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Existe relação entre a saída de Moro do governo e a intensificação das negociações do Planalto com o Centrão?
Sergio Moro durante audiência em comissão da Câmara: parlamentares se dividem quanto ao papel da saída do ex-ministro e as negociações com o Centrão.| Foto: José Cruz/Agência Brasil

O ex-juiz Sergio Moro deixou o Ministério da Justiça há pouco mais de um mês. De lá até os dias atuais, a relação entre o governo de Jair Bolsonaro e o Centrão se intensificou. O bloco de parlamentares de diferentes partidos, historicamente marcado por pouca coerência ideológica e por apoiar governos em troca de cargos, passou a ocupar postos de importância em estruturas como o Ministério da Educação e o Ministério do Desenvolvimento Regional – vagas concedidas a PP, PL e Republicanos. Outras vagas na estrutura federal devem ser disponibilizadas a legendas como PSD, Solidariedade, PTB e Podemos.

A aproximação do Centrão e o governo Bolsonaro se mostra importante para uma gestão que é alvo de processos de impeachment e é criticada por integrantes dos outros poderes da República. Mas a aceleração do vínculo entre os dois lados se explica pela saída de Moro, ou o fato de as nomeações terem ocorrido nos últimos dias se trata de uma coincidência?

A relevância da saída de Moro do governo para a intensificação do "namoro" com o Centrão – para usar uma expressão típica de Bolsonaro – divide opiniões entre parlamentares. Alguns não veem conexão entre os fatos, argumentando que o ex-titular da Justiça não participava das negociações políticas.

Além disso, Bolsonaro havia iniciado sua jornada de negociações com o Centrão quando Moro ainda estava no Ministério. O presidente se reuniu com o deputado Arthur Lira (PP-AL) no Palácio do Planalto no dia 20 de abril, antes da exoneração de Moro. O encontro é visto como um dos "marcos" da nova relação entre Bolsonaro e o Centrão, já que Lira é um dos principais líderes do grupo.

Para outros parlamentares, entretanto, a saída de Moro do governo foi sim um facilitador para a intensificação da relação entre o Centrão e o governo. Isso por causa da trajetória do ex-ministro até sua chegada a Brasília, que o tornou figura distante da unanimidade entre os políticos. Moro foi juiz de primeira instância em Curitiba na Lava Jato, a principal operação de combate à corrupção da história do Brasil. Ele condenou vários políticos – inclusive ex-líderes de partidos do bloco.

De todo modo, o vínculo entre o governo e o Centrão foi citado pelo ex-ministro como um dos indícios do que Moro definiu como pouca prioridade dada pela gestão Bolsonaro no combate à corrupção.

"Recentemente, vimos essas alianças, que são realizadas com políticos que não têm não um histórico, assim, totalmente positivo dentro da história da administração pública", afirmou o ex-ministro em entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo, no domingo (24). "Claro que existe todo esse contexto também, que eu mencionei antes, de um desapontamento em relação à falta de empenho do presidente em relação à agenda da anticorrupção. Que envolve agora essas alianças políticas, algumas questionáveis. Veja, vamos colocar bem claro: eu não tenho nada contra os políticos. Mas algumas alianças são realmente questionáveis", disse Moro, na mesma entrevista.

"Moro não era um homem querido no Congresso"

O deputado federal Carlos Bezerra (MDB-MT) avalia que a saída de Moro "sem dúvida nenhuma" contribuiu para que Centrão e governo intensificassem relações. Na avaliação do deputado, o ex-ministro inibia movimentações do que ele chamou de "pessoal mais mal afamado" do Congresso Nacional.

"Tudo isso está acontecendo porque o governo não fez o ABC da política, que é construir uma base aliada, uma coalizão de partidos, conversando com as forças mais sérias do Congresso", afirma o deputado, que está em seu quinto mandato na Câmara.

Outro parlamentar, que conversou com a Gazeta do Povo de forma reservada, reforçou a hipótese de que o currículo de Moro espantou do governo integrantes do Centrão: "Ele não era apenas uma figura anti-corrupção, mas sim uma figura anti-política".

"A verdade é que Moro não era um homem querido no Congresso, por tudo o que ele significava. Muitos deputados, por mais que não estivessem diretamente envolvidos em corrupção e não foram condenados por Moro, tinham amigos que foram", diz o parlamentar.

Em 24 de abril, dia em que Moro deixou o governo, o presidente Bolsonaro recebeu uma série de mensagens elogiosas de membros do Centrão em seu telefone, segundo reportagem publicada na revista Exame. Membros de PP, PTB, PL e outros partidos celebravam o presidente, que no período da tarde discursou em resposta a Moro, que durante a manhã apresentou suas acusações ao chefe do Executivo.

Deputados que negam relação entre Moro e negociações com o Centrão

Já outros apoiadores do presidente Bolsonaro descartam a hipótese de haver relação entre a queda de Moro e o aumento na conexão entre o governo e o Centrão. "Não, não há nenhuma ligação. Ele não tinha poder nenhum na coordenação política", diz o deputado Bibo Nunes (PSL-RS).

Na mesma linha, o também deputado Reinold Stephanes Junior (PSD-PR) afrma que "a posição do Moro nunca interferiu em nada". O parlamentar do Paraná define como "corretíssimo" o contato entre Bolsonaro e o Centrão. Para Stephanes, grande parte da bancada que foi eleita com o discurso bolsonarista em 2018, em especial os integrantes do PSL, são "inexperientes e despreparados, que não estão ajudando o presidente". "Bolsonaro precisa contar com a experiência de deputados de centro-direita, experientes, corretos, que têm experiência como prefeitos, governadores, secretários e sabem como funciona o Congresso", afirma.

Em relação ao PL, partido do Centrão que tem como um de seus líderes Valdemar Costa Neto – preso pelo mensalão e que ainda assim prossegue como um articulador político de importância – Stephanes disse que a legenda "tem 40 deputados, não podemos generalizar pelos erros de um".

Sucessão de Maia também faz parte das negociações com o Centrão

A composição entre as forças bolsonaristas e as do Centrão também é mencionada como necessária para a eleição à presidência da Câmara, prevista para fevereiro de 2021. Ainda não há nomes favoritos para a disputa que escolherá o sucessor de Rodrigo Maia (DEM-RJ) como presidente da Casa – um cargo-chave para as relações entre o Planalto e o Congresso.

Bibo Nunes aponta que a Aliança Pelo Brasil, futuro partido de Bolsonaro e de parte da bancada eleita pelo PSL em 2018, não terá condições de apresentar uma candidatura competitiva no processo: "Será melhor conversarmos com outros grupos".

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