Homem com ansiedade generalizada já realiza tratamento médico com cannabis, mas alegou que os medicamentos possuem um alto custo| Foto: Bigstock
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O ministro Rogério Schietti, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), autorizou um paciente a plantar maconha para transportar e extrair artesanalmente o óleo da Cannabis, com o fim de tratar ansiedade generalizada. Na decisão, o magistrado determinou que o homem poderá plantar até 354 plantas de maconha por ano para uso "terapêutico", sendo impedida qualquer repressão criminal e vedada a comercialização dos derivados da erva.

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Com a decisão, o tribunal despreza os argumentos em discussão no Congresso sobre os riscos para a saúde e de segurança pública em permitir a plantação da Cannabis no Brasil. Entre eles estão a falta de evidências científicas sobre os benefícios medicinais de produtos com elementos da maconha (com exceção de alguns indícios para certas enfermidades), a dificuldade de fiscalização por parte do poder público de plantios clandestinos, entre outros.

O paciente alegou que sofre de ansiedade desde a infância e que passou a apresentar sintomas mais graves, como fortes dores de estômago e distúrbios de sono. Em 2020, o homem começou um tratamento terapêutico com Cannabis, com prescrição e acompanhamento médico. Com o alto custo dos medicamentos internacionais e nacionais, o paciente decidiu recorrer a Justiça para garantir uma produção própria.

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De acordo com o ministro, "é cabível ou não a concessão de salvo-conduto pelo Poder Judiciário, em habeas corpus preventivo, para obstar a repressão criminal contra o cultivo doméstico de Cannabis sativa com propósitos unicamente medicinais". Não é o que está previsto na Lei 11.343/2006, a Lei de Drogas, que em seu artigo 2º proíbe "a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas".

Para reforçar a decisão, o ministro ainda mencionou um julgamento da Corte realizado, em junho do ano passado, em que foi referendado o direito de cultivar maconha para fins medicinais a três pacientes, sem considerar os riscos de intoxicação e dependência.

A justificativa dos magistrados para liberar a produção artesanal do óleo de canabidiol com fins terapêuticos foi a de que, para eles, não representaria "risco de lesão à saúde pública ou a qualquer outro bem jurídico protegido pela legislação antidrogas". O entendimento é que se houver receituário e laudo assinado por médico e chancelado pela Anvisa não há dúvidas de que se deve afastar a repressão criminal nesses casos.

A produção artesanal de óleo a partir da maconha, em níveis seguros para a saúde, exige uma série de equipamentos específicos para extrair o canabidiol ou o THC - duas das mais de 1.700 substâncias químicas da cannabis. Pela dificuldade de fiscalização, existe o medo de que acórdãos similares possam facilitar a plantação doméstica de maconha que acabe sendo desvirtuada de seu objetivo original, sendo utilizada para uso recreativo, consequentemente ocasionando dependência química.

Em dezembro de 2019, quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou a importação dos extratos de canabidiol e THC para a fabricação de produtos, definiu que esses compostos seriam marcados com “tarja preta”, pelo risco de dependência, aumento de tolerância (a necessidade de ingerir quantidades cada vez maiores para ter o mínimo efeito desejado) e intoxicação. Os produtos a base de maconha aprovados pela agência (não são considerados medicamentos por falta de evidência científicas consolidadas de eficácia) precisam ser prescritos com receita amarela (índice de THC menor de 0,2%) ou azul (índice de THC maior de 0,2%, maior risco).

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Em março deste ano, o STJ assumiu o poder de decidir sobre a liberação da plantação de maconha no país, em uma ação ajuizada pela empresa DNA Soluções em Biotecnologia, interessada no uso comercial da planta. Ao analisar a decisão do STF, advogados e cientistas políticos temem a interferência do Poder Judiciário em questões que deveriam ser definidas e discutidas pelo Congresso Nacional. Ao invés de respeitar o andamento do Legislativo, que pode manter a proibição do plantio de Cannabis a partir de argumentos de razoabilidade e de segurança pública, o Judiciário força o Legislativo a decidir ou ele mesmo tenta mudar a lei durante os julgamentos, sem competência para isso.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]