Ouça este conteúdo
O Brasil tenta negociar uma mensagem de paz para as guerras no leste da Europa e no Oriente Médio na declaração final do G20. O tema já foi impasse em outras cúpulas do G20 e virou foco do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tenta buscar visibilidade internacional com propostas controversas para o fim dos conflitos em curso. O Brasil sedia a cúpula de líderes das 20 maiores economias do mundo nos dias 18 e 19 deste mês, no Rio de Janeiro, e ainda busca consenso entre os países sobre temas geopolíticos.
"Esse tema nós estamos negociando com os demais países, a questão dos parágrafos sobre geopolítica que constarão de declaração. Esse é um tema importante [...] a questão da guerra na Ucrânia e a situação palestina, no Oriente Médio. Há uma discussão entre os governos para se chegar a uma linguagem consensual sobre esses dois temas", informou o Itamaraty nesta quinta-feira (8).
De acordo com o embaixador e secretário de assuntos econômicos e financeiros do Itamaraty, Mauricio Lyrio, a mensagem que o Brasil quer passar na declaração final é sobre a "paz". "A mensagem principal, naturalmente, é a de que precisamos chegar à paz. Em relação não só a esses conflitos [Ucrânia e Palestina], mas a todos os conflitos", afirmou o diplomata que também é o sherpa do Brasil no G20 – designação utilizada para o representante que conduz as negociações em nome do governo.
As guerras em curso no mundo já foram tema de impasse nas últimas duas cúpulas de líderes do G20. Presididas por Indonésia e Índia, respectivamente, elas não chegaram a um consenso sobre a guerra entre Rússia e Ucrânia. Em 2022, o bloco se mostrou amplamente dividido sobre o tema. Na declaração conjunta, os países admitiram a existência de um impasse sobre o conflito e sequer chegaram a citar o tema explicitamente na declaração final.
Já no ano passado, quando a Índia estava à frente do G20, a declaração final da Cúpula de Líderes não condenou a Rússia pela invasão à Ucrânia e nem citou necessidade de retirada de tropas russas do país invadido. No documento, assinado por todos os membros, as nações concordaram que “todos os Estados devem abster-se da ameaça ou do uso da força para procurar aquisição territorial”, sem fazer referências à Rússia.
Apesar do impasse, o governo brasileiro não pretende abrir mão de parágrafos sobre as guerras na Europa e no Oriente Médio na declaração final do G20. Lula, ainda que tenha falhado em suas tentativas, tem buscado se posicionar como um líder regional. Nesse sentido, o Brasil chegou a lançar, junto com a China, um tratado de paz para a Ucrânia – documento rechaçado por levar em consideração os interesses russos e visto ainda como uma afronta ao Ocidente.
Zelensky não foi convidado e Lavrov vai representar Putin no G20
Ainda que seja um dos temas discutidos pela G20 desde que o Brasil assumiu a presidência do bloco, os principais atores da discussão sobre a guerra no leste europeu não vão participar do encontro. Vladimir Putin está impedido pelo Tribunal Penal Internacional e o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, apesar de ter solicitado participação no encontro, não foi convidado.
O sherpa brasileiro no grupo, Maurício Lyrio, justificou a falta de convite a Zelensky pelo papel econômico do G20. "Na sua essência [o G20] é um grupo que nasceu para discutir a coordenação internacional na área econômica para enfrentar crises", disse ao ressaltar que o bloco não deve substituir o papel das Nações Unidas (ONU) na promoção da paz e na prevenção de conflitos.
Já Vladimir Putin, ditador da Rússia, foi convidado, mas não vai comparecer ao encontro. Isso porque o autocrata russo tem um mandado de prisão expedido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) e o Brasil, com um dos signatários do Tratado de Roma, teria a obrigação de dar voz de prisão à Putin se ele viesse ao país. No último ano, o governo brasileiro chegou a articular a possibilidade do ditador vir ao Brasil sem ser preso.
O país tentou negociar um documento na Organização das Nações Unidas (ONU) prevendo a possibilidade de que chefes de Estado com mandados de prisão pudessem participar de reuniões e cúpulas internacionais sem serem presos. O documento, contudo, não foi aprovado. Putin também declarou recentemente que não viria ao Brasil porque "não queria atrapalhar os trabalhos" do fórum.
A última visita de Putin a território brasileiro foi em novembro de 2019. Impossibilitado de vir ao Brasil, o ditador vai enviar seu chanceler, Sergey Lavrov, para participar do encontro de líderes do G20 no Rio de Janeiro. Esta seria a terceira visita de Lavrov ao Brasil desde que o presidente Lula assumiu para seu terceiro mandato.
Líderes da China e dos Emirados Árabes Unidos se reúnem com Lula em Brasília
Lula vai receber ainda os líderes da China, Xi Jinping, e dos Emirados Árabes Unidos, Mohammed Bin Zayed Al Nahyan, para encontros em Brasília. A viagem dos líderes à capital brasileira acontece às margens do G20, bloco do qual os dois países fazem parte.
Xi Jinping vem à Brasília para ter reuniões bilaterais com o presidente Lula. O autocrata chinês desembarca no Distrito Federal na terça-feira (19) e a agenda com Lula em Brasília ocorre ao longo da quarta-feira (20). A expectativa é que Xi tente negociar uma possível adesão do governo brasileiro à Nova Rota da Seda, projeto de softpower chinês que fornece financiamento a países em desenvolvimento.
A adesão do Brasil ao programa não é consenso no governo brasileiro. Há o temor de que adesão do país ao projeto possa atrapalhar a relação com os Estados Unidos – o que traz riscos ainda maiores com a reeleição de Donald Trump. Há alas no governo, contudo, que defendem a entrada do Brasil no programa e maior aproximação com a China. Xi Jinping deve introduzir tal negociação com Lula.
Já em 21 de novembro, Lula recebe o Xeique Mohammed Bin Zayed Al Nahyan para agendas em Brasília. Os dois líderes participam do G20, no Rio de Janeiro, antes da viagem à capital brasileira. China e Emirados Árabes Unidos também são parceiros do Brasil nos Brics, bloco que o Brasil preside no próximo ano.
Além de Xi Jinping, Mohammed Bin Zayed Al Nahyan e o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, também já confirmou presença no encontro. O presidente argentino, Javier Milei, também é esperado no encontro. Conforme apurou a Gazeta do Povo com membros do governo argentino, a visita do libertário ao Brasil está sendo organizada.