O Governo do Paraná renovou, no início da semana, a concessão com a Companhia Paranaense de Gás (Compagas), distribuidora de gás natural controlada pela Companhia Paranaense de Energia (Copel). O novo contrato entra em vigor em 2024, valerá pelos próximos 30 anos e é um forte sinal na direção de privatização da própria Compagas. Representantes do setor produtivo no Paraná ouvidos pela Gazeta do Povo apoiaram a iniciativa de concessão da distribuidora de gás natural à iniciativa privada, mas também teceram críticas a detalhes presentes na nova concessão.
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Segundo o gerente de Assuntos Estratégicos do Sistema Fiep, João Arthur Mohr, o valor final do gás natural é composto por três variáveis. A primeira é o valor do gás propriamente dito, que é definido pela Petrobras e está sujeito a flutuações provocadas por fatores externos e, nas palavras do gerente da Fiep, “incontroláveis”, como a guerra na Ucrânia. A segunda são os impostos e a terceira é a margem de distribuição, que é o que a Compagas cobra pela distribuição como forma de manter sua estrutura.
Na margem de distribuição, explicou Mohr em entrevista à Gazeta do Povo, é onde devem ser percebidas as principais mudanças positivas do novo contrato. O indexador de reajustes atual, e que seguirá em vigor até 2023, é o Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI), que segundo o gerente apresenta uma grande volatidade por estar atrelado a fatores como cotação do dólar e preços de commodities. Já o indexador previsto na nova concessão é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do país. Nos últimos cinco anos, o IGP-DI acumulou 77%, segundo Mohr; já o IPCA, no mesmo período, acumulou 32%.
Novo modelo regulatório
Além da mudança no indexador da margem de distribuição, outra das diferenças do novo contrato com o acordo atualmente em vigor está o modelo regulatório – que deixa de ser do tipo cost plus e passa para o modelo price-cap (tarifa teto). Essa mudança agradou o gerente de Assuntos Estratégicos do Sistema Fiep. Para Mohr, essa atualização representa um avanço em relação ao modelo anterior e pode ajudar numa eventual redução na tarifa cobrada dos consumidores pela Compagas.
“Todos os investimentos e os custos da concessionária eram remunerados a uma taxa de 20% ao ano, fora a inflação. Não existia um incentivo à otimização de custos, quanto mais se gastava mais era arrecadado. Agora os investimentos serão remunerados em 9,125% ao ano, com base no custo médio ponderado de capital (WACC). Só que nada do custeio será remunerado. Assim, a empresa terá que focar na eficiência e gastar o menos possível. No final das contas, a tarifa tende a ficar mais baixa para o usuário”, explicou.
Tabela de transição entre contratos merece atenção
Um ponto elencado por Mohr como sendo uma “luz amarela” na renovação da concessão é a transição do contrato atual para o novo modelo. De acordo com o gerente da Fiep, essa tabela de transição ainda não foi homologada pela Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Paraná (Agepar). É preciso conferir se os novos valores, que serão praticados a partir do início de 2023, trarão alguma redução para os consumidores.
“Temos uma expectativa de que haja uma redução significativa no preço do gás. É um ponto de atenção que precisamos ter junto à Agepar. É uma redução que os consumidores residenciais talvez não sintam tanto, deve ser mais percebida pelos grandes consumidores industriais. O nosso setor industrial precisa ter uma redução. Esperamos que essa tabela entre em vigor por volta de fevereiro, e se vier essa redução esperada poderemos ter um ganho de competitividade na indústria paranaense”, avaliou Mohr.
Outorga milionária é criticada por gerente da Fiep
O ponto negativo apontado por ele na nova concessão é o bônus de outorga que deverá ser pago pela Compagas ao Governo do Paraná. Segundo o gerente, houve uma “luta” para acabar com a “tradição” da outorga, presente no mercado de energia. Mas a empreitada não foi bem-sucedida. O valor, mais de meio bilhão de reais, segue presente no novo contrato de concessão e será repassado pela companhia de gás ao Governo do Paraná para que seja revertido em investimentos no Estado.
“Nós sabemos que esses R$ 500 milhões estarão diluídos na tarifa cobrada dos consumidores. Se não houvesse essa outorga, certamente a tarifa ficaria um pouco menor. Nós conseguimos avançar em vários pontos na negociação com as partes, mas este foi um ponto em que não foi possível fazer a retirada da nova concessão”, lamentou o gerente de Assuntos Estratégicos do Sistema Fiep.
Sindilouça também discorda de outorga na concessão do gás natural
A avaliação é similar à de Fábio Germano, presidente do Sindilouça, que representa as indústrias de louças, porcelanas, vidros e revestimentos cerâmicos, setores que são grandes consumidores do gás natural. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele também se mostrou favorável à iniciativa de privatização da Compagas, mas não concorda com a cobrança da outorga no novo contrato e com a falta de transparência na divulgação da nova margem de distribuição durante a transição entre os dois contratos.
“Sou sincero em dizer, não consigo ver essa renovação com bons olhos. Isso foi feito na última semana do ano, está tudo muito no escuro. O governo não conversa com a gente desde fevereiro, quando apresentamos questionamentos em uma audiência pública. Houve, sim, alguns aspectos que apresentamos e que foram atendidos, mas a outros pontos não nos foi dado acesso”, comentou.
Procurada pela reportagem, a Agepar enviou uma nota nesta segunda-feira (2) afirmando que "a tabela de valores para o período de transição será tratada junto com a primeira atualização anual ordinária do custo do gás, que acontece em fevereiro, conforme previsto no atual contrato de concessão".
Questionamento na Justiça
Para Germano, é possível que a entidade que ele representa faça uma contestação judicial relacionada a pontos vistos por ele como polêmicos, como a outorga devida pela Compagas ao Governo do Paraná. Ele pontua que já há uma ação em curso, que pode ser atualizada com esses questionamentos relacionados à nova concessão.
“Nós temos uma discussão junto ao governo do Estado, uma ação cautelar que está em julgamento, sobre a base de ativos. O governo é o poder concedente, tem autoridade para assinar a concessão, e fez isso sem discutir essa questão. Essa outorga de meio bilhão de reais se baseia em ativos que já foram pagos pelos consumidores durante os anos de contrato, e não em investimentos feitos pelo Governo do Paraná. Vamos ter que pagar novamente pelo que já foi pago, algo parecido com as discussões do novo pedágio. Nós concordamos com a privatização, sem dúvida, mas não com a forma como esse processo está sendo feito, em especial em relação à outorga”, disparou.
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