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No caminho diário do Pinheirinho para o Batel,  Oscar Cidri divide espaço com ônibus e carros. Quem opta pelas calçadas disputa lugar com os pedestres | Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo
No caminho diário do Pinheirinho para o Batel, Oscar Cidri divide espaço com ônibus e carros. Quem opta pelas calçadas disputa lugar com os pedestres| Foto: Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo

Poder público

Mudança cultural deve ser precedida de incentivos

Para especialistas em mobilidade urbana e educação no trânsito, a inclusão da bicicleta como meio de transporte é parte, também, de uma mudança cultural. Antes, porém, é preciso incentivar o uso, prioritariamente por meio do oferecimento de infraestrutura adequada.

"Há só uma pequena parcela da população que vira ciclista por acreditar que essa é uma atitude saudável, sustentável", opina o coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Carlos Hardt. "Para que a bicicleta seja uma alternativa para grande parte das pessoas, é preciso mostrar que ela vale a pena. E isso é papel do Estado, que tem de induzir ao uso. Não há outro jeito", completa o urbanista.

O coordenador de Educação para o Trânsito do Departamento de Trânsito do Paraná (Detran-PR), Juan Ramon Franco, lembra que o conflito entre motoristas e ciclistas, tão comum nas ruas, foi potencializado ao longo dos anos justamente pela falta de espaço adequado para os adeptos das bicicletas. Franco acredita que, enquanto não se oferecerem ciclovias suficientes, essa disputa desproporcional ainda vai causar muitos sustos e acidentes. Para azar dos ciclistas.

"É a mesma disputa de espaço que já ocorre entre motorista e motociclista. O individualismo e o egoísmo se transferem também para o trânsito, não importa qual o veículo", avalia. (RW)

Bicicletas serão integradas ao metrô

A implantação do primeiro trecho da Linha Azul do metrô curitibano, da CIC-Sul até o centro da cidade, abrirá espaço para as bicicletas, segundo a prefeitura. As canaletas do expresso no eixo Norte-Sul serão transformadas em ciclovia, num trecho de quase 13 quilômetros que vai do Pinhei­­rinho até a região central de Curitiba.

"Além dos ônibus do transporte coletivo, nosso metrô será integrado também à bicicleta, proporcionando um deslocamento alternativo seguro, e estimulando a cultura da bicicleta como modal", destaca o prefeito Luciano Ducci.

De acordo com a prefeitura, a implantação dos boulevares para a integração de pedestres e ciclistas nas canaletas por onde hoje circulam os ônibus expressos foi apontada pela presidente Dilma Rousseff, durante o anúncio dos recursos para o metrô, como um dos destaques do projeto curitibano.

O Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curi­­tiba (Ippuc) está projetando estacionamentos para bicicletas nas 13 estações de embarque e desembarque do metrô. As­­sim, quem estiver pedalando na ciclovia e quiser continuar o deslocamento usando o metrô, poderá guardar a "magrela" dentro de uma estação. Cada uma delas terá espaço para 35 bicicletas, totalizando 455 vagas ao longo do trecho do metrô. O Ippuc também está projetando estacionamento para carros e motos dentro das estações.

Na superfície, junto com a ciclovia, as canelas terão ainda equipamentos para lazer da população e paisagismo. "É um espaço urbano que será devolvido aos pedestres e aos ciclistas, uma espécie de parque li­­near e de convivência", afirma o presidente do Ippuc, Clé­­ver de Almeida.

Da Redação

  • Veja o percurso feito por dois ciclistas entre suas casas e locis de trabalho

Um olho na frente, visualizando o caminho a ser seguido, e outro atrás, atento aos veículos que passam, geralmente a poucos centímetros de distância. Na verdade, para quem adotou a bicicleta como principal meio de transporte em Curitiba, faltam olhos para prever todos os perigos que cercam os que trafegam em duas rodas e disputam espaço com carros, ônibus e pedestres. A falta de uma rede cicloviária abrangente e interligada – que atenda não somente aos ciclistas ocasionais de fim de semana – dificulta trajetos rotineiros, como o deslocamento até o trabalho ou a universidade.

A percepção de que faltam es­­paço e respeito no trânsito não é nova para os ciclistas, mas a mobilização coletiva nos últimos me­­ses vem ganhando ainda mais força nas ruas e redes sociais. O técnico em tomografia Oscar Cidri é um desses curitibanos empenhados pela causa, os chamados "cicloativistas". Há 12 anos, em meio a um trânsito cada vez mais caótico e vagaroso, optou por deixar o carro em casa. Desde então, só vai para trás do volante em dia de muita chuva.

A longa experiência como ciclista, porém, não o isenta de sustos e acidentes no trânsito, devido a uma condição comum a tantos outros – nos 12 quilômetros que percorre diariamente, não há sequer um metro de ciclovia nas proximidades. "Sou contra usar a canaleta (pista exclusiva para ônibus), porque sei que uma freada brusca que o motorista dê ao se deparar com um ciclista pode ferir as pessoas dentro do ônibus. O problema é que, pedalando nas vias marginais, várias vezes já levei ‘fino’ de carros que andam em alta velocidade", relata.

O servidor público José Carlos Assunção Belotto conhece – e bem – os perigos a que estão submetidos em toda a cidade os ciclistas. A paixão pela bicicleta, inclusive, o levou para a frente do programa Ciclovida, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que tem como objetivo pesquisar e divulgar os benefícios da adoção da bicicleta como meio de transporte. Be­­lotto, porém, reconhece que, em meio a uma estrutura cicloviária deficitária, nem mesmo os benefícios físicos, ambientais e econômicos das magrelas, tão alardeados e conhecidos, são suficientes para incentivar o uso da bike. "A falta de infraestrutura faz mais falta ainda para quem está querendo começar", afirma o servidor da UFPR.

Lazer ou trabalho?

Para ciclistas e urbanistas, as ciclovias curitibanas, implantadas há três décadas, pecam justamente em um fator fundamental: são destinadas ao lazer, e não para a locomoção entre grandes distâncias. Sinal claro de que, ao longo do tempo, a bicicleta acabou não sendo levada a sério como meio alternativo de transporte.

No entanto, a pressão da sociedade civil, reforçada pelo esgotamento dos outros meios de transporte, parece estar provocando mudanças. "O meu medo é que os gestores façam intervenções sem a qualidade técnica necessária, para argumentar depois que foi a sociedade que não aderiu ao uso, por um problema cultural", afirma Rafael Milani Medeiros, mestrando em Gestão Urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e autor de dois estudos sobre o tema.

Plano prevê 400 km de vias para ciclistas

Elaborado por técnicos e engenheiros do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc) desde 2008, o Plano Diretor Cicloviário deve estabelecer as diretrizes para que, enfim, a rede de ciclovias atenda à demanda dos usuários que adotaram a bicicleta como principal – ou único – meio de transporte. As mudanças, que contemplam a revitalização dos 118 quilômetros de ciclovias existentes e a criação de cerca de 300 quilômetros, devem ser adotadas a médio e longo prazo. Isso, se os projetos não esbarrarem na falta de recursos ou vontade política.

O ceticismo surge junto com as previsões orçamentárias de investimentos. No ano passado, a prefeitura chegou a apro­­var no orçamento anual R$ 2,276 milhões para serem utilizados ex­­clu­­sivamente na "im­­plan­ta­­ção e revitalização de in­­fra­­es­­­­tru­­tura ci­­cloviária do município". Uma revisão orçamentária, po­­rém, reduziu os investimentos para R$ 26 mil, va­­lor que nem sequer chegou a ser em­­penhado, segundo o portal de transparência Curitiba Aberta. Neste ano, o valor inicialmente previsto também chegou a R$ 2 milhões. Outra revisão baixou a oferta de recursos para R$ 385 mil.

Mesmo com as revisões, a coordenadora de Mo­­bilidade Urbana do Ippuc, Maria Miranda, defende que as melhorias previstas no Plano Cicloviário "são um caminho sem volta". Para ela, o próprio envolvimento da comunidade no processo – atualmente, o plano recebe sugestões e indicações de entidades e dos próprios ciclistas – e o estabelecimento das diretrizes em um plano diretor, que servirá de base para futuras gestões, garantem a execução dos projetos.

"Há um envolvimento tão gran­­de da comunidade e do corpo técnico que o prefeito, seja ele quem for, não vai regredir nessa dis­­cussão", reforça. "Não tenho ne­­nhum pingo de dúvida quanto à aplicação cada vez maior de re­­cur­­sos para a estrutura cicloviária".

A partir do próximo domingo, será inaugurado já em Curitiba o Circuito Ciclístico, uma rede de ciclofaixas de lazer, feitas a partir da demarcação das vias e destinadas a circulação exclusiva de bicicletas nos fins de semana. A pintura e a sinalização – que serão permanentes – já começaram na área central da cidade. O trajeto compreenderá cerca de 4 quilômetros da região central, passando pelas ruas XV de Novembro; Marechal Deodoro; Nilo Cairo; Emiliano Per­­neta; Visconde de Nácar; André de Barros e Avenida Mariano Torres.

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