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Já tinham se passado quase cinco meses desde que a Primeira Guerra Mundial começara. Aquele dezembro de 1914 definitivamente seria diferente. No front ocidental da Europa, a "terra de ninguém" separava as trincheiras alemãs das britânicas e francesas. Mas o conflito abrira um fosso ainda maior: soldados de ambos os lados estavam apartados de suas famílias e amigos no Natal.

A Grande Guerra, porém, ainda não havia sepultado a humanidade daqueles homens. Alguns soldados alemães decidiram decorar suas trincheiras com velas e árvores de Natal. E passaram a entoar canções natalinas. Os britânicos contra-atacaram. Não com armas ou tiros. Mas com seus próprios cânticos.

E então um pequeno milagre aconteceu. Inimigos começaram a se saudar a distância, ainda entrincheirados. Um militar mais ousado atreveu-se a desbravar a terra de ninguém. Não houve disparos ou hostilidades. E outros soldados dos dois lados também o acompanharam. O campo de batalha virara território de confraternização. O impensável estava acontecendo.

Soldados inimigos trocavam tabaco, bebida, comida, chapéus, meros botões de roupa. O que estivesse à mão virou presente de Natal. Alguém tinha uma bola. Logo, alemães e britânicos disputaram uma amistosa partida de futebol. Vitória da Alemanha – sem a necessidade de um único tiro de morteiro ou fuzil.

Os comandantes militares, ao tomarem conhecimento do que estava ocorrendo, se revoltaram. Emitiram ordens para proibir a celebração com o inimigo. Em vão. O cessar-fogo informal havia se espalhado pelo front. Estima-se que 100 mil soldados baixaram as armas para comemorar o Natal com o exército adversário.

Nos anos seguintes, soldados tentaram reeditar a trégua natalina em ocasiões distintas. Mas os generais, temerosos do poder da boa vontade humana em plena guerra, trataram de dissuadir a maior parte das tentativas. Os armistícios informais, decididos pelas tropas e não pelos comandantes, foram muito pontuais. Mas a trégua do Natal de 1914 entrou para a história como um exemplo da resistência da humanidade, da civilização, em meio à barbárie.

Há exatos 100 anos, aqueles soldados tinham muito a perder ao se aventurar pela terra de ninguém para estender a mão ao inimigo. Ainda assim, foram adiante. Para a maioria das pessoas, nunca haverá tanto em jogo. E é imensamente mais fácil deixar as desavenças para trás – estejam elas em casa, na comunidade, no trabalho, com os amigos. Talvez esse possa ser o pequeno milagre deste Natal: transformar a terra de ninguém – o espaço de conflito ao qual todos estão submetidos – numa terra de todos, de confraternização. Nem que seja por um único dia.

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