Um mordomo sem culpas

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Ele queria ser engenheiro. Mas isso foi antes de começar a trabalhar – e com apenas 12 anos o paulista de Santo André Edson Viana, hoje com 45, já pegava no batente. Desde então, permanece nos bastidores de um mundo de glamour, po­­der e sofisticação.

"Vi­­­­­­rei engenheiro, sim. Mas da cozinha", ri. E que engenheiro: há quase uma década comanda o Buffet Elegance, que serve os três restaurantes e as festas do tradicional Graciosa Country Club, e acaba de adquirir seu próprio restaurante.

Já se vão 32 anos de labuta em diversas funções, incluindo períodos como mordomo em casas de famílias multimilionárias de São Paulo. Os sobrenomes dizem tudo: ele trabalhou para as famílias Safra e Scarpa. Conheceu a intimidade dos muito ricos sem jamais ultrapassar a linha que separa o empregado do patrão.

"É outro mundo. É o mundo deles. A gente fica invisível, serve e não se manifesta", salienta. Mordomo deve ser assim o tempo todo, explica Viana. "Puxar conversa, nunca! Você só responde o que te perguntam, só aparece quando é chamado. Afinal, o que eu ia falar com o doutor Joseph Safra? Que assunto você tem com um bilionário? Vai contar que acordou às cinco e pegou três ônibus?", dispara, às gargalhadas.

Edson Viana é um homem feliz. Casado, com dois filhos, se diz realizado e afirma que nunca teve inveja dos milionários que frequentavam os salões onde serviu: mansões, hotéis estrelados e buffets de primeira linha. "Ser muito rico dá muita preocupação. Imagina tua filha indo pro colégio todo dia com dois carros de seguranças acompanhando."

Ele diz que não é rico, mas assegura que vive muito bem. "Nenhum milionário tem o paraíso que eu tenho."  Está falando do "cantinho" na Serra da Graciosa. A chácara tem rios de água cristalina, pomar e muito sossego.

Da longa jornada no lado invisível dos salões dos poderosos, Viana guardou as (muitas) histórias na cabeça. A vida lhe ensinou a ser discreto e assim conquistou a confiança dos empregadores. Questionado sobre episódios bizarros ou surpreendentes que testemunhou, conta passagens engraçadas, mas nada comprometedoras. Só se permitiu revelar que um ex-patrão gostava demais do jogo e da bebida. "Quase duas garrafas de vodca por dia e cassino toda noite", sussurra.

Não só a discrição o levou a crescer na carreira. Edson Viana é naturalmente gentil. Lapidou-se diplomático, pois aprendeu a conviver com fortunas que, invariavelmente, estavam na conta bancária dos outros. Fez o que pessoas inteligentes fazem: aprendeu. "Essa vida me ensinou a ter disciplina", ressalta. E a valorizar o que conseguiu, emenda o empreendedor nato. "Tudo que conquistei é fruto do meu trabalho", destaca.

Seja como auxiliar de cozinha, garçom, maître, mordomo, dono de buffet, banqueteiro ou proprietário de restaurante, Edson Viana soube usar a invisibilidade para conhecer os hábitos dos ricos e tolerar suas manias. É, acima de tudo, um observador – e não guarda mágoas. Apenas um desapontamento surge: nunca ter entrado na sala de prataria da mansão dos Safra. "Nas festas, dona Vik escolhia pessoalmente as peças que seriam usadas. Eu ficava na porta, ela me passava as pratas", relembra. Nada que tempo e trabalho não resolvam: o Buffet Elegance tem um acervo incrível. "Hoje eu tenho meu próprio salão de pratarias", conta, de novo gargalhando.

Viana se despede em frente ao restaurante Alberto Massuda, do qual é proprietário há oito meses. Toda noite ele estende um tapete vermelho na calçada da Trajano Reis. "É para os clientes, do estacionamento à porta", explica. Edson Viana sempre quer o melhor para eles.

Texto: Bia Moraes

Especial/perfil: Este perfil faz parte de uma série que retrata, periodicamente, figuras da sociedade de Curitiba e do Paraná.