Uma lei estadual sancionada em 2012 virou, oito anos depois, o centro de uma discussão entre a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e policiais militares. O desentendimento ocorre porque em um parecer emitido recentemente, a PGE afirma não ser dever do estado pagar pelas fardas utilizadas pelos militares estaduais, entendimento do qual discordam entidades representativas da categoria. A interpretação do órgão consultivo do estado foi manifestada com base na Lei 17.169, em uma consulta feita pela Secretaria de Estado da Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp).
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O objetivo do texto legal, sancionado em 24 de maio de 2012, era simplificar a remuneração dos policiais e bombeiros militares, mudando o sistema de pagamento, que era feito em forma de soldo e mais uma série de adicionais, como gratificações, salário-família, vantagem pessoal, ajuda de custo, prêmio especial, vencimentos de cargos em comissão, entre outros.
Com a lei, o sistema remuneratório deixava de ser feito em soldo e passava a ser feito por meio de subsídio, que incorporava mais de 30 adicionais e vedava novos acréscimos, com exceção de direitos previstos na Constituição Estadual, como terço de férias e gratificação natalina e verbas de caráter indenizatório, como diárias por deslocamento, por exemplo.
O que gera a discordância é que, entre as verbas previstas na lei a serem incorporadas ao subsídio, é mencionado um valor para compra de uniformes da PM. “Só que o valor para aquisição de fardamento tinha caráter indenizatório, não fazia parte dos vencimentos fixos do policial” e, portanto, não entrou no cálculo à época, diz o coronel Carlos Eduardo Assunção, presidente da Associação dos Oficiais Policiais e Bombeiros Militares do Estado do Paraná (Assofepar). “Houve um equívoco por parte do legislador quando produziu o texto”, avalia.
Código da PM: verba de fardamento não é incorporável ao salário
Segundo Assunção, que também é diretor de apoio logístico da PM, responsável pelas compras de uniformes, em 2018 a PGE já havia pacificado a questão, dando entendimento de que cabe ao estado a aquisição das fardas. Uma das bases legais é o Código da Polícia Militar do Paraná (Lei 1.943/1954), que, em seu artigo 211, classifica “fardamento” como vantagem atribuída ao militar e classificada como “não incorporável”.
Agora em 2020, uma nova consulta feita pela Secretaria de Segurança à PGE resultou na retomada da interpretação de que a verba para aquisição de uniformes já estaria incorporada ao subsídio dos PMs. “Temos absoluta convicção de que não tem sentido. Consultamos a situação de outros estados, das Forças Armadas e ninguém exige que o militar pague por sua farda com dinheiro do próprio bolso”, diz o presidente da Assofepar.
“Para se ter uma ideia, o estado custeia uniformes para a Polícia Civil e para a Polícia Científica, que nem precisam de uniforme, e não quer bancar a farda da PM, que é item obrigatório. Todo empregador, seja da iniciativa pública ou privada, que exige que o trabalhador use uniforme, deve prover o equipamento.”
A Associação de Praças do Estado do Paraná (Apra) tem o mesmo entendimento. “Por estarem servindo a população, o estado tem o dever de proporcionar os meios necessários para que os profissionais de segurança pública possam cumprir sua missão constitucional”, informa a entidade. A Apra orienta aos militares estaduais que, não sendo fornecido fardamento, façam uma comunicação interna, para evitar procedimentos disciplinares.
Conjuntos para PM custam R$ 5 mil
Cada PM precisa dispor de três tipos de uniformes obrigatoriamente. O conjunto principal é a chamada farda operacional, composta de boina, camiseta, gandola, calça, coturno, entre outros acessórios, como brasão da PM e da unidade a que pertence.
O segundo é o conjunto de representação, utilizado em solenidades e eventos sociais e composto de túnica, gravata, camiseta de botão, calça social, cinto e meia preta. O terceiro é um uniforme de educação física: agasalho completo, camiseta, calção e tênis. Um ingressante no quadro que tenha que adquirir todos os conjuntos gastaria por volta de R$ 5 mil, caso tivesse de bancar os custos.
Assunção explica que, à medida que vão sendo gastos, os equipamentos precisam ser repostos. “Cada item tem um prazo de duração. Uma bota tática, por exemplo, pode ser substituída de dois em dois anos. A jaqueta de frio tem duração de até cinco anos, já que é usada praticamente só no inverno”, diz. “O custo pode ser de R$ 5 mil este ano, no ano que vem de R$ 2 mil, dependendo do que terei de repor”
O diretor de apoio logístico da PM conta que já havia concluído a fase interna de um processo licitatório para aquisição de 60 mil conjuntos de calça e gandola, de padrão internacional, no valor total estimado em R$ 30 milhões. “Fizemos um grande estudo, ao longo de 14 meses, para encontrar as especificações ideais, que agradassem a todos, dentro do padrão que o governo encomendou, e o secretário de segurança diz que vamos ter de pagar do bolso”, lamenta.
Com o parecer da PGE, o procedimento está parado, segundo o coronel, e deve atrasar a compra de uniformes para PMs que trabalharão na Operação Verão, que ocorre no litoral do estado, a partir do fim de dezembro.
Na quinta-feira (30), o deputado estadual Soldado Fruet (Pros) encaminhou um ofício ao chefe da Casa Civil, Guto Silva, sugerindo o ressarcimento aos PMs pelo custo de aquisição de seus fardamentos, “diante da grave situação que o repasse do valor aos servidores causará para a subsistência deles e, consequentemente, para a segurança pública de toda a população do estado do Paraná”.
“Lembro que a classe policial, infelizmente, é uma das que tem maior déficit salarial e de pessoal em todas as atividades tidas como essenciais da Administração. Ademais, seus subsídios estão por anos sendo corroídos pela inflação e perda de gratificações que anteriormente eram concedidas”, diz trecho do documento.
Procurada pela reportagem, a Sesp informou que a manifestação a respeito do assunto não cabe à secretaria. A PGE informou que está estudando uma forma de resolver a situação. Confira a nota do órgão, na íntegra:
A Procuradoria-Geral do Estado faz a análise jurídica dos processos que lhe são enviados. Existe uma questão legal envolvendo este processo especificamente e está sendo estudada uma forma de resolver a situação.
O Estado do Paraná reconhece a importância e o valor do trabalho do Policial e do Bombeiro Militar e não está medindo esforços para solucionar a questão o mais breve possível.
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