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Senadores conversam durante a sessão do CCJ que aprovou novas regras para abuso de autoridade.
Senador Rodrigo Pacheco (esq.), relator do projeto, conversa com colegas na sessão que aprovou o abuso de autoridade.| Foto: Pedro França/Agência Senado

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (26) mudanças na lei de abuso de autoridade praticado por juízes, procuradores e promotores – medida vista no Judiciário e no Ministério Público como uma tentativa de intimidar o combate à corrupção. A proposta foi rapidamente incluída na pauta do plenário do Senado, sendo aprovada à noite.

As mudanças no abuso de autoridade foram incluídas no pacote das 10 Medidas Contra a Corrupção, elaborado em 2016 pela força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal (MPF) e apresentado ao Congresso como projeto de lei de iniciativa popular. O projeto original havia sido profundamente modificado em votação no plenário da Câmara em 2016. O abuso de autoridade, que não constava na proposta, foi incluída por deputados naquela votação.

A aprovação de medidas para coibir o abuso de autoridade na CCJ do Senado ocorre em meio à divulgação, pelo site Intercept e outros veículos de comunicação, de supostas conversas atribuídas ao ex-juiz da Lava Jato, o atual ministro da Justiça, Sergio Moro, e o procurador da República, Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa. Os supostos diálogos mostram que Moro e Dallagnol combinavam estratégias de acusação e de comunicação para tratar da operação na imprensa.

Durante a audiência em que o projeto foi aprovado, porém, nenhum senador mencionou a atuação de Moro ou de outros membros da força-tarefa da Lava Jato.

Além do abuso de autoridade, os senadores também aprovaram parte das 10 Medidas de Combate à Corrupção. Entre os pontos aprovados está a criminalização do caixa dois, o aumento de penas para casos de corrupção e peculato e a transformação destes dois crimes em crimes hediondos.

Interpretação de leis não será criminalizada

O relator do pacote, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), acrescentou no relatório do projeto previsão para que não seja criminalizada a interpretação, por autoridades, de leis. Ou seja, a mera interpretação da lei por parte de um juiz ao decidir algo em um processo não pode ser considerada abuso. Essa era uma reclamação de magistrados em relação às mudanças na legislação.

Além disso, o texto aprovado exige que, para uma autoridade ser punida por abuso, é preciso provar que houve dolo específico, ou seja, que houve intenção deliberada do juiz ou promotor de prejudicar a vítima ou se beneficiar através de seus atos.

O relator também retirou do texto a previsão de que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ou entidades da sociedade civil pudessem propor ações de abuso de autoridade contra juízes e promotores. Pelo texto aprovado na CCJ, apenas o ofendido pode propor esse tipo de ação.

Como foi a discussão na CCJ

O relatório das 10 Medidas foi aprovado por 19 votos a 3 na CCJ. O abuso de autoridade, porém, foi votado de forma separada, em votação simbólica. Ou seja, nenhum senador registrou oficialmente seu voto.

O senador Marcos Rogério (DEM-RO) defendeu a inclusão do abuso de autoridade no pacote. “O foco do crime de abuso de poder é o mau juiz, o mau promotor do Ministério Público, aqueles que abusam do poder, que diminuem a instituição a que pertencem, que cometem crime. Não há ninguém acima da lei, esteja onde estiver. Deste modo, se há excessos, se há prática de condutas reprováveis, ainda que sejam praticadas por juízes e promotores, obviamente que devem ser objeto de sanção”, disse.

“Quando a população pede que se combata a corrupção, nós falamos em combater eventuais abusos das autoridades que estavam à frente do combate ao corrupção, nós passamos uma mensagem dúbia, um mensagem que é muito ruim para essa Casa”, discordou o senador Oriovisto Guimarães (PODE-PR).

Para o senador Lasier Martins (PODE-MS), o projeto de abuso de autoridade vai criar insegurança jurídica no processo penal, já que os réus podem usar esse argumento para intimidar magistrados. “O que se quer aqui é intimidar os juízes e promotores, assustar os juízes e promotores porque em vez de previsão de punições administrativas, aqui se quer criminalizar”, reclamou o senador.

“Eu não vejo nenhuma anormalidade em estar inserido nessa lei as propostas de abuso de autoridade. Pelo contrário, abuso de autoridade também é corrupção, sim, e pode prejudicar bastante a sociedade”, defendeu o senador Mecias de Jesus (PRB-PR).

"Passamos um texto equilibrado, certamente será elogiado por diversas carreiras jurídicas", disse Rodrigo Pacheco (DEM-MG). "Todos compreendem a necessidade de ter um diploma de abuso de autoridade e que esse texto é um texto amadurecido, mais brando, mais equilibrado do que o texto que veio originalmente da Câmara", completou o relator.

O relator também comentou as críticas feitas pelo coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, nas redes sociais. "Nós não podemos desconsiderar tudo de bom que estamos fazendo no projeto por conta de um estatuto de abuso de autoridade que também, é preciso que eles reconheçam, está muito mais equilibrado e razoável do que veio da Câmara. É preciso um pouco de reconhecimento dos méritos que a gente tem feito aqui e não só pegar aquilo que se reputa como defeito ou exceção", disse Pacheco.

Sobre o timing de votação do projeto de abuso de autoridade, o relator negou ter relação com as divulgações do Intercept. "Primeiro, esse projeto, eu sou relator dele desde março e havia muita insistência e cobrança para que eu apresentasse o parecer", disse. Ele ressaltou que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), já havia prometido apreciar o projeto ainda no primeiro semestre. "É a prova mais cabal de que não houve casuísmo em relação a esse projeto quanto a esses acontecimentos em relação a Sérgio Moro e Deltan Dallagnol", afirmou o senador.

Pacheco também ressalta que, mesmo aprovado, o projeto não pode ser usado contra Moro e Dallagnol, já que a lei não pode abranger fatos que já ocorreram. O relator também ressalta que não há no projeto nada que criminalize orientações de juízes para promotores. "Fatos como esse não estão contemplados no projeto", esclarece.

Tramitação

O projeto foi apresentado à Câmara dos Deputados em março de 2016. Em novembro daquele ano, o Plenário da Casa aprovou uma versão desfigurada do projeto, no mesmo dia em que as atenções do país estavam voltadas para um acidente aéreo com jogadores da Chapecoense.

Em dezembro, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o projeto voltasse a tramitar na Câmara. Depois da conferência das assinaturas que endossaram as medidas, a Câmara encaminhou novamente o projeto para análise do Senado, em março de 2017.

Até então, o projeto estava na gaveta da CCJ do Senado e voltou à tona recentemente, ma esteira das divulgações do Intercept. Depois de passar pela CCJ, o projeto precisa ser aprovado no Plenário do Senado.

Como o projeto foi modificado pelos senadores, vai precisar tramitar mais uma vez na Câmara dos Deputados, antes de entrar em vigor.

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