Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Fiel da balança

Republicanos sofre pressões interna e externa para apoiar anistia aos presos do 8/1

Tarcísio declara lealdade a Bolsonaro na véspera de julgamento no STF
Principal nome do Republicanos, governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, pressiona o partido a apoiar a anistia do 8/1, em parceria com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). (Foto: Alan Santos/PR)

Ouça este conteúdo

O julgamento dos réus do 8 de janeiro, a corrida no Congresso para aprovar o perdão para eles e as articulações com vistas à eleição presidencial de 2026 colocaram o Republicanos no centro de um debate político nacional. A legenda passou a ser alvo de pressões crescentes – internas e externas – sobre qual posição adotará, especialmente em relação ao projeto de anistia.

As tensões se intensificaram após declarações controversas de lideranças de peso do partido, como o presidente, deputado Marcos Pereira (SP), e o presidente da Câmara, Hugo Motta (PB), ambos com influência direta nas decisões da bancada. Por parecerem hesitantes acerca da anistia, ambos foram duramente cobrados por correligionários e parentes dos presos.

Diante do impasse, negociações conduzidas por dois nomes importantes da direita – o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, eleito pelo Republicanos, e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – entraram em campo para buscar um acordo que reduza o desgaste interno e preserve a estratégia de atração de partidos do centro para aprovar logo a anistia.

Na segunda-feira (24), Tarcísio reforçou o compromisso com a aprovação do projeto de anistia e voltou a defender a proposta. Durante participação no podcast Inteligência LTDA, ao lado de Bolsonaro, ele garantiu que o Republicanos apoiará a medida por se tratar de uma “questão humanitária”.

O governador citou o caso da cabeleireira Débora Santos, julgada por ter pichado uma estátua com batom, como exemplo de abuso. “O tipo penal exige violência ou grave ameaça. Nenhuma das duas está presente”, disse. Ao comentar o posicionamento da legenda, foi direto: “O Republicanos tem essa sensibilidade. Posso falar tranquilamente pelo partido. Isso já está bastante alinhado com o presidente [Marcos Pereira]”.

VEJA TAMBÉM:

Republicanos vem sendo cobrado por Tarcísio e Bolsonaro a votar pela anistia

A crise no Republicanos começou a ganhar forma em 17 de março, quando Tarcísio, um dos principais cotados para disputar o Planalto caso Bolsonaro permaneça inelegível, se posicionou de forma enfática em defesa da anistia, ao lado do ex-presidente. Durante o ato no Rio em favor da causa, o governador disse que “a anistia é a correção de um erro” e que não vê “quem possa ter coragem de se opor” à proposta.

Naquele mesmo fim de semana, interlocutores do governador confirmaram sua disposição de atuar nos bastidores para convencer Pereira a apoiar oficialmente o texto que tramita na Câmara. O presidente do Republicanos, contudo, adotou postura cautelosa. Em entrevista à CNN Brasil no dia 18, classificou a anistia como pauta “sensível” e a endereçou para após 2026.

Embora tenha reconhecido “amplo favoritismo” interno à proposta, a fala de Pereira provocou reações imediatas. No dia 19, o pastor Silas Malafaia, aliado próximo de Bolsonaro, foi às redes sociais para o criticar duramente. Disse sentir “vergonha” das declarações do deputado, acusando-o de “contaminar” o debate eleitoral e de enfraquecer a pauta da anistia.

Malafaia foi além: incentivou membros do Republicanos a deixarem a sigla, que tem representante no ministério do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e atacou diretamente a atuação de Pereira como líder evangélico, pastor da Igreja Universal. O dirigente partidário respondeu em seguida, se dizendo “covardemente atacado” por alguém que “transpira ódio”.

VEJA TAMBÉM:

Declarações polêmicas de líderes levaram à nova fase de negociações com a direita

Nessa escalada de tensões, Bolsonaro lamentou em 20 de março ter havido “confusão terrível” envolvendo Pereira, reconhecendo buscar o apoio do Republicanos à proposta de perdão aos condenados. Após ter negociado com o PSD, de Gilberto Kassab, o ex-presidente espera alcançar os 44 votos do Republicanos para garantir o mínimo de 257 necessários.

Ao longo da negociação, Hugo Motta, que vem sendo cobrado a encaminhar o projeto da anistia ao plenário da Câmara, criou ambiente adverso dentro e fora do seu partido após seu discurso polêmico no último dia 19, na sessão solene que celebrou 40 anos da redemocratização do país. Ele rechaçou a existência desde então de perseguidos, presos ou exiliados políticos no Brasil.

A declaração de Motta ocorreu um dia após o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) anunciar que iria se licenciar do cargo para permanecer nos Estados Unidos, numa espécie de autoexílio político, motivado por uma perseguição do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em 21 de março, durante o Encontro Nacional de Mulheres Republicanas, evento oficial do partido em Brasília, Motta teve a fala interrompida por Tereza Vale, mãe de um foragido do 8 de janeiro. Ela acusou o presidente da Câmara de ignorar os “exilados políticos”. Coube à senadora Damares Alves (Republicanos-DF) sair em defesa de Motta e de Marcos Pereira, dizendo que ambos mereciam “aplausos por sua atuação e liderança”.

A postura contemporizadora da senadora foi criticada por perfis de direita nas redes sociais, que a acusaram de traição à pauta da anistia e de ignorar os presos políticos. O mal-estar no Republicanos se agravou com reações de parlamentares e colunistas de direita que apontaram a “negação da realidade” por Motta e o seu “alinhamento com o STF”.

VEJA TAMBÉM:

Legenda cresce no Congresso em busca de figurar entre as maiores bancadas

Segundo analistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o Republicanos, legenda que apoiou a reeleição de Jair Bolsonaro em 2022, tenta se manter competitiva no jogo eleitoral e partidário, moldado pela concentração de poder e de bilionários fundos públicos em um número cada vez mais restrito de legendas. Assim apesar de se apresentar pelo slogan de “partido mais conservador do país”, a sua estratégia repete o pragmatismo do Centrão.

Se, por um lado, o Republicanos abriga figuras ligadas ao governo, como o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, por outro, tem entre os seus quadros líderes que cobram fidelidade à agenda conservadora, incluindo o projeto de anistia. Os analistas acreditam que os sinais emitidos pelo eleitorado de centro e direita acabarão definido a postura do partido.

Em duas décadas, o Republicanos se consolidou como uma das principais forças no Congresso. O partido, que começou em 2005 como Partido Municipalista Renovador e elegeu só um deputado em 2006, hoje discute uma possível fusão com o PSDB, movimento que pode garantir aos tucanos acesso ao fundo partidário mesmo sem alcançar a cláusula de barreira.

Juntas, as bancadas de Republicanos e PSDB somam 55 deputados federais e sete senadores, formando a terceira maior força na Câmara, atrás apenas de PL e União Brasil. A negociação afastou o Republicanos da federação em curso entre PP e União Brasil e mostrou sua influência no Congresso e o planejamento para formação de quadros e melhora da estrutura partidária.

Republicanos tem eleitorado conservador e participação em todos os governos

Ao longo dos anos, o partido integrou todos os governos. Teve o vice do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2006, ocupou ministérios sob Dilma Rousseff, apoiou Michel Temer, comandou pastas importantes no governo Bolsonaro e, atualmente, está à frente do Ministério de Portos e Aeroportos.

A consagração como força de alcance nacional veio com a eleição de Hugo Motta à presidência da Câmara, com apoio de partidos que vão do PL ao PT. Apesar de manter bom diálogo com a direita, Motta tem feito acenos ao governo Lula e frustrado aliados de Jair Bolsonaro ao não acelerar a tramitação da anistia para os réus do 8 de janeiro.

Para reverter esse cenário, Bolsonaro conta com o apoio de Tarcísio de Freitas, principal ativo político do Republicanos. Sua popularidade projeta, pela primeira vez, a possibilidade de candidatura presidencial competitiva pela sigla em 2026.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros