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O ex-presidente Jair Bolsonaro e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, dialogam sobre a nova estruturação do partido
O ex-presidente Jair Bolsonaro e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, dialogam sobre a nova estruturação do partido| Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom / Agência Brasil; Valter Campanato / Agência Brasil

O Partido Liberal (PL) elabora uma nova estruturação para conduzir o que a cúpula define como uma "oposição democrática" ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e se consolidar como o maior partido da direita no Brasil. Dentro dessa reformulação, estão previstas as criações de novos diretórios e a contratação de uma consultoria para auxiliar a fiscalização do governo federal. Também estão em análise a contratação de pesquisas quantitativas e qualitativas em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

A ideia da legenda é fortalecer as atuais estruturas e ampliá-las, a exemplo da própria comunicação, que pode passar por um processo de reformulação. É nesse processo que o partido não descarta a contratação de pesquisas para testar o nome de Bolsonaro à frente do processo de oposição, segundo afirmam lideranças no Congresso e interlocutores da cúpula à Gazeta do Povo.

O partido entende que é preciso fazer pesquisas qualitativas e quantitativas para saber a real dimensão da força política de Bolsonaro e de sua base eleitoral "raiz", até para traçar os caminhos que a legenda vai seguir a partir de agora dentro de sua comunicação e articulação estratégica.

É comum partidos contratarem institutos especializados para a elaboração de pesquisas internas e há uma grande dúvida sobre o capital político de Bolsonaro. Internamente, o PL se divide entre correligionários que entendem que o ex-presidente deve liderar a oposição como o principal nome e outros que discordam e defendem um "plano B" desassociado do ex-chefe do Executivo.

Entre as alternativas cogitadas no "plano B" estão Romeu Zema (Partido Novo), Ratinho Júnior (PSD) e a própria mulher de Bolsonaro, Michelle, cujo nome vem ganhando força. Ela assume nesta terça-feira (20) o PL Mulher em uma cerimônia em Brasília.

As pesquisas internas podem, portanto, ajudar o partido a dar uma resposta aos seus quadros sobre os rumos e as diretrizes estratégicas que podem ser adotadas. O cenário mais provável, porém, é de que Bolsonaro participe ativamente como o grande cabo eleitoral e principal nome da oposição à frente do PL, ainda que ele não seja o candidato à disputa presidencial em 2026.

Uma possibilidade levada em conta é que a Justiça determine eventualmente a ineligibilidade do ex-presidente em algum dos processos que correm contra ele. A recente polêmica sobre a entrada no Brasil de jóias sauditas destinadas a Bolsonaro em 2021 reforçou temores do partido de que seus opositores manobrem para tentar impedir o ex-presidente de concorrer.

O PL encomendou uma pesquisa quantitativa sobre o cenário eleitoral na prefeitura do Rio de Janeiro que sugere que aliados próximos de Bolsonaro largam com ao menos 20% das intenções de voto. O levantamento interno recebido aponta o atual prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), com 30% dos votos. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) aparece com 26%. Em outro cenário, o deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ) aparece com 24%.

A meta é avançar com o processo de reestruturação a partir de março, uma vez que os recursos do PL começam a ser desbloqueados já com as verbas pagas de acordo com o cálculo atualizado do fundo partidário. Cálculos do partido sugerem que a legenda receberá cerca de R$ 213 milhões anuais de recursos do fundo partidário.

Os recursos ficaram bloqueados entre novembro e fevereiro por decisão do ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A Justiça Eleitoral informou, em fevereiro deste ano, que o PL pagou a multa de R$ 22,9 milhões.

PL prevê recepção de 10 mil pessoas no retorno de Bolsonaro ao Brasil

Outro fator que pode "testar" o prestígio de Bolsonaro é a recepção dele ao Brasil. Nas redes sociais, existe um movimento de convocação da população às ruas em recepção ao ex-presidente, quando ele retornar ao Brasil. Existe a possibilidade de que ele volte ao país entre o fim de março e abril.

O PL tomou conhecimento dessa organização da população nas redes sociais e acredita que possa ter uma adesão de ao menos 10 mil pessoas para o dia que retornar. Aliados de Bolsonaro admitem que existe a movimentação e a expectativa para essa recepção. De forma reservada, uma liderança conservadora afirma que organizadores de movimentos de rua cogitam um evento em São Paulo para o ex-presidente.

Contudo, o martelo ainda não está batido e é incerto se Bolsonaro terá uma comitiva popular de recepção ou irá às ruas em algum evento organizado por conservadores. De toda a forma, o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, é entusiasta das mobilizações nas mídias sociais.

O cacique do PL entende que Bolsonaro ainda tem muito prestígio e apoio popular. Os mais próximos não descartam a hipótese de o ex-presidente ter perdido parte de seu capital político, mas Costa Neto analisa que ele ainda tem a capacidade de mobilização social capaz arrastar milhares de pessoas às ruas.

PL quer agenda de viagens para Bolsonaro em todo o país

A possibilidade de recepção de apoiadores de Bolsonaro em seu retorno seria, portanto, um bom teste para a agenda de viagens que Costa Neto elabora para o ex-presidente. O cacique do PL montou um mapa com estado por estado e traçou como meta a presença de Bolsonaro a todos os municípios com mais de 200 mil habitantes até as eleições municipais do próximo ano.

Costa Neto avalia que Bolsonaro será um cabo eleitoral importante para as aspirações do partido: eleger 1 mil prefeitos em 2024. O cálculo leva em consideração a proporção de cerca de 20% da bancada do PL na Câmara dos Deputados. O partido elegeu 99 dos 513 deputados federais, o equivalente a 19,3%.

"Só com o número de deputados que nós temos, temos de chegar a mil [prefeitos]. Com o trabalho que podemos fazer e que o Bolsonaro pode fazer na eleição, nós podemos passar bastante disso", disse Costa Neto, em 1º de março, após uma reunião com a bancada do partido na Câmara. No cenário mais otimista, ele acha que poderia eleger até 1,5 mil prefeitos, dizem interlocutores.

Para isso, Costa Neto salienta que o ex-presidente é uma engrenagem fundamental. "Queremos que Bolsonaro visite as nossas cidades. Nós temos observado que ele não perdeu o prestígio. Ele vai ser uma pessoa muito importante nas eleições municipais no ano que vem", declarou. A ideia é que Bolsonaro viaje o país na condição de presidente honorário do PL.

PL vai lançar observatório para fiscalizar governo e auxiliar oposição a Lula

Bolsonaro e Costa Neto têm tido um contato próximo, mesmo com o ex-presidente ainda nos Estados Unidos. Os dois se comunicam por mensagem de texto ou ligações telefônicas pelo WhatsApp semanalmente. Eles comentam sobre notícias do cenário político nacional e também sobre os rumos do PL.

Uma das ações debatidas entre os dois é a proposta de um observatório para monitorar a conduta do governo Lula. A expectativa é de que o PL lance a ferramenta em breve. O partido está em contato com especialistas que ficarão encarregados de fazer análises das ações do governo e também irão propor propostas legislativas para as duas bancadas no Congresso.

A ideia do observatório é possibilitar que o PL possa promover uma oposição estratégica e fazer uma discussão macro sobre todas as ações do governo e como responder às medidas. Ou seja, a meta não é apenas intensificar a fiscalização, mas também propor um debate mais profundo e apresentar soluções ao país.

A articulação do PL tem gerado entusiasmo da cúpula às bases do partido. A reestruturação em busca da profissionalização da legenda prevê, inclusive, a contratação de consultorias na área de inteligência para ter informações, dados e adotar planejamentos estratégicos no Congresso e no resto do país, até para dar um suporte maior aos diretórios estaduais.

Em condição reservada, uma liderança do partido no Congresso diz que a oposição ainda é muito pensada em questões morais, mas entende que o observatório ajudará qualificar essa atuação. O observatório é visto como um instrumento político-partidário importante para apoiar algumas pautas prioritárias para a legenda.

Em nota sobre a reunião da bancada do partido na Câmara, os parlamentares destacam o apoio à instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar os atos de vandalismo em 8 de janeiro, "inclusive sobre a responsabilização do atual governo".

A bancada também se posicionou contra a regulação das mídias e defendeu a liberdade de expressão ampla e irrestrita nas redes sociais. Além disso, os parlamentares também se mostraram "preocupados" com as denúncias contra diversos integrantes do governo, a exemplo do ministro das Comunicações, Juscelino Filho.

Os deputados destacam que o foco, agora, é fazer uma "oposição estruturada, firme e construtiva", com propostas "concretas" para a população e "cobrando respostas do atual governo e pensando no Brasil que queremos e estamos construindo". A bancada na Câmara também foi contra a reoneração fiscal dos combustíveis, considerada um legado importante do governo Bolsonaro a ser defendido, e reafirmou a defesa dos valores conservadores e de uma política econômica liberal.

Os deputados também destacaram a expectativa em "consolidar a unidade partidária e apresentar pautas propositivas, respeitando a diversidade política e regional, que são marcas do Partido Liberal". Esse último trecho é uma resposta à orientação de que os deputados poderão ter liberdade para se posicionar na Câmara, ainda que divididos. Uma ala, por exemplo, acena favoravelmente a votar com o governo.

PL quer ampliar diretórios e ter uma conexão mais próxima com a sociedade

Dentro do processo estratégico da nova estruturação da cúpula para os estados, o PL quer ampliar o número de diretórios. O partido tem os diretórios nacionais e estaduais feminino, o PL Mulher, e o destinado aos jovens, o PL Jovem. A ideia é ter mais frentes temáticas para promover um diálogo com a sociedade.

A deputada federal Bia Kicis (PL-DF), presidente do diretório distrital do partido, manifestou anteriormente à Gazeta do Povo a intenção da legenda em mobilizar um trabalho nas bases eleitorais junto a diretórios focados no empreendedorismo, na saúde e até nos transportes, além dos já existentes para mulheres e jovens.

Interlocutores do PL também afirmam que está em cogitação a formulação de diretórios destinados aos cristãos e ao agronegócio. O objetivo é promover movimentos que representem mais o partido e auxiliem na construção do engajamento entre a legenda e a sociedade. O projeto tem sido debatido entre Costa Neto e o general Braga Netto, que atua como um coordenador e consultor do processo de reestruturação da sigla.

Os novos diretórios serão criados como projetos-piloto para testar o engajamento com os eleitores. Interlocutores dizem que a ideia é fruto da experiência do próprio Bolsonaro em ouvir mais a sociedade. O ex-presidente, por sinal, busca nos Estados Unidos uma inspiração das boas experiências do Partido Republicano.

Estruturação do PL afasta temor sobre federação entre PP e União Brasil

Em razão de todo o processo de nova estruturação, a hipótese de uma federação partidária entre PP e União Brasil não assombra a cúpula do PL. A análise é de que os dois partidos buscam esse alinhamento para enfrentar a organização promovida por Costa Neto. O cacique do partido, porém, sequer acredita que a federação sairá do papel.

A federação partidária entre PP e União Brasil é complexa pelos diversos interesses estaduais do partido, embora dirigentes de ambas as legendas demonstrem otimismo de que a articulação será bem-sucedida. O discurso entre eles é de que as cúpulas têm muita influência e poder sobre as bases, o que poderia sacramentar o acordo.

Ainda que a federação se concretize, Costa Neto entende que nenhum partido vai tirar a força do PL até as eleições de 2026, até pelo sentimento de que, quando Bolsonaro retornar ao Brasil e iniciar a agenda de viagens, ele voltará em um contexto de desgaste do governo Lula.

A percepção no PL é de que o próprio governo federal tem dado "munições" para Bolsonaro e o partido no Congresso e nos estados para fazer oposição a Lula. A começar pela reoneração dos combustíveis e os escândalos envolvendo os ministros das Comunicações, Juscelino Filho, e do Turismo, Daniela Carneiro.

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