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 | Ilustração: Robson Vilalba
| Foto: Ilustração: Robson Vilalba

A região que um dia viu a roda ser inventada e o homem dominar o fogo está longe de viver seus dias de paz. Antes de bombas e atentados assombrarem o Oriente Médio, a região surgia como o “berço da civilização”. Cerca de 3,5 mil anos antes de Cristo nascer, a localidade entre os vales dos rios Tigres e Eufrates presenciava o surgimento de uma civilização avançada na chamada Mesopotâmia – hoje, Iraque.

Técnicas agrícolas e pecuárias foram desenvolvidas por esses povos. A alquimia e linguagem deram seus primeiros passos. Essas milenares civilizações ensinavam ao resto do planeta técnicas que influenciariam diretamente o mundo moderno.

Como explica Jorge Mortean, mestre em Estudos Regionais do Oriente Médio e professor da fundação Armando Alvares Penteado, o “berço civilizatório” compreendia dois grupos civilizatórios: sumérios, elamitas e medas, na Mesopotâmia, e os núbios e egípcios, próximo ao Rio Nilo. “O convívio entre estes povos era pacífico, pois o planejamento social era algo avançadíssimo”, explica Mortean.

Com o passar dos anos, o aumento demográfico ameaçava a segurança alimentar dessas sociedades. “Os povos travaram disputas por maiores domínios territoriais, na tentativa de acessar mais recursos naturais, sobretudo hídricos”, relata. Com proximidades étnico-linguísticas entre uns e outros, o resultado dessas lutas foram a formação de grandes impérios, como Assírios, Caldeus, Babilônicos, Persas, Fenícios e Faraônicos.

“A região, apesar das disputas políticas, não vivia em infindáveis conflitos como hoje. Ao contrário, encontrava-se no seu ápice científico e cultural”, explica.

Mudança

Contudo, a partir do século 3, duas potências da época, Pérsia e Roma, com o chamado Império Bizantino, disputaram cada milímetro daquela região.Foram séculos de luta. As batalhas seguiram até o século 7, quando surge o Islã, fundado pelo profeta Maomé.

Com a expansão do islamismo,foi criado o califado como símbolo da unidade do Islã. Diante disso, algumas tentativas de cristianizar a região tiveram início –de 1096 até 1291 oito Cruzadas tentaram êxito no Oriente Médio.

“Os problemas políticos, e não culturais, com o Ocidente começam quando a Europa se cristianiza e tenta atrasar o desenvolvimento técnico-cultural dos árabes, barrando sua expansão territorial. Os conflitos se estabilizaram depois das Cruzadas”, resume Mortean.

A partir do século 15 se forma um novo império muçulmano: o dos turcos-otomanos, que tomaram Constantinopla em 1453. A última grande potência muçulmana só caiu depois da 1ª Guerra Mundial. ‘Até então, toda aquela região estava de posse do Império Turco Otomano, tanto o chamado Levante (Síria, Jordânia, Líbano e Palestina), quanto a Península Arábica”, explica Andrew Traumann, doutor em História e professor da Unicuritiba.

A partilha do Oriente Médio entre França e Grã-Bretanha

A 1.ª Guerra ainda transcorria quando o chamado acordo Sykes Picot surgia de uma negociação secreta entre França e Grã-Bretanha para dividir o Oriente Médio entre essas nações. Em 1916 um emissário britânico (Mark Sykes) e um francês (François Picot) efetivaram o documento que dividiu a região entre seus respectivos países. “A indústria automobilística crescia e estudos mostravam que aquela região que até então não despertava tanta cobiça das potências poderia ser rica em petróleo”, explica Andrew Traumann.

A França ficou com a atual Síria e Líbano e a Grã-Bretanha com Jordânia, Iraque, Kuwait e Palestina. Segundo Traumann, a divisão no melhor estilo colonial não levou em consideração divisões étnico-religiosas, mas sim o trajeto a ser percorrido pelos oleodutos.

No Iraque, os britânicos estimularam a divisão entre sunitas e xiitas, privilegiando os primeiros, que são até hoje minoria no país e se omitindo em relação a marginalização dos últimos. “Quando os EUA invadiram o Iraque em 2003 e derrubaram Saddam Hussein, que era sunita, e descartam toda a infraestrutura administrativa e militar de seu governo, acabam criando um vácuo de poder”, explica Traumann.

O país entrou em Guerra Civil e as fronteiras deixaram de ser fiscalizadas com rigor permitindo a entrada de terroristas estrangeiros. Em 2010, um grupo radical sunita, se aproveitando da guerra civil na Síria, dá início a um processo expansionista para romper com o acordo Sykes Picot e reconstruir o califado medieval. É o Estado Islâmico”, resume o professor.

O surgimento de Israel

O professor Andrew Traumann explica ainda que o surgimento de Israel também está ligado ao acordo Sykes Picot. “A Grã-Bretanha adotou uma postura de apoio a ideia da criação de um lar nacional judaico na Palestina em 1917”, afirma. Na verdade, o governo britânico queria desviar o curso de imigrantes judeus perseguidos na Rússia e no leste europeu para o Oriente Médio.

O problema é que na Palestina no início do século XX, nove entre dez habitantes eram árabes. “Eles viviam ali desde a chegada do islamismo naquela região 1,4 mil anos antes. E era óbvio que estes não iriam querer abandonar seus lares para darem lugar a imigrantes judeus vindos da Europa”, ressalta Traumann. O plano de criação de Israel teve idas e vindas até 1948, quando a Assembleia Geral da ONU aprovou uma resolução que ordenava a partilha da Palestina e a criação de um país árabe e um judeu.

“É importante ressaltar que nenhum dos dois povos queria a partilha, a diferença é que o movimento sionista a aceitou como um princípio. Após o Holocausto e todas as perseguições sofridas pelos judeus, só o fato de o mundo aceitar a existência de um estado judeu já era uma vitória”, afirma.

Alguns povos e sua origem

- Os persas surgem da aglutinação entre Elamitas, Medas, Partas, partes dos Assírios, Caldeus e Lídios (estes últimos habitavam o planalto de Anatólia, atual Turquia). O Império Persa (que corresponde atualmente ao moderno Irã) foi o primeiro grande império que se tem registro.

- Os judeus surgem como um grupo religioso seguidor dos ensinamentos de Abraão, um caldeu originário da região do Shatt-el-Arab, que é o canal onde Tigre e Eufrates confluem para desaguar no Golfo Pérsico, hoje a divisa dimensional entre Irã e Iraque.

- Os curdos são um povo de raiz familiar aos persas/iranianos, que resolveram habitar e protegem os montes Zagros, dada à abundância de neve e água nesta cordilheira. Os recursos hídricos foram cobiçados pelas potências vizinhas, acabaram sendo divididos politicamente e nunca formaram seu próprio Estado.

- O surgimento dos palestinos remonta à época da dominação hebraica na região (as 12 tribos de Judá e Israel), bem como as interações com os Fenícios (hoje Líbano), Assírios (hoje Síria) e demais semitas (hoje Árabes, após o surgimento do islã). Por ser uma região considerada como uma “encruzilhada dentro de outra encruzilhada” sempre esteve em disputa, até por potências ocidentais, como o Império Romano, o Bizantino e o Britânico.

Fonte: Jorge Mortean

Alguns dos povos

Durante milênios, essa faixa de terra, situada na encruzilhada da Europa, Ásia e África foi dominada por vários reinos e impérios. Entre eles, os egípcios (a partir de 2500 a.C.), hititas (por volta de 1500 a.C.), israelitas (século 10 a.C.), assírios (século 8 a.C.), babilônios (século 7 a.C.), persas (século 6 a.C.), macedônios (século 4 a.C.), romanos (século 1), bizantinos (século 5), sassânidas e califado islâmico (século 7), seljúcidas, cruzados e muçulmanos liderados por Saladino (século 12), império mongol (século 13), império otomano (século 16) e países ocidentais no início do século 20.

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