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Não sei se vou sentir saudades de 2010; espero que não. Sempre rezamos para que o ano seguinte seja melhor que o anterior. Pelo olhar da estatística de longo prazo, isso sempre acaba por ser verdade, pelo menos por aqui – o Brasil de hoje é muito melhor do que era em 1970, por exemplo, ainda que uma tendência milenarista do nosso espírito quase sempre considere que as coisas pioram ano a ano – todo mundo, em algum momento, acabará por dizer que "no seu tempo" as coisas eram diferentes e melhores. Isso também é verdade na dimensão da vida pessoal, que é a que nos interessa de perto – morremos todos no fim, por mais espetacular que seja o filme. Porém, consideradas em bloco e coletivamente, as coisas melhoram. Talvez eu seja um otimista irremediável, mas não gostaria de ser atendido por um médico do século 18, depender dos humores de um imperador, ou pertencer à juventude nazista. Sim, sempre há alguém que se sentiria melhor se vivesse na Idade Média, e às vezes com evidente razão, como as vítimas da região de Petrópolis, mas, quando calculamos o conjunto, o indivíduo e a exceção desaparecem.

Algumas coisas, entretanto, parecem que não saem nunca do lugar. A tragédia das chuvas, de novo, agora em geografia diferente, com suas filas de mortos e sonhos soterrados, relembra o que insistimos em esquecer na nossa felicidade retórica: o quanto o Brasil é um país pobre, de periferia, sem rumo, ignorante e desqualificado em praticamente todos os seus estamentos, faixas sociais e atividades. O grau de mediocridade da campanha política do ano passado talvez tenha sido assustador para a sensibilidade do cidadão, mas tratava-se da correspondência exata do país, que de alto a baixo, como uma maldição centenária, não consegue jamais separar o público do privado. Dos passaportes diplomáticos à ocupação desenfreada de morros sob o patrocínio do populismo corrupto, da propaganda de governo feita diariamente por bancos oficiais à luta obscena por bocas no Estado, em toda parte o Brasil insiste em continuar uma fazenda, sempre fiel à sua origem.

Bem, uma coisa mudou radicalmente: o estilo da Presidência da República. Neste começo de ano, em poucos dias parece que estamos todos aliviados, ouvindo uma longa e agradável extensão de silêncio, depois de uma década de aguda e irritante estridência masculina, dos pavões, galos de briga e tucanos bicudos. Os cronistas políticos farejam na diferença bordões novos a consolidar – a "gerentona" discreta, ou a interina de Lula; os mais sofisticados preferem dizer que é um estilo "low profile". Pois eu, que não sou especialista em nada, gostei desse início da Dilma, um jeitão mais racionalizante, menos mercurial, chorão, enganador e sentimentalista.

E menos confuso, também; eu queria falar de Curitiba em janeiro, quando a cidade fica especialmente agradável, mas perdi o fio da meada.

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