A baixa execução orçamentária tem sido apontada como uma evidência dos problemas de gestão do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH). A dois meses do fim do ano, a pasta de Damares Alves executou somente cerca de 40% do orçamento total previsto para 2020.
Entre as críticas que têm sido feitas está o baixo uso, até o momento, do orçamento extraordinário aberto por causa da pandemia do coronavírus – por enquanto, foram empregados 22% dos R$ 211 milhões destinados. Além disso, o ministério também é criticado pela baixa execução no campo das emendas impositivas vindas do Congresso.
O MMFDH garante que, até o fim de 2020, aproximadamente 90% do orçamento terá sido executado. Luciano Bragagnolo, subsecretário de Orçamento e Administração da pasta, explicou à Gazeta do Povo os motivos da baixa execução orçamentária até o momento.
Decisões do Congresso demandaram replanejar o orçamento
Bragagnolo afirma que a proposta de 2020 para o orçamento discricionário – aquele em que os ministérios têm liberdade de decidir como vão usar os recursos para tocar suas políticas públicas – voltou do Congresso com muitas modificações, o que representou um primeiro entrave para a execução orçamentária.
“Nossa proposta para o orçamento discricionário foi com R$ 220 milhões e voltou com R$ 90 milhões do Congresso. Isso foi um grande baque para a gente. Tivemos que fazer todo um replanejamento para conseguir executar”, explica o subsecretário.
O Congresso pode aprovar ou rejeitar o orçamento discricionário e definir quanto desse orçamento será usado para emendas impositivas – aquela parte do orçamento que o Congresso direciona para estados e municípios. No caso do MMFDH, Bragagnolo avalia que houve um excesso na destinação do orçamento discricionário para as emendas impositivas.
“Eles tiraram muito da nossa despesa discricionária e jogaram para as emendas. E as emendas têm um rito próprio. Você tem um cronograma a ser seguido, que é definido pela Segov [Secretaria de Governo] da Presidência, junto com o Ministério da Economia. A grande maioria dessas emendas é executada por meio de convênios, quando você chama um parceiro subnacional, um município ou estado, e você transfere esse dinheiro. Isso requer que o parceiro mande um programa de trabalho robusto, que ele consiga demonstrar que ele tem capacidade técnica de executar aquilo. A maior parte do nosso orçamento foi para emendas”.
Aprovação de convênios das emendas impositivas é um processo demorado
Bragagnolo salienta que outro percalço está na dificuldade de aprovação dos convênios para o empenho das emendas. Boa parte da execução orçamentária depende dessa aprovação.
“Se você somar todo o nosso orçamento discricionário [de 2020], mais a emenda individual, mais emendas de bancada, mais as emendas de relatoria e de comissão, dá mais ou menos R$ 280 milhões. Desse valor, mais da metade é de emendas individuais. Isso significa que quase metade vai requerer convênios com os municípios e os estados que os parlamentares indicaram”, explica.
Segundo o subsecretário, alguns municípios e estados são poucos eficientes em cumprir as demandas do MMFDH. “Nem sempre o município ou estado tem as condições necessárias para executar a política pública que é proposta pelo MMFDH. Isso gera todo um bate e volta, um ajuste, quase uma consultoria que o ministério tem que prestar a esses entes para que esse processo finalmente fique redondo e a gente possa chegar à celebração do convênio e ao empenho, que é o que dá esses indicadores de execução.”
Pandemia também freou execução orçamentária
Um terceiro motivo para a baixa execução orçamentária até o momento, segundo Bragagnolo, é a pandemia da Covid-19. No início da pandemia, o MMFDH recebeu R$ 45 milhões extras em seu orçamento, utilizados para campanhas de prevenção à violência doméstica e para a distribuição das cestas básicas a populações que ficaram mais vulneráveis pela pandemia. Esse dinheiro já foi usado.
“A gente teve que tirar boa parte do nosso foco nessa execução atual, fora tudo o que vem do passado, que a gente está resolvendo, para conseguir executar esse orçamento que veio lá no início da pandemia, de R$ 45 milhões, que a gente conseguiu dar conta muito rápido, por meio de parcerias com a Conab, com a Funai e com o Ministério da Cidadania. Fizemos uma excelente campanha de prevenção à violência doméstica e distribuímos as cestas básicas para os públicos mais vulneráveis nas comunidades tradicionais, aqueles que o governo está chamando de ‘invisibilizados’”, explica o subsecretário.
Além dos R$ 45 milhões, um novo valor de R$ 166 milhões foi destinado em junho ao ministério de Damares para aplicação em políticas públicas. Bragagnolo afirma que o MMFDH quer ser criterioso no uso desse valor, para evitar escândalos de corrupção. “Veio bem depois e não foi muito articulado com a gente. Quando veio esse projeto de lei, a gente teve que pensar, aqui, em formas rápidas de dar vazão a isso, mas com a responsabilidade que o uso desse recurso requer. Veja a quantidade de escândalos que está havendo aí, com o ‘Covidão’ e uma série de desvios. Isso é tudo o que a ministra não quer que ocorra aqui no ministério. Vamos usar o recurso? Vamos, mas com responsabilidade.”
A maior parte desse aditivo que o MMFDH recebeu em junho será aplicada em instituições de longa permanência para idosos, mas os recursos ainda não chegaram a essas entidades. A secretaria Nacional dos Idosos concluirá até o fim do mês de outubro o processo de habilitação das instituições beneficiadas, que estão enviando documentos. A secretaria vai analisar a documentação e homologar as entidades que estiverem aptas a receber os recursos. “A gente espera que em novembro e dezembro todas as instituições homologadas já estejam de posse dos recursos”, diz Bragagnolo.
Outra dificuldade com a pandemia para o MMFDH, que também afetou o governo como um todo, foi a adequação ao novo regime de home office.
Busca por otimizar e enxugar gastos também desacelera execução do orçamento
O subsecretário aponta ainda que a busca por sanar a ineficiência que havia em certas políticas públicas fez com que os gastos diminuíssem, o que ajudou a desacelerar a execução orçamentária. O MMFDH, segundo ele, tem tomado medidas para modernizar essas políticas e ganhar em eficiência.
Como exemplo, ele cita as centrais de denúncia do Ministério – o Ligue 180 e o Disque 100. “A gente herdou essa política pública sendo executada por meio de dois contratos segregados. Você tinha duas centrais, dois grupos: um ficava no Distrito Federal e outro na Bahia. O custo era de mais ou menos R$ 50 milhões por ano”, conta. “Fizemos um replanejamento desses contratos e uma nova licitação. Essas centrais foram unificadas. Os R$ 50 milhões passaram a ser R$ 25 milhões, a metade do custo anterior. O tempo de espera em fila diminuiu. Está mais rápido, mais barato e estamos ofertando mais serviços”, destaca.
Outro caso de otimização, de acordo com Bragagnolo, ocorreu com as Casas da Mulher Brasileira. Governos anteriores ofertavam somente uma tipologia de Casa da Mulher Brasileira, ao custo de R$ 10 milhões, e só implantavam esse programa nas capitais.
“Eram caras e muito centralizadas. Não atingiam grande parte do público-alvo, dessas mulheres em estado de violência. A gente sabe que o Brasil é muito maior que suas capitais”, observa. “A gente reformulou todo esse programa. Agora, nós temos quatro tipologias de casa. Vai de R$ 823 mil até aqueles R$ 10 milhões. Isso possibilitou que os municípios pequenos e médios ingressassem no programa. Conseguimos interiorizar essa política pública, descentralizar, e assim atender muito melhor às mulheres em estado de violência. A gente está conseguindo fazer mais e melhor com o mesmo valor.”
O ministério recebeu recentemente críticas de algumas defensoras dos direitos das mulheres que fazem oposição ao governo Bolsonaro. Em 25 de setembro, em um evento da secretaria da Mulher da Câmara sobre o impacto econômico da pandemia entre as mulheres promovido pela deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), a baixa execução orçamentária para alguns programas em favor das mulheres foi um ponto abordado.
Mas os problemas de execução nessa área não se devem, segundo Bragagnolo, a uma opção ideológica do governo. Ele afirma que, até agora, dos R$ 121 milhões previstos para aplicação em políticas públicas para mulheres, foram empenhados R$ 57,8 milhões. A intenção é de que cerca de 90% do valor seja aplicado até o fim do ano. A demora para chegar a esse patamar, segundo ele, deve-se ao fato de que o MMFDH quer atuar com responsabilidade.
“Se a gente fosse usar os recursos de maneira irresponsável, com certeza seria rápido. Mas essa não é a ordem da ministra. A gente quer usar todo o orçamento? Com certeza. Mas de forma responsável, para que as entregas realmente cheguem a quem mais precisa. Se for para firmar convênio para simplesmente empenhar e isso não virar nada lá na frente, não é nosso desejo. A gente vai obter número, mas o Brasil precisa de execução por execução, ou de políticas públicas bem executadas lá onde a vida acontece?”, argumenta.
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