A Câmara aprovou com modificações, nesta quinta-feira (9), o projeto de lei 1.444/20, que continha trechos dúbios que poderiam facilitar a prática do aborto no Brasil. O trecho mais polêmico, que falava em “saúde sexual e reprodutiva” – expressão frequentemente usada em documentos oficiais por partidários da legalização do aborto para abordar o tema de forma velada –, foi removido do texto.
O objetivo declarado do projeto é estabelecer “medidas emergenciais de proteção à mulher vítima de violência doméstica durante a emergência de saúde pública decorrente da pandemia do coronavírus”.
Foi retirado do documento um trecho que falava na criação do “Programa de Aluguel Social Emergencial”, considerado como uma espécie de “bolsa aborto” por ativistas da defesa da vida, e que previa uma “rede de proteção” para as vítimas de violência. Parlamentares pró-vida consideravam que esse trecho contido no texto anterior do projeto facilitava a utilização de recursos para a prática do aborto.
Outro trecho removido falava em um “canal exclusivo para atendimento psicológico das mulheres em situação de violência doméstica e familiar”, chamada de “disque aborto” pelos deputados pró-vida. O governo federal já tem um serviço do tipo, gerido pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, e os parlamentares consideraram desnecessária a criação de um novo canal.
O projeto, que teve relatoria de deputada federal Natália Bonavides (PT-RN), segue agora para apreciação do Senado.
Modificações no texto
Alguns deputados da Frente Parlamentar em Defesa da Vida da Câmara consideraram as modificações suficientes, enquanto outros manifestaram sua insatisfação com a rejeição de uma emenda proposta pela deputada Chris Tonietto (PSL-RJ), que visava deixar explícito que o aborto provocado não poderia ser praticado com base nesse projeto.
Para o deputado Francisco Jr. (PSD-GO), o projeto tal como foi aprovado protege tanto a mulher como as crianças em gestação. “O esforço que nós fizemos foi para afastar qualquer tipo de interpretação que possa colocar em risco qualquer uma dessas vidas”, disse.
Já o deputado Filipe Barros (PSL-PR), um dos principais opositores do PL 1.444 dentro da Câmara, considerou que a vitória não foi completa. “Reconhecemos o avanço que foi feito, mas nós nos sentiríamos muito mais confortáveis se tivéssemos incluído no texto a cláusula que veda a utilização dos recursos para qualquer tipo de aborto provocado”, afirmou.
Estratégia de grupos favoráveis ao aborto é camuflar linguagem, diz Filipe Barros
Em entrevista à Gazeta do Povo, o deputado Filipe Barros afirmou que a tática de parlamentares pró-aborto no Congresso tem sido a de usar recursos de linguagem para fazer a pauta abortista avançar paulatinamente no parlamento. “A estratégia é ir tentando, aos poucos, legalizar o aborto, claro que sempre camuflando a linguagem para não parecer que estão falando de aborto”, diz.
Para ele, “os defensores da legalização do aborto já perceberam que, no Brasil, não vão conseguir aprovar” projetos de lei expressamente favoráveis ao aborto. “Isso não vai acontecer porque o Congresso, com todos os defeitos que tem, tem maioria conservadora, contra o aborto, o que reflete, inclusive, o anseio da população brasileira”, afirma.
Segundo Barros, há duas frentes de lobby pró-aborto em paralelo no governo: uma delas no Poder Legislativo, e outro na Judiciário. “Em especial o Supremo Tribunal Federal tem tido decisões desfavoráveis ao movimento pró-vida”, diz.
Projeto aprovado em conjunto com o PL 1.444 também tem pontos controversos
Durante a sessão da quinta-feira, logo depois da aprovação do PL 1.444, outro projeto que abordava a violência contra mulheres durante a Covid-19 foi votado na Câmara, o PL 1.552/20, de autoria da deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP).
Esse projeto também foi alvo de controvérsia, por conta de trechos que falam sobre assegurar a mulheres vítimas de violência “o acolhimento em abrigo sigiloso provisório”, e sobre a possibilidade de inclusão dessas mulheres “em cadastro para benefícios e programas de renda, aluguel social ou no cadastro para a renda básica emergencial”.
Alguns deputados consideraram que o PL 1.552 poderia encurtar o caminho para a realização de abortos ao facilitar o atendimento de mulheres para esse fim sem a comprovação, por boletim de ocorrência, de que a mulher sofreu estupro.
No Brasil, o aborto é crime. Não existe o chamado “aborto legal” na legislação brasileira. Mas estão previstas no Código Penal três escusas absolutórias. Ou seja, três situações nas quais quem praticar o aborto não será punido. São elas: estupro, diagnóstico de anencefalia do bebê e quando existe risco de morte para a mãe.
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