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CPP
Manoel Murrieta, presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp)| Foto: Marcos Correa/PR

O substitutivo do projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados com o objetivo de reformar o Código de Processo Penal (CPP) está preocupando membros do Ministério Público (MP). Itens como a restrição de investigações criminais por parte do MP e a delimitação de prazo para inquéritos policiais representam um retrocesso na legislação, segundo o promotor de Justiça Manoel Murrieta, presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp).

“O ponto que mais nos preocupa é quererem limitar o poder investigatório do Ministério Público, por razões muito claras. A gente vem realizando um trabalho no combate à corrupção e ao crime organizado há algum tempo, e esse trabalho tem sido, na nossa avaliação, exitoso, com problemas aqui e ali, mas com saldo total exitoso”, diz.

De acordo com a proposta, o órgão só poderia promover investigações criminais “quando houver fundado risco de ineficácia da elucidação dos fatos pela polícia, em razão de abuso do poder econômico ou político”. Para alguns juristas, a proposta é contrária à Constituição, que estabelece como poder do MP “requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais”.

Murrieta também critica a limitação do prazo para investigações criminais, que passaria a ser de no máximo dois anos. “Há crimes que prescrevem com prazo muito maior. Por exemplo, homicídio, que é 20 anos a prescrição: se o inquérito não for concluído em dois anos, aquele crime nunca terá a autoria revelada, e o caso nunca irá a julgamento”, diz.

Para o promotor, se a atual proposta for aprovada como está, autores de crimes violentos e graves — incluindo a corrupção — serão favorecidos.

Alterações no Tribunal do Júri criariam problemas graves, diz presidente da Conamp

O presidente da Conamp também critica os pontos da proposta que tratam do Tribunal do Júri, órgão do Judiciário que julga os crimes dolosos (intencionais) contra a vida. As atribuições do Ministério Público nesse órgão seriam reduzidas, e os elementos apurados no inquérito policial não poderiam ser usados para informar os jurados.

Murrieta cita o caso Henry como exemplo de julgamento que acabaria sendo afetado pelo novo CPP e que poderia prejudicar a aplicação da justiça contra Dr. Jairinho, ex-vereador do Rio de Janeiro. “Tudo aquilo que está sendo levantado no inquérito não poderá ser mostrado aos jurados. Isso, para nós, fere a questão da verdade real, fere a transparência da causa”, diz.

O promotor também critica a exigência de unanimidade dos jurados como condição para a condenação. “A gente sabe que numa sociedade plural, de diversos valores, de diversas influências culturais, obter uma unanimidade na votação é muito difícil”, afirma.

Outro problema do projeto do novo Código de Processo Penal relacionado ao Tribunal do Júri seria em relação à segurança das testemunhas de crimes ligados a grupos violentos. Atualmente, a testemunha pode ser ouvida em sigilo pelo juiz, com a presença do promotor e do defensor, na fase de admissibilidade da acusação. De acordo com a nova proposta, isso deixaria de ser possível, e a testemunha só poderia depor publicamente no Tribunal do Júri.

“Se nós formos depender, no Tribunal do Júri, de depoimentos de testemunhas que estão sendo levadas a público para dar a sua versão diante de, por exemplo, facções criminosas, milícias — do crime organizado como um todo —, dificilmente teremos as testemunhas ali presentes. E, uma vez não presentes, com a supressão dessa prova, sem a garantia anterior de segurança, de ela ser ouvida num domínio reservado, não publicamente, não ser filmada, com certeza nós teremos um constrangimento que levaria ao benefício da impunidade”, avalia Murrieta.

Nova proposta perde a chance de modernizar o CPP

Para o presidente da Conamp, o substitutivo da proposta de reforma do CPP não resolve o caráter obsoleto de alguns pontos do atual Código. “O CPP precisa ser atualizado, precisa ser modernizado, mas sob o aspecto da eficiência e da agilidade na resposta, e não para se tornar um código burocrático que traga mais lentidão e favoreça a impunidade”, afirma.

Murrieta diz que a nova proposta deixa de trazer institutos que têm modernizado o processo penal no mundo, como o chamado “plea bargain”, isto é, a possibilidade de negociação entre Estado e acusado para evitar processos.

“Ele [o projeto do novo CPP] deixa isso de fora. Ele também não prevê que a condenação em segunda instância leve à prisão. Seria um bom momento de regulamentar isso. E ele traz algumas dificuldades para métodos de investigação que utilizam tecnologia. Podia ser mais moderno; é muito burocrático.”

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