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Ponta Grossa – O encanto da humanidade por datas que encerram ciclos serve de estímulo para o resgate da memória, dos tempos passados, a história construída no cotidiano, dia após dia. É o que está acontecendo com cidades históricas do Paraná, que ao se aproximarem do centenário, mobilizam a comunidade e forçam o resgate cultural. De acordo com dados do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), 29 das 399 cidades paranaenses têm mais de 100 anos de instalação. Prudentópolis chegou ao centenário no ano passado. Em 2007 foi a vez de Irati e Carlópolis. A festa está sendo preparada para o ano que vem em União da Vitória e São Mateus do Sul.

Nessas datas comemorativas, muito do que dependia apenas da lembrança dos pioneiros vira registro histórico oficial, que pode ser usado no presente e é referência para o futuro. "As comemorações ou ritos permitem prestar atenção e marcar elementos da identidade. É como acontece no casamento. O relacionamento entre as pessoas é construído no cotidiano. Mas no aniversário do matrimônio ou quando toca aquela música que é especial para o casal, muito do que viveram junto é relembrado", compara o doutor em História Cultural, Edson Silva.

Essas datas põem o povo em festa. Comissões são organizadas para decidir como serão as celebrações e reunir documentos e objetos históricos. A importância dos pioneiros é reconhecida pela comunidade. Muitos jovens cercam os anciões à espera dos causos sobre a formação da cidade e sobre o tempo em que não existiam luz elétrica e automóveis.

Para aproveitar o momento de sensibilidade coletiva, a historiadora Audrey Farah comanda um trabalho de registro histórico das cidades centenárias. Em dezembro do ano passado, ela lançou o livro sobre Prudentópolis. A obra que conta o século de vida de Irati deve estar concluída até o fim do primeiro semestre de 2008. Três pessoas, durante 18 meses, se dedicam exclusivamente a coletar material, como fotos, documentos, além de fazer entrevistas. "É a concretização da memória oral e viva. O tempo é precioso, porque muito se perde com a morte de pioneiros", reforça. O trabalho de historiadores por "hobby" – e são pelo menos quatro colaboradores em Irati – compensa a falta de registros oficiais.

Audrey relata que o trabalho em Prudentópolis foi mais braçal. "Às vezes, a gente chegava na casa e perguntava sobre a história do lugar. A reposta era ‘ah, mas eu não tenho nada para te contar’. Mas a gente puxava assunto e os relatos apareciam. É que as pessoas não achavam que isso é história, que tem relevância para ser registrada", diz. A colonização polonesa e principalmente ucraniana acabou deixando os moradores da cidade isolados, muito fechados em sua própria cultura. "Isso também tem uma lado positivo. Pode ser revolucionário. Uma prova única de autovalorização e preservação", analisa.

Em Irati, conta a historiadora, o problema maior foi a divergência entre as fontes. Entre as décadas de 40 e 60, a cidade tinha força econômica e política e isso colaborou para a formação de um acervo. Para a diretora municipal de Cultura, Rosana de Castro Casagrande, é um encerramento de um ciclo, um ritual de passagem. Ela assegura que o interesse da comunidade por qualquer evento cultural aumentou significativamente a partir das comemorações para os 100 anos da cidade. "É como se houvesse necessidade de que algo acontecesse para impulsionar um sentimento adormecido", avalia Rosana. No cinqüentenário, a cidade ganhou uma estátua gigante de Nossa Senhora das Graças, que vigia Irati do alto de um morro. Para o centenário, está em elaboração um amplo complexo cultural, com teatro, que leva o nome da mais conhecida iratiense, a atriz Denise Stoklos.

Audrey ainda espera os reflexos do trabalho. "Da comunidade, ainda não vi reação. Mas pesquisadores já estão usando o livro como referência", conta. Mas ela acredita que o livro leva à reflexão e que num futuro próximo, ou distante, pode servir de base para transformações. "Para os padrões mundiais, uma cidade centenária é nova. Ainda tem muito por fazer. Os rumos podem ser modificados", enfatiza. Para ela, o importante é lembrar que cada um é personagem da sua própria história e da memória da comunidade até para que, quando for iniciada a pesquisa para os 150 anos das cidades, os pesquisadores não encontrem tanta dificuldade.

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