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Se não furar o teto fiscal o PT volta, ironizou um jornalista tucano. A decisão de distribuir um auxílio extra de R$ 400 a milhões de pessoas gerou polêmica e críticas ao governo por parte de liberais. São críticas legítimas. Faltam recursos e essa decisão envolve a necessidade de malabarismos para não romper o teto de gastos, um limite legal imposto que representou enorme avanço institucional em nosso país, refém eternamente do populismo e do estado hipertrofiado.

O editorial da Gazeta do Povo tocou nesse ponto hoje: "O desarranjo fiscal é monstro difícil de conter. Uma vez disparado o processo, sua reversão exige uma dose de esforço e responsabilidade que, infelizmente, raramente se vê em Brasília". Políticos normalmente querem gastar mais e distribuir benesses aos pobres, o que rende votos. A decisão de Bolsonaro, portanto, poderia se enquadrar como eleitoreira.

É preciso levar em conta a conjuntura, claro. Estamos numa pandemia e a reação a ela, com lockdowns sem precedentes, jogou milhões de pessoas na pobreza. Alguma medida de auxílio se fez e ainda se faz necessária, e é possível que Bolsonaro esteja genuinamente preocupado. Mas como o cobertor é curto, o abandono da responsabilidade fiscal estressa o mercado, pois os investidores fazem contas e descobrem que fica insustentável a situação fiscal. A taxa de juros sobe, o real se desvaloriza, a bolsa cai, e isso não é relevante apenas para especuladores ricos, pois afeta o crescimento econômico e a geração de empregos.

Bolsonaro disse, ainda durante a eleição, que ele entendia de política e Paulo Guedes, seu Posto Ipiranga, entende de economia. É natural alguma tensão entre ambos, já que o economista vai tentar segurar gastos que interessam ao político. Guedes tem sido firme ao segurar a chave do cofre, em que pesem ataques oportunistas de militantes tucanos. O jogo é duro, os dilemas são reais. Até aqui, temos um governo que tem respeitado a agenda liberal, dentro das possibilidades políticas, promovido privatizações, resistido à tentação populista.

Essa medida pode ser um divisor de águas? Muitos enxergam que sim. E talvez seja mesmo. Vale só contextualizar que, além do aspecto pandêmico conjuntural, há sim a ameaça concreta da volta do PT e do Foro de SP. Deixo então uma pergunta no ar aos liberais mais críticos: se o preço para evitar essa volta for uma medida como esta, ele seria aceitável ou não? Lembrando o que representaria a volta do PT em termos de destruição da economia, volta da roubalheira que foi estancada, autoritarismo etc.

Alberto Fernández, o presidente lulista da Argentina, aprovou extensão do "planes", uma espécie de Bolsa Família, mesmo para quem já conseguiu emprego! Isso sim, é populismo na veia, não?

Política não é terreno para purista. O que não quer dizer que os liberais não tenham que manter o pé firme na defesa de seus valores e princípios, e condenar os desvios populistas. Daí o dilema: o aumento do programa social da forma que deve ser feito representa um abandono da responsabilidade fiscal, mas não disponibilizar uma renda extra aos mais pobres nessas circunstâncias pode significar a volta dos populistas corruptos. Até onde o liberal deve ceder para impedir a volta do PT é algo que vai da consciência de cada um.

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