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TRF-3 reformou decisão da primeira instância| Foto: Divulgação/CNJ

O Ministério Público Federal (MPF) recorreu da decisão do Tribunal Regional da 3ª Região (TRF-3), em São Paulo, que anulou a condenação imposta à União em primeira instância por danos morais à família do ferramenteiro Antonio Torini, preso durante a ditadura militar. A Procuradoria da República em São Paulo entrou na ação por considerar que o caso está envolvido por interesse público e social. O recurso de embargos de declaração foi enviado ao tribunal na segunda-feira (22).

Em seu voto, o desembargador Johonsom Di Salvo, relator do caso no TRF-3, afirmou que o militante de esquerda fazia parte de movimentos que defendiam a ditadura do proletariado, com o objetivo de implantar um governo comunista no Brasil e subverter o regime vigente.

Já na avaliação do procurador Marlon Alberto Weichert, do MPF, o novo acórdão do TRF-3 convalidou atos de repressão política do regime de exceção e transferiu ao ferramenteiro a culpa pela violação de seus direitos humanos.

O processo chegou ao TRF-3 depois que a viúva de Torini, Livonete entrou com um pedido para aumentar a indenização de R$ 150 mil fixada na 3ª Vara Federal de Santo André. O desfecho do caso na Sexta Turma da Corte foi em sentido oposto: os desembargadores decidiram anular a sentença de primeira instância e, com isso, o pagamento da indenização.

Antonio Torini era funcionário da Volkswagen e militava no Movimento pela Emancipação do Proletariado (MEP). Em agosto de 1972, foi detido na sede da montadora e levado ao Departamento de Ordem Pública e Social (DOPS) de São Paulo, onde passou 49 dias preso e sob tortura. Dois anos depois, ao ser julgado pelo Superior Tribunal Militar, acabou condenado a mais dois anos de detenção.

Após cumprir a pena, Torini foi libertado, mas passou a constar nas listas trocadas pela Volkswagen com outros empregadores e, de acordo a defesa, por esse motivo não conseguiu emprego. Em 2020, montadora alemã fechou um acordo de reparação com o MPF e com o Ministério Público de São Paulo para o pagamento de R$ 36 milhões pelo apoio à ditadura. Tironi morreu em 1998 e, segundo a família, tinha problemas de saúde.

Em novembro do ano passado, o juiz José Denilson Branco, da 3ª Vara Federal de Santo André, decidiu que a União deveria pagar uma indenização de R$ 150 mil aos Torini. "O dano em questão é aquele que atingiu a esfera íntima da autora e seu falecido marido, seu sofrimento, sua humilhação", escreveu o magistrado. Na sentença, o juiz considerou que a União deve ser responsabilizada pelo dano moral extrapatrimonial causado à família por agentes públicos no exercício da função e em nome do Estado. A Comissão de Anistia já havia se manifestado favorável ao pagamento em resposta a um requerimento apresentado pelo próprio Antonio Torini antes de sua morte.

No Tribunal Regional da 3ª Região (TRF-3), ao julgarem o recuso da viúva pelo aumento da indenização, os desembargadores Diva Malerbi, Toru Yamamoto e Souza Ribeiro, membros da Sexta Turma da Corte, seguiram o entendimento do relator Johonsom Di Salvo.

Ditadura do proletariado

Em seu voto, o desembargador Di Salvo classificou como criminosas as condutas de Torini por considerar que o militante de esquerda estava associado a movimentos e partidos defensores da ditadura do proletariado e de uma organização política empenhada em implantar um governo comunista no Brasil e subverter o regime vigente.

"Está claro que Antonio Torini colocou-se, ativamente, contra a ordem então vigente e que suas ações e condutas amoldavam-se a delitos previstos pela legislação que - mal ou bem - representava o direito repressivo vigente. Portanto, para a época, as condutas de Torini eram criminosas (subversivas), eram investigadas pelo DOPS, sujeitavam seus autores a prisão com incomunicabilidade e a denúncia pelo Ministério Público Militar, com julgamento pela Justiça Militar da União", escreveu o desembargador.

Na avaliação do relator, a prisão e o banimento sofridos pelo ferramenteiro foram "consequências jurídicas de seus atos que tendiam à implantação de uma ditadura comunista no Brasil".

"Não há espaço para indenização do agente dessas condutas a ser paga, via judicial, pela União, eis que o infrator das leis vigentes era Antonio Torini, vinculado a movimentos e partidos defensores da ditadura do proletariado. Dessa maneira, não se pode indenizar a suposta "dor moral" de quem se submeteu aos rigores das leis vigentes pela própria vontade consciente, sabendo que infringia a legislação penal da época, onde a investigação, o processo e o julgamento eram as consequências legais, sem falar nas consequências da condenação penal", considerou.

Di Salvo também colocou sob suspeita que Antonio Torini tenha sido de fato torturado. Embora advogados Bruno Luis Talpai e Victor de Almeida Pessoa, que representam os Torini, tenham reunido um acervo documental de milhares de páginas indicando, por exemplo, que o ferramenteiro passou quase dois meses sendo interrogado pelo delegado Affonso Celso de Lima Acra, o desembargador considerou que não há provas dos abusos.

"Se a viúva e os filhos de Antonio Torini desejam ser indenizados porque há mais de quarenta anos o marido e pai foi torturado, deveriam apresentar um mínimo de prova a respeito, não bastando juntar enxurrada de documentos que demonstram somente que o mesmo foi processado e preso porque conspirava contra a ordem jurídica vigente, intentando implantar o comunismo no Brasil", escreveu Di Salvo.

O magistrado também classificou como tardio o pedido de reparação formalizado pela família. Pela jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ), ações desta natureza são imprescritíveis.

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