
A tragédia provocada pelas chuvas em Santa Catarina despertou perplexidade em todos os cantos do país. Até agora, 120 pessoas já morreram e mais de 32 mil continuam desabrigadas ou desalojadas. Diante desse cenário devastador, a reportagem da Gazeta do Povo conversou com especialistas para tentar responder à seguinte pergunta: o que poderia acontecer se a mesma quantidade de chuva tivesse caído sobre o Paraná? Segundo eles, é impossível projetar as conseqüências de um evento tão raro como esse. O que se pode afirmar, no entanto, é que nenhuma cidade do país, e talvez do mundo, está preparada para receber em apenas cinco dias a chuva esperada para um período de quatro meses.
A chuva que arrasou a região do Vale do Itajaí superou todas as medições já feitas pelo Centro de Informações de Recursos Ambientais e de Hidrometeorologia de Santa Catarina (Epagri/Ciram). Na cidade de Blumenau, por exemplo, choveu o equivalente a 1.002 milímetros em novembro, quando a média dificilmente ultrapassa 150 milímetros. Em Curitiba, a média para essa época do ano fica em torno de 112 milímetros. Portanto, se a chuva catarinense tivesse atingido a capital do Paraná, o nível de precipitação registrado aqui estaria quase 90% acima do normal. "Condições para isso é claro que existem. Não se pode dizer que não aconteceria, mas é um fenômeno muito raro", afirma a meteorologista Ana Beatriz Porto, do Instituto de Tecnologia e Informações Ambientais do Paraná (Simepar).
A última grande enchente registrada em Curitiba e na região metropolitana aconteceu em janeiro de 1995, quando choveu 400 milímetros em um período de dez dias. Uma chuva de 144 milímetros, no dia 21 de fevereiro de 1999, também causou pontos de alagamento na capital, sobretudo na Rua XV de Novembro, no Centro. Conforme explica o professor Irani dos Santos, do departamento de Geografia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), esse é o cenário que voltaria a ocorrer em Curitiba no caso de uma precipitação mais intensa. "A Zona Norte seria a área mais atingida, principalmente devido à grande população que vive nas proximidades dos vales dos rios", aponta.
De acordo com o professor, o solo mais resistente e o terreno plano da região não são propícios à ocorrência de deslizamentos de terra, como se viu em Santa Catarina. No território paranaense, a região da Serra do Mar é um local com maior tendência a sofrer desmoronamentos semelhantes. "A diferença é que aqui teríamos um fenômeno e não um desastre natural, já que a área é praticamente desabitada", diz. Além disso, quedas de morros e encostas no Paraná acontecem, geralmente, quando a declividade do terreno é maior que 40%. Já em Santa Catarina, "esse valor é muito mais baixo, favorecendo o risco de deslizamentos", explica Santos.
O mesmo poderia ocorrer no Vale do Ribeira próximo à região metropolitana de Curitiba , segundo o geólogo Renato Lima, do Centro de Apoio Científico em Desastres (Cenacid) da UFPR. Ele afirma que a geologia do local é semelhante à do Vale do Itajaí: terreno montanhoso e de relevo jovem, ainda em desenvolvimento. "São fatores como esses, aliados à ação do homem, que criam uma situação favorável para enchentes e deslizamentos".



