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Arrependimento

Transição de gênero não traz os benefícios prometidos para a saúde mental, diz pesquisa

Imagem ilustrativa. (Foto: Pixabay)

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Embora não deva ser movida por dogmas, a comunidade científica volta e meia cede à pressão de militantes ideológicos e parece adotar premissas inquestionáveis. Um exemplo: no caso das pessoas que acreditam ser transgênero, a doutrina em vigor estabelece que os profissionais de saúde devem fazer de tudo para apressar a “transição” dessa pessoa para o sexo oposto, de forma a preservar a saúde mental do paciente e, assim, reduzir as chances de suicídio. Este é o principal argumento em favor da cirurgia (em muitos casos, precoce) de mudança de sexo. Mas a afirmação é, no mínimo, contestável. E um novo episódio expõe essa fragilidade.

No ano passado, a maior pesquisa já feita sobre o tema pareceu ter confirmado, pelo menos em parte, a posição pró-ideologia de gênero: em um estudo publicado no American Journal of Pshychiatry, a principal publicação científica na área da psiquiatria nos Estados Unidos, os pesquisadores Richard Bränström e John E. Pachankis concluíram que a realização de cirurgias de mudança de sexo havia trazido melhoras substanciais na saúde mental dos participantes. O estudo era importante porque foi o primeiro a levar em conta a população inteira de um país: a pesquisa analisou todos os pacientes que receberam o diagnóstico de transexualismo ou incongruência de gênero entre 2005 e 2015 na Suécia. A amostra foi de 2.679 pessoas.

Agora, entretanto, a situação se reverteu: questionados por alguns colegas, os cientistas tiveram de refazer as contas e, em uma retratação publicada neste mês, afirmaram que “os resultados demonstraram não haver vantagem na realização da cirurgia no que diz respeito a visitas ao médico ou prescrição de medicamento devido a desordens de humor ou ansiedade, ou à hospitalização após tentativa de suicídio”. A mesma pesquisa, ainda em sua primeira versão, não havia detectado que o tratamento hormonal (homens que se declaram transexuais com frequência passam a ingerir hormônios femininos, e vice-versa) traz benefícios sobre a saúde mental dos pacientes. Com isso, um dos pilares das terapias radicais de mudança de sexo fica seriamente abalado.

O episódio, somado a estudos anteriores que chegaram a conclusões similares, reforça a posição de profissionais de saúde críticos à ideologia de gênero. Para eles, é injustificável que, sem consenso científico, soluções irreversíveis (como a terapia hormonal, os bloqueadores de puberdade e a cirurgia de mudança de sexo) estejam sendo vendidas como o único caminho possível para evitar um eventual suicídio – inclusive para pessoas no início da adolescência.

A psiquiatra Akemi Shiba, especializada no assunto, também critica a tese de que a única saída para alguém que se identifica com o sexo oposto é transformá-la em uma pessoa do sexo oposto: “Isso não é algo consagrado na literatura. E, na infância a na adolescência em especial, é possível fazer psicoterapia em vez de intervenções irreversíveis”, ela afirma.

Arrependimento pós-cirurgia

Eugenia Rodrigues, porta-voz da campanha “No Corpo Certo” – criada para alertar sobre os riscos da chamada transição de gênero –, coleciona relatos preocupantes de pais de jovens transgênero e de pessoas que se arrependeram de fazer a transição. Para ela, a forma como o assunto tem sido tratado é irresponsável. “O modelo atual, denominado genericamente de ‘afirmação de gênero’, gerará muito mais arrependimento. As mudanças corporais, inclusive no Brasil, estão acontecendo muito cedo, ainda na infância e na adolescência, quando somos imaturos para compreender o impacto a longo prazo dessa decisão no corpo e na vida”, ela diz.

No Brasil, apesar da falta de consenso científico, algumas entidades na área da saúde parecem ter adotado a posição radical de que, se uma pessoa acredita ser transgênero, ela já o é – e que negar isso é colocar em risco a vida dela. A Resolução 1º/2018 do Conselho Federal de Psicologia, por exemplo, estabelece que “as psicólogas e os psicólogos, na sua prática profissional, reconhecerão e legitimarão a autodeterminação das pessoas transexuais e travestis em relação às suas identidades de gênero.” O texto também veda que os psicólogos ofereçam quaisquer serviços que “que visem a terapias de conversão, reversão, readequação ou reorientação de identidade de gênero das pessoas transexuais e travestis.” Na prática, isso limita a atuação dos profissionais, que se sentem receosos de até mesmo investigar a hipótese de que algum paciente que acredite ser transgênero na verdade tenha uma desordem de outra natureza.

Esta é a situação de uma psicóloga carioca e que prefere não ter o nome divulgado por medo de punição do Conselho Federal de Psicologia. Ela diz não ter encontrado nem sequer um caso de paciente que de fato tenha “nascido no corpo errado”.  A profissional também indaga os motivos pelos quais, nos casos diagnosticados como disforia de gênero, se modifica o corpo da pessoa em vez da mente.

“O problema não está no corpo, está no papel social. E ela pode lidar com isso tratando a mente.  Não se muda o corpo da pessoa”, diz ela.

A psicóloga também se queixa da abordagem do CFP, que exige a “legitimação” da “identidade de gênero” dos pacientes. “Eu não estou lá para afirmar ou negar a identidade de ninguém. Estou lá para fazer perguntas e fazer a pessoa se enxergar e perceber os conflitos que ela vive. Terapia não é agradável, e nem é para validar ninguém”, ela afirma.

Para Eugenia Rodrigues, a pressão pela “mudança de sexo” como única solução atende a diversos interesses simultaneamente: as alas mais radicais do movimento transgênero veem sua utopia se materializar, ao passo que alguns médicos lucram com os (caros) procedimentos cirúrgicos. Além disso, lembra Akemi Shiba, a tese de que a cirurgia é o único caminho para evitar o suicídio tem efeitos significativos sobre o sistema de saúde. “Tem uma pressão grande para que os planos de saúde assumam os custos dessas cirurgias. Hoje, vários planos dizem que a cobertura não se aplica porque não se trata de um problema anatômico nem fisiológico”, ela diz. Se a academia aceitar que a cirurgia é a única solução para evitar o suicídio dessas pessoas, a intervenção passará a ser vista como um item essencial e, que, portanto, deve ser coberto pelos planos de saúde.

Diante da cacofonia na comunidade científica, as famílias são a barreira mais importante contra ideias que podem levar a mudanças radicais e irreversíveis. “Os pais devem ficar atentos a profissionais que os pressionam a autorizar intervenções precoces nos filhos, como mudança de nome e hormônios artificiais, alegando ‘risco de suicídio’ caso não o façam”, conclui Eugenia Rodrigues.

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