“Xadrez renovador”

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Minha primeira ligação com trabalho em jornal não envolveu literatura. Na verdade, comecei como, digamos, um jovem empreendedor de 14 anos, fundando com um colega um periódico mimeografado que tinha o nome de "Xadrez renovador". Sim, eu jogava xadrez. Pior: fui um adolescente fanático pelo jogo, um fato tanto mais grave quanto menos competente eu era no tabuleiro. Aprendi a mover as peças (e não "pedras", como diriam os "patos") e em seguida me caiu um livro de xadrez nas mãos, o que faz uma diferença fantástica nesse primeiro momento. Em poucas páginas se aprendem dicas que, por conta própria, leva-se anos para perceber, o que dá uma instantânea ilusão de inteligência e sabedoria, que é tudo que um adolescente precisa para sobreviver no seu mundo selvagem.

Dali a fundar o jornal, foi rápido. Eu saía do trabalho no escritório da Marechal Floriano e em poucos passos pegava o elevador que me levava ao Clube de Xadrez. Era fascinado pelos relógios do jogo, com seus dois mostradores, e pelos enxadristas que, entre goles de conhaque, jogavam torneios relâmpagos (partidas de apenas cinco minutos). Os finais de jogo, com os ponteirinhos pendurados em segundos mortais, eram sempre eletrizantes – se é que um jogo de xadrez pode ser eletrizante. O "Xadrez renovador" tinha umas quatro ou cinco páginas compostas em estêncil. Para a geração do computador ficar sabendo, uma revolução inteira no mundo foi feita à base de estêncil, o blog da época. Estêncil era uma folha porosa com um cheiro forte, que, depois de datilografada, prendia-se numa roda metálica movida por uma manivela. Um recipiente de tinta fazia o serviço de impressão. Esse conjunto pré-histórico se chamava "mimeógrafo". As folhas saíam meio borradas, as mãos ficavam imundas, mas o jornal, depois de grampeado, era razoavelmente legível.

No "Xadrez renovador" havia transcrição de partidas (com anotações do tipo 12.C3BR-B5T, e sempre eu acabava trocando alguma letra na datilografia, o que exigia correções a caneta em cada exemplar), e artigos sobre temas como "Defesa Siciliana" ou "Gambito do Rei".

Xadrez "renovador" por quê? Bem, no início dos anos 60 tudo tinha de ser "renovador". E a guerra fria encontrava no xadrez, há um século dominado pelos russos, um símbolo poderoso. No melhor espírito do tempo, eu gostava dos jogadores "românticos", em particular de Mikhail Tal, um enxadrista mirabolante, de imaginação prodigiosa, que arriscava o jogo em combinações complicadas. Análises frias mostram que seus movimentos eram suicidas, mas os adversários quase nunca tinham tempo e talento para avaliar todas as possibilidades no calor da partida. Com o seu método guerrilheiro, Tal chegou a campeão do mundo – um Che Guevara que deu certo. O jornal durou uns três números, quando enfim me caiu a ficha de que talvez eu tivesse mais futuro escrevendo do que jogando xadrez.