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Bolsonaro e seus ministros durante discurso na Cúpula do Clima
Bolsonaro e os ministros Ricardo Salles (meio Ambiente) e Carlos França (Relações Exteriores) durante discurso na Cúpula do Clima: mudança de postura na diplomacia.| Foto: Marcos Correa/PR

De olho na reeleição no ano que vem, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pretende adotar um tom mais pragmático na política externa brasileira, encerrando conflitos com países e líderes mundiais com quem teve embates nos primeiros anos de seu mandato. A primeira sinalização foi feita ao presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, por meio de uma carta e do discurso adotado na Cúpula do Clima. Bolsonaro foi o último líder mundial a cumprimentar o presidente americano pela vitória nas urnas no ano passado.

Assessores palacianos têm sinalizado a Bolsonaro que o pragmatismo com o líder americano é o melhor caminho para evitar desgastes na relação entre os dois países às vésperas da corrida presidencial. Após derrotar Donald Trump, que era aliado de Bolsonaro, Biden tem sido um dos maiores críticos do presidente brasileiro na condução das pautas ambientais.

Na carta enviada ao presidente americano, Bolsonaro se comprometeu – pela primeira vez – a eliminar o desmatamento ilegal até 2030. “Queremos reafirmar neste ato, em inequívoco apoio aos esforços empreendidos por V. Excelência, o nosso compromisso em eliminar o desmatamento ilegal no Brasil até 2030”, disse o presidente do Brasil no documento.

Além disso, Bolsonaro chegou a afirmar que pretende ouvir “entidades do terceiro setor, indígenas e comunidades tradicionais”, fazendo um aceno às organizações não-governamentais (ONGs), com quem estava em guerra até agora. Dias depois, no discurso da Cúpula do Clima, o presidente prometeu fortalecer os órgãos ambientais do país, "duplicando os recursos destinados a ações de fiscalização".

"Coincidimos, Senhor Presidente [Biden], com o seu chamado ao estabelecimento de compromissos ambiciosos. Nesse sentido, determinei que nossa neutralidade climática seja alcançada até 2050, antecipando em 10 anos a sinalização anterior", disse Bolsonaro.

Na imprensa internacional, o jornal americano The Washington Post destacou que Bolsonaro era um dos principais aliados de Donald Trump e chegou até a ameaçar tirar o Brasil do Acordo de Paris, a exemplo do que fizeram os Estados Unidos na gestão anterior. Já a agência de notícias Associated Press percebeu uma moderação no discurso do presidente brasileiro e relacionou a mudança à pressão interna e externa que o governo vêm sofrendo.

Apesar disso, dentro do Palácio do Planalto, a repercussão da participação de Bolsonaro no evento foi comemorada pelos aliados. A mudança no discurso ambiental visa trazer para o Brasil uma doação dos americanos de doses de vacinas da Covid-19. A partir do fim de maio, os EUA terão doses sobrando de vacina após imunizar toda sua população adulta. Além do Brasil, México e Canadá estão nessa lista de possíveis recebedores dos imunizantes.

No Congresso, os presidentes das comissões de Relações Exteriores da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), e do Senado, Kátia Abreu (PP-TO), receberam bem o discurso de Bolsonaro. Segundo o deputado tucano, houve uma mudança no tom em relação ao desmatamento e o governo federal entendeu a importância da agenda climática para a atração de investimentos. Já a senadora classificou a intervenção como positiva, chamando a atenção para um discurso mais ameno em que Bolsonaro não condicionou as metas do clima ao recebimento de recursos de países desenvolvidos.

Reconstrução da relação com a França pode ajudar na recomposição de fundo para Amazônia

Além de moderar o tom com o presidente americano, o governo brasileiro também pretende recuperar as relações com outros dois países com quem nutriu atritos nos últimos anos: França e China. No primeiro, Bolsonaro chegou a trocar farpas públicas com o presidente francês, Emannuel Macron.

A crise diplomática entre as duas lideranças começou ainda no primeiro ano do governo Bolsonaro devido ao aumento de queimadas na Amazônia. Ambos fizeram e acusações um ao outro em uma série de posts e entrevistas que respingaram até nas primeiras damas dos respectivos países.

“Nossa casa está queimando. Literalmente. A Floresta Amazônica — os pulmões que produzem 20% do oxigênio do nosso planeta — está em chamas. É uma crise internacional”, escreveu Macron.

Em resposta, Bolsonaro argumentou que o presidente da França usava tom sensacionalista e estava querendo instrumentalizar uma questão interna do Brasil. O presidente brasileiro afirmou ainda que Macron usou uma foto falsa e tinha uma mentalidade “colonialista” ao querer incluir o tema no debate do G7 (grupo que reúne as sete nações mais industrializadas do mundo).

Depois disso, em outro episódio, Bolsonaro virou notícia internacional mais uma vez ao reforçar uma piada feita em rede social com Brigitte, a esposa de Macron. Um seguidor do presidente Bolsonaro postou a foto de Brigitte e de Michelle (primeira-dama brasileira), dizendo que Macron o estaria perseguindo por inveja. O presidente do Brasil  respondeu: “Não humilha cara. Kkkkk”.

Agora, articuladores do governo brasileiro tentam traçar estratégias para restabelecer essa relação até novembro, quando irá ocorrer a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, a COP-26, que será realizada em Glasgow, na Escócia. Nesse encontro, os artigos 5º e 6º do Acordo de Paris, que tratam sobre os procedimentos financeiros para alcançar a redução das emissões, serão debatidos. A França é um dos maiores doadores desse fundo.

Durante a Cúpula do Clima, Bolsonaro reforçou que é fundamental contar com recursos financeiros de países, empresas, entidades e pessoas “dispostos a atuar de maneira imediata, real e construtiva na solução desses problemas”.

A estratégia do governo Bolsonaro ocorre semanas depois de uma entrevista concedida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao jornal francês Le Monde, onde o petista defendeu uma aliança com o país como forma de combater a pandemia no Brasil. Com os direitos políticos restabelecidos, Lula é visto como o principal adversário de Bolsonaro na disputa eleitoral de 2022, e com isso, tem feitos diversos acenos a lideranças internacionais desde então.

Diplomacia com a China visa garantir insumos para vacinas da Covid-19

No caso da China, a primeira sinalização do governo brasileiro para amenizar a crise veio dos próprios aliados de Bolsonaro, que deixaram de criticar diretamente o governo chinês nas suas redes sociais. Demitido do Ministério das Relações Exteriores, o ex-ministro Ernesto Araújo era o mais crítico e costumava endossar o discurso contra os chineses nas redes bolsonaristas.

Próximo do presidente Bolsonaro, o novo chefe do Itamaraty, Carlos Alberto França, recebeu a missão de adotar uma diplomacia mais pragmática e menos ideológica que seu antecessor, principalmente com a China. O país é o principal fornecedor de insumos para fabricação das vacinas utilizadas no Brasil contra a Covid-19, e a relação estremecida entre os dois países vem atrapalhando as entregas desses materiais ao Brasil.

Recentemente, Carlos França teve seu primeiro encontro como o ministro dos Negócios Estrangeiros da China, Wang Yi, para tratar da urgência do combate à pandemia e da cooperação em vacinas contra a Covid-19, IFAs (ingredientes farmacêuticos ativos para imunizantes) e medicamentos. O ministro chinês sinalizou a entrega de 30 milhões de doses da vacina da Sinopharm até junho, além da sinalização da entrega de insumos suficientes para a produção de 60 milhões de doses da vacina Oxford/AstraZeneca, fabricada na Fiocruz. A expectativa é que esse volume de IFA chegue ao Brasil no segundo semestre.

Após o encontro, o diplomata brasileiro enfatizou algumas vezes o interesse do Brasil em manter uma relação de “harmonia” com a China.

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