A ministra da Saúde, Nísia Trindade, e o presidente Lula (PT)| Foto: Ricardo Stuckert/PR
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As recentes crises enfrentadas no Ministério da Saúde fragilizaram a ministra Nísia Trindade à frente da pasta. Os crescentes casos de dengue no país, o aumento de mortes de indígenas Yanomami em 2023 e a decadência dos hospitais federais no Rio de Janeiro aumentaram a pressão sobre ela, especialmente após cobranças diretas do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

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Por enquanto, o petista garantiu a permanência de Nísia no cargo, a fim evitar críticas sobre a demissão de mais uma mulher em seu governo – três deixaram seus cargos no ano passado: Ana Moser (Esporte), Rita Serrano (Caixa Econômica Federal) e Daniela Carneiro (Turismo). Mas a pressão sobre Nísia, por resultados e por melhor articulação política, deve continuar, segundo analistas políticos consultados pela Gazeta do Povo.

“Quando Lula concentra as cobranças sobre a Nísia de uma maneira dura, ele quer que ela peça para sair. Ele não quer carregar essa responsabilidade, embora ele tenha dado todas as condições para ela entender isso. Acredito que essa seria a maneira mais política que ele gostaria de usar para resolver essa questão", opina o cientista político Leonardo Barreto.

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Durante reunião ministerial no Palácio do Planalto nesta semana, Lula a questionou sobre as crises de saúde que estouraram no país. A ministra, que também já foi presidente da Fiocruz, ainda ouviu cobranças sobre entregas dos resultados prometidos. Também vazou a informação de que Nísia chorou ao falar sobre a pressão que vem sofrendo de políticos do Centrão, que gostariam de comandar o Ministério da Saúde, um dos mais importantes da Esplanada devido ao grande montante de recursos do Orçamento que gere.

No dia seguinte à reunião com todos os ministros de governo, Lula se encontrou com Nísia no Palácio do Planalto para uma conversa bilateral. A especulação em torno da reunião era de que ela fosse demitida por Lula, o que gerou um ruído na imprensa, posteriormente descartado por Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais.

Nesta quinta-feira, em entrevista à CNN Brasil, Nísia culpou o “machismo, inclusive no campo da esquerda”, pela pressão que tem sofrido no comando da pasta e disse que tem se reunido com líderes governistas no Congresso para aumentar o diálogo com deputados, insatisfeitos com o repasse de verbas da pasta para as emendas parlamentares.

“As emendas parlamentares são bem-vindas, estamos em um momento de divulgar todos os equipamentos do PAC Saúde e eu tenho buscado me reunir com líderes da nossa base do governo, já conversei com o presidente da Comissão de Saúde, e eu acho que esse é o caminho: diálogo, mas com a estratégia de programa de governo", disse a ministra, tentando minimizar a pressão que sofre dos parlamentares do Centrão.

Veja a seguir por quais problemas a ministra da Saúde vem sendo cobrada.

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1. Epidemia de dengue no país

A epidemia de dengue que assola o país gerou uma onda de instabilidade para a gestão de Nísia à frente da Saúde. O Brasil está perto de registrar quase 2 milhões de casos da doença apenas neste ano – os números são os maiores da história. Além disso, 630 pessoas morreram em decorrência da doença de janeiro até agora, sendo que há outros 1.009 óbitos em investigação.

Em fevereiro, quando o Distrito Federal e os estados do Rio de Janeiro, Acre e Minas Gerais declararam situação de emergência, a ministra chegou a negar a existência de uma epidemia nacional causada pelo Aedes aegypt. Além da ineficácia nas ações de combate à doença, não há vacinas suficientes para imunizar a população.

Nesta quinta, a ministra disse que o combate à doença é uma prioridade do Ministério da Saúde e que a pasta tem repassado recursos para estados e municípios que declararam situação de emergência por causa da dengue – R$ 1,5 bilhão foram reservados. Nesta semana ela também prometeu aos prefeitos agilizar a distribuição de vacinas contra a doença.

2. Crise nos hospitais federais do Rio de Janeiro

A última semana da ministra ainda foi marcada por uma crise envolvendo hospitais federais no Rio de Janeiro que resultou na demissão de dois funcionários de alto escalão na pasta. Reportagem do programa Fantástico, da TV Globo, denunciou a precariedade e problemas de atendimento em seis hospitais administrados pelo Governo Federal do Rio. As redes chegaram a ser alvo da intervenção do Ministério da Saúde após a denúncia.

A reportagem ainda mostrou o caso envolvendo a dona de uma empresa de construção civil que entrou em um dos hospitais e participou de reunião alegando ter sido enviada por Helvécio Miranda, Secretário de Atenção Especializada à Saúde. O caso está sendo investigado pelo Ministério Público Federal (MPF) e Helvécio foi exonerado do cargo. O diretor do Departamento de Gestão Hospitalar (DGH), Alexandre Telles, também foi exonerado.

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“A gente tem menos orçamento do que tinha em 2022, que já era péssimo. Menos profissionais do que tinha em 2022, e tem mais leitos abertos. Nossa situação é dramática”, contou Christiane Gerardo, diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social no Estado do Rio de Janeiro (Sindsprev-RJ), em entrevista ao Estadão nesta quarta-feira (20).

No mesmo dia, a ministra admitiu que faltou "acompanhamento mais próximo" aos hospitais alvos da reportagem. "Faltou diálogo com os diretores, faltou um acompanhamento mais próximo, e nós estamos num momento de rever tudo isso [...] para que esses hospitais ofereçam o serviço que a população precisa", disse Nísia Trindade em entrevista à Globo News.

3. Mortes de yanomamis aumentaram com Lula

No primeiro ano deste terceiro mandato de Lula, as mortes de indígenas Yanomami foram maiores que no último ano de Bolsonaro à frente do Executivo. Em 2023, foram registrados 363 óbitos de originários da terra indígena, um aumento de 5,8% em relação a 2022, que havia registrado 343 mortes.

O aumento de mortes no território, localizado nos estados do Amazonas e de Roraima, aconteceu mesmo após o governo de Lula decretar uma série de medidas emergenciais na região com o intuito de estancar a crise entre os Yanomamis. As medidas, contudo, não surtiram o efeito esperado.

Em contrapartida, o Ministério da Saúde justifica que as mortes na região eram subnotificadas na gestão anterior, de Jair Bolsonaro, e portanto não refletiam a realidade enfrentada pelos indígenas.

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Contudo, mortes por malária e por desnutrição ainda foram registradas durante o atual governo. Em busca de ações efetivas, parlamentares de oposição ao governo pediram que Lula seja investigado pelo Tribunal Internacional Penal (TPI) para explicar o aumento das mortes, desmatamento e garimpo ilegal que ainda é presente no território Yanomami.

4. Queda de braço entre Lula e Lira também recai sobre Nísia Trindade

Apesar dos problemas que os estados brasileiros têm enfrentado de Norte a Sul com saúde pública, é a situação política com o Ministério da Saúde que tem pesado mais para Nísia. Desde o ano passado, a pasta está entre os desejos do grupo político do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).

O interesse pela pasta se deve ao fato da Saúde receber um dos maiores orçamentos da União, mais de R$ 230 bilhões. A cobiça também vem das liberações de emenda, que o Centrão alega que Nísia tem demorado para liberar.

Sem maioria no Congresso Nacional, o petista tem cedido nomeações a aliados de Lira em troca de apoio político, como quando nomeou André Fufuca (Esportes), Silvio Costa Filho (Portos e Aeroportos) e Carlos Vieira (Caixa). Ainda assim, a pressão pelo Ministério da Saúde permanece. O presidente da Câmara, inclusive, já pediu à ministra informações sobre o pagamento de emendas parlamentares no começo do ano legislativo, em fevereiro.

O cientista político Antonio Testa relembra que Lula precisa barganhar com Lira, pois é ele quem despacha sobre os pedidos de impeachment contra o presidente. “O Lula tem vários pedidos de impeachment e estão todos na gaveta do Lira. Então é muito provável que o Lula vai ter que negociar com o Lira para manter esse pedidos na gaveta", pontua.

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Por outro lado, o cerco também aumenta sobre Nísia, que já admitiu ter dificuldades para lidar com tal pressão. Considerada uma pessoa “técnica”, parlamentares reclamam que a ministra não consegue ter um bom relacionamento com o Congresso.

“Nísia tem demonstrado uma inabilidade política e gerencial acima da média. Ela também não consegue apresentar soluções que a política exige, que são os repasses de emendas para os parlamentares mandarem para suas prefeituras. Isso tem gerado um mal-estar enorme”, avalia Testa.

A postura de Nísia já gerou reclamações até mesmo entre integrantes do Partido dos Trabalhadores (PT). O vice-presidente nacional da legenda, Washington Quaquá, já a chamou publicamente de “inoperante e frágil”.

“Ela está sofrendo pelos dois lados", avalia Leonardo Barreto. "Por problemas próprios, levando em consideração que ela minimizou a epidemia de dengue e teve erros de gestão; mas também pela barganha política que acaba estourando no colo dela”, conclui o analista.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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