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STF risca fósforo em paiol de pólvora e instiga narrativa bolsonarista de “cabo e soldado”
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Nesta segunda tivemos a notícia de uma censura explícita e abusiva no país: o STF mandou suspender uma revista porque traz uma denúncia grave contra um dos seus ministros. Em seu editorial, a Gazeta do Povo não poupou palavras duras para descrever o ato temerário:

Em mais um movimento temerário no seio do inquérito ilegal e abusivo aberto no Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar “fake news” e injúrias, difamações e calúnias que atingem a “honorabilidade e a segurança” do tribunal, o ministro Alexandre de Moraes mandou retirar do ar uma reportagem da revista Crusoé, divulgada também pelo portal O Antagonista, segundo a qual o empreiteiro Marcelo Odebrecht teria apontado que o presidente do STF, Dias Toffoli, é o “amigo do amigo do meu pai” na famigerada planilha da empresa. Embora a decisão não possa ser classificada como censura, ela carrega graves equívocos jurídicos.

Neste sábado (13), tivemos a oportunidade de discutir, por ocasião da condenação em primeira instância do humorista Danilo Gentili, o justo limiar entre a liberdade de expressão e a proteção da honra no tocante à liberdade de opinião e de crítica. Neste caso, estamos diante da mesma questão, mas agora no que diz respeito à “liberdade de crônica”, ou seja, à liberdade de noticiar e narrar fatos que podem ser desabonadores à honra dos indivíduos. Embora o conflito seja o mesmo, há critérios específicos que devem ser observados e nos quais a decisão de Moraes sequer chegou a esbarrar. 

[…]

A posição que equilibra a liberdade de crônica e a proteção da honra com base nos critérios do interesse público e da veracidade do relato, além de ser a que melhor protege os bens em jogo, é praxe no Brasil. No contexto das grandes operações contra a corrupção, já houve notícias muito mais desabonadoras sobre agentes públicos divulgadas pela imprensa. Aliás, basta lembrar que já tivemos a divulgação de denúncias de corrupção contra um presidente da República, no exercício do mandato, e nenhum tribunal cogitou tirá-las do ar. Não faria sentido alterar esse entendimento tradicional apenas porque se trata do presidente do STF – ao contrário, seria dar a ele um privilégio imoral e antirrepublicano. Ainda mais preocupante é que essa decisão equivocada tenha sido dada a pedido do próprio Toffoli – e no bojo de um inquérito, como já discutimos nesse espaço, absolutamente ilegal e abusivo.

O grau de autoritarismo salta aos olhos. O deputado Paulo Eduardo Martins desabafou: “Ao censurar a revista e , o STF reduziu a nobre toga negra a um trapo sujo a ser usado como mordaça. Mais uma proeza da pior formação de todos os tempos da Corte”.

O tiro, porém, saiu pela culatra: o STF instigou a curiosidade popular e, na era das redes sociais, a circulação do conteúdo da revista aumentou exponencialmente. João Luiz Mauad, do Instituto Liberal, chegou a comentar:

Já recebi no Zap, de três fontes diferentes, a matéria completa da Crusoé que foi censurada. Uma reportagem que ninguém havia lido, até porque não era aberta ao público, que agora todos vão ler. Até o Jornal Nacional já falou de censura e resumiu a notícia. É o que se pode chamar de um tiro no pé. Parabéns aos envolvidos.

Não bastasse essa medida arbitrária do STF na segunda, hoje cedo acordamos com essa postagem do general Paulo Chagas: “Caros amigos, acabo de ser honrado com a visita da Polícia Federal em minha residência, com mandato de busca e apreensão expedido por ninguém menos do que ministro Alexandre de Moraes. Quanta honra! Lamentei estar fora de Brasília e não poder recebe-los pessoalmente”.

Isso é preocupante demais! O STF está atiçando a população revoltada e indignada. Vai conseguir o que Eduardo e Carlos Bolsonaro não conseguiram: unir todos em torno do bolsonarismo radical, repetindo o bordão “um cabo e um soldado”. O povo se sente sem esperanças, pois lembra do alerta de Ruy Barbosa: “A pior ditadura é a do Poder Judiciário, pois não há a quem mais recorrer”.

Felipe Moura Brasil resumiu a sequência bizarra: “STF abre inquérito genérico contra supostos ataques, insere notícia sobre ministro no inquérito, censura revista que a publicou, multa em R$ 100 mil revista que cumpriu decisão retirando matéria do ar, e ministro acusa genericamente insinuações e inverdades. Escalada do absurdo”.

Onde isso vai parar? Não sabemos. Mas dificilmente pode acabar bem. Quando a maioria se mostra desacreditada e saturada de uma instituição fundamental para a república como o STF, que em vez de ser o guardião da Constituição mais parece agir como o principal fator de desestabilização política, então é a própria democracia que corre perigo. Tempos estranhos e perigosos…

Rodrigo Constantino

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