo, a prefeitura permitiria a entrada de food trucks ou não? É uma escolha que o município precisa fazer, sempre com a comunidade opinando”, afirma.

Em nota, o Conselho Comunitário de Segurança (Conseg) do Centro Cívico manifestou preocupação com a ideia. Entre os aspectos citados pela entidade como possíveis problemas estão a restrição ao direito de ir e vir dos moradores; o aumento do barulho e da perturbação do sossego; e o transtorno à mobilidade dos trabalhadores que usam linhas de ônibus.

Cândido de Abreu é o melhor local?

Simone Poli, professora da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), diz que ruas de lazer “com certeza devem existir”, mas que tem dúvidas sobre a Cândido de Abreu ser a via ideal para que um projeto desse tipo seja implantado em Curitiba.

“A gente não deve apenas copiar o modelo da Avenida Paulista. É outra cidade. Nós temos uma história, um desenvolvimento cultural e ambiental diferente do de São Paulo. (...) É preciso avaliar o contexto local. Por que não realizar uma pesquisa com os moradores da região para ver o que eles realmente querem? Será que a valorização do Passeio Público, por exemplo, não seria mais importante?”, questiona.

De acordo com a professora, implantar esse tipo de projeto em áreas com menos opções de lazer, em bairros mais distantes do Centro, pode ser mais interessante.

Lazer nas regionais

A prefeitura de Curitiba não tem obrigação formal de responder à sugestão enviada pelo vereador. Procurada pela Gazeta do Povo, a Superintendência de Trânsito (Setran) informou que não tem nenhum projeto ou estudo em andamento para o fechamento da Cândido de Abreu aos domingos.

A Secretaria Municipal de Esporte, Lazer e Juventude, por sua vez, disse que oferece 1.520 atividades de lazer e diversão ao longo do ano. Está inserido nesse pacote o programa Ruas de Lazer, que acontece 40 vezes no ano.

A iniciativa prevê o fechamento de uma rua uma vez por mês para o atendimento à comunidade com ações de lazer. Ela já acontece, em formato itinerante, nos núcleos regionais Portão, Boqueirão, Tatuquara e Bairro Novo. Há previsão de expansão para outras seis regionais até 2024.

Na região da Cândido de Abreu há atividades de lazer oferecidas pela prefeitura na rua XV de Novembro e no São Francisco.

Prefeitura tem projeto de requalificação

Já o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc) tem em andamento uma proposta própria de revitalização para a Avenida Cândido de Abreu. O projeto prevê a transformação de uma das duas faixas de veículos das vias marginais em um espaço destinado a pedestres e ciclistas. O local também será equipado com áreas de lazer, como praças.

O Ippuc já lançou editais para contratar projetos executivos para a obra. No final de abril ocorreu a fase de propostas, com três empresas interessadas. Agora, a licitação está em fase de julgamento.

Depois, a empresa vencedora precisará ser habilitada para que o contrato seja assinado e, com isso, os projetos comecem a ser elaborados. O prazo para conclusão dos projetos é de 235 dias corridos. Só então a prefeitura poderá fazer a licitação para a obra em si.

A Associação Comercial do Paraná (ACP) afirma ver "com bons olhos" o projeto de intervenção na Cândido de Abreu. De acordo com a entidade, as calçadas da avenida são subdimensionadas e há muitas interferências no fluxo de pedestres. Segundo nota da ACP, a obra trará benefícios "para o deslocamento a pé e por bicicletas, além de novas áreas de convivência e estacionamento".

Na opinião do vereador Professor Euler, a requalificação e o fechamento da avenida aos domingos não são duas iniciativas excludentes. “As mudanças propostas pelo Ippuc também são importantes, mas isso não impede que o local seja disponibilizado para o lazer da população nos finais de semana”, diz.

O Conseg do Centro Cívido afirma ver com preocupação a política de concessão de alvarás para bares, distribuidoras de bebidas alcoólicas e tabacarias que pode ser implementada a partir da obra de revitalização. Segundo o Conselho, há "alto risco [da iniciativa] agravar a problemática de perturbação do sossego público que já aflige a comunidade do bairro".

"Não é desejável que o Centro Cívico seja 'conectado ao Setor Histórico' para ser tomado pelo poderoso lobby das bebidas alcoólicas e pela criminalidade", completa o texto.

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