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Sabe aqueles adolescentes e jovens que estão sempre digitando algo em um telefone ou outra maquininha digital? Aqueles que encontram distração permanente na interação com as telas de suas maquininhas? Essa moçada é chamada de Polegarzinhas e Polegarzinhos pelo filósofo francês Michel Serres. Não é uma crítica, nem um deboche. Serres, um senhor de 82 anos, estrela da vida intelectual francesa, admira a moçada que é rápida para digitar e fala dela com carinho no livro Polegarzinha (Ed. Bertrand Brasil). Ele é professor na Universidade de Stanford, na Califórnia, convive com estudantes e é capaz de resumir um fenômeno que todos estamos vendo: o ambiente mudou tanto que dá para afirmar que esses jovens são novos seres humanos.

Essa é a ideia básica do livro. Parece assustador, mas, para o filósofo acostumado a olhar o mundo a partir da realidade dos países desenvolvidos e a refletir sobre ele, há o que festejar. A primeira novidade que Serres comemora é o que ele chama de nascimento do indivíduo. As tecnologias implodiram as comunidades, enfraqueceram as definições do que é ser homem ou mulher, do que é ser francês ou americano (quando há tantas famílias de imigrantes à volta), do que é "ser" de uma religião. O resultado é o nascimento de alguém que não entende o espaço, nem o conhecimento, nem o idioma como seus antepassados. "Comparando os inconvenientes disso que os velhos ranzinzas chamam de ‘egoísmo’ com os crimes cometidos por ou pela libido de pertencimento – centenas de milhões de mortos –, amo de forma apaixonada esses jovens", diz ele.

É uma perspectiva europeia, que leva em conta que as novas gerações, seus pais e professores, nunca viveram uma guerra (ao contrário da geração de Serres, impactada por duas guerras mundiais seguidas), e talvez estejam menos dispostas a aceitar esse tipo de disputa.

Se ele falasse dos brasileiros, teríamos algo parecido. No caso do Brasil não foram guerras que marcaram várias gerações, mas golpes políticos e períodos de ditaturas. Agora, os meninos e meninas que estão por aí cresceram na democracia.

Intriga-me o futuro dos que são crianças e jovens hoje. Quando os vejo absortos pela tecnologia, me pergunto como viverão. Blade Runner, Matrix e os contos de Ray Bradbury me assustaram. Neles a tecnologia toma conta das nossas vidas e nos transformamos em criaturinhas manipuladas e inconscientes da realidade. Sim, eu sei, vivemos todos meio entorpecidos pelos assuntos do dia a dia e inconscientes da realidade. Mas e o medo de que a tecnologia nos distraia ainda mais, nos entorpeça ainda mais? Exagero? Assim espero.

Serres é otimista. Sua Polegarzinha não precisará carregar uma cabeça pesada de tanta informação, já que tudo que precisa saber pode ser encontrado em algum arquivo digital. Sobrará mais espaço para a "intuição inovadora e vivaz". Um problemão para as escolas, que precisam mudar a forma de ensinar. Aliás, ensinar o que mesmo? A pensar, a explorar essa intuição. Despejar conteúdo não faz mais sentido.

Ainda me pergunto o que farão as crianças com o estilo de vida que nós inventamos e que ensinamos a elas: consumista, baseado em preocupações com o status social, com a necessidade de ganhar dinheiro, indiferente aos prejuízos que impomos à natureza. Herança pesada, esta. É ela que pode pôr tudo a perder. É ela que tem de ser jogada fora pelas Polegarzinhas e Polegarzinhos. Aí viverão melhor, com ou sem tecnologia.

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