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Com “amnésia seletiva”, Bolsonaro diz sobre Frota: “Sei nem quem é esse”
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Dois dias depois da expulsão do deputado Alexandre Frota (SP) do PSL, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou, nesta quinta-feira (15), que não conhece o parlamentar. “Sei nem quem é esse”, garantiu, ao deixar o Palácio da Alvorada, em Brasília.

Concretizado na terça-feira (13), o pedido de expulsão partiu da deputada Carla Zambelli, também do PSL, que que disse que a situação estava “insustentável” com o colega. Entre os motivos do desconforto estão as críticas feitas por Frota tanto ao partido como à Bolsonaro.

O parlamentar disse publicamente, por exemplo, que não concordava com a nomeação do filho de Bolsonaro, o também deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para o cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos. Em outra ocasião, se mostrou indignado com as falas do presidente, e disse que os aliados do governo só tiveram paz em dois momentos desde a posse: “quando o Twitter ficou fora do ar e quando Bolsonaro tirou o dente”.

Frota passou dos limites, sem dúvida, e fez com que Bolsonaro, agora, ficasse mais preocupado com o “alinhamento ideológico” (leia-se lealdade pessoal) dentro do PSL, um partido basicamente de aluguel que saiu de nanico para gigante na esteira do bolsonarismo. Com isso, levou de tudo para dentro, mostrando-se um verdadeiro saco de gatos (ou ratos). Traições serão inevitáveis. Até porque vários ali vieram da esquerda, numa conversão suspeita. Vários são oportunistas.

Mas a reação de Bolsonaro, ainda que compreensível para quem tem mentalidade militar e exige lealdade pessoal, é infantil, uma ironia boba. Ou, então, amnésia seletiva. Bolsonaro não lembra nem quem é Frota? Estamos aqui para refrescar sua memória! Afinal, os dois pareciam bem próximos na época da campanha, a ponto de eu mesmo escrever alguns textos preocupado com a linha do seu eventual futuro governo: seria Paulo Guedes ou a “frota tosca e reacionária” que só sabe xingar todo adversário?

Num desses textos, comentei o “convite informal” em tom de “brincadeira” que o então candidato Bolsonaro fez ao mesmo Frota para que fosse o seu ministro da Cultura. Bolsonaro pode ter memória curta, como sua militância que hoje odeia Frota e fala de seu passado como ator pornô, mas minha memória é um pouco melhor. Eis um trecho:

Se o economista liberal Paulo Guedes foi apontado como potencial ministro da Fazenda, por um lado, temos o risco de figuras da estatura intelectual de um Alexandre Frota terem participação ativa no governo, o que é, convenhamos, algo um tanto incômodo, quiçá assustador pela lente liberal. O próprio “mito” gravou um vídeo falando para Frota ir se preparando para ser ministro da Cultura.

Ao postar a notícia do Correio Braziliense, na qual consta o vídeo, a reação imediata de muitos fãs de Bolsonaro foi atacar as “Fake News”. Uma vez comprovado que foi o próprio Bolsonaro que disse isso, como dava para ter verificado no link da notícia, a turma passou a repetir que era só uma brincadeira, óbvio! Alguns, já adiantando que poderia não ser uma brincadeira, passaram a questionar qual o problema em ter Frota no comando da cultura, se já tivemos Gilberto Gil e a irmã de Chico Buarque.

Ora, para ser crítico ferrenho do PT e da esquerda, como eu certamente sou, é preciso defender um Frota na cultura? Eu não sabia disso. Não tinha a mais vaga ideia que se tratava de um concurso de feiura desses, onde o grande atributo do futuro ministro é não ser tão ruim quanto os comunistas. É isso que os seguidores de Bolsonaro mais aguerridos pretendem? Mirar no que há de pior para alegar que nada pode ser muito pior?

Se foi chiste ou não, só Bolsonaro poderá dizer. E seria bom que dissesse logo! Afinal, hoje mesmo, em seu discurso em Curitiba, vemos no vídeo lá no alto do palanque, bem pertinho dele, o próprio Frota, que tem sido um soldado bem ativo nessa pré-campanha, formando a militância engajada do capitão. E convenhamos: brincar com uma coisa dessas não é adequado para quem quer ser presidente!

Como fica claro, era uma preocupação dos liberais apoiar Bolsonaro justamente por conta da postura de gente como Frota, que agora o presidente finge nem saber quem é. Mas o modus operandi segue intacto. Frota foi queimado não por conta desse estilo, mas pela traição pessoal. O estilo ainda é adorado pelo presidente, adotado pela militância. Inclusive contra o mesmo Frota, agora inimigo mortal.

O dilema continua: para seguir adiante com as reformas liberais de Guedes, temos que engolir a “frota reacionária e tosca”. E isso é desesperador…

Rodrigo Constantino

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