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Coordenador da Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol mostra seu diagrama da “propinocracia” | Hugo Harada/Gazeta do Povo
Coordenador da Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol mostra seu diagrama da “propinocracia”| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

A acusação da força-tarefa da Operação Lava Jato no Paraná de que o ex-presidente Lula é o chefe do esquema de corrupção na Petrobras coloca pressão sobre a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o Supremo Tribunal Federal (STF). Embora tenha atribuído a Lula o comando do petrolão, o Ministério Público Federal (MPF) em Curitiba não vai denunciá-lo à Justiça por formação de quadrilha, pois há um inquérito conduzido pelo STF justamente para investigar esse assunto. Do ponto de vista legal, caberá à PGR e ao Supremo referendar ou rechaçar o entendimento da força-tarefa – no caso da segunda hipótese, com provável desgaste perante a opinião pública.

O cientista político Carlos Melo, do Insper, diz que a acusação da força-tarefa da Lava Jato tem “evidentes elementos políticos” que eventualmente podem influenciar decisões de instâncias superiores. Para ele, isso não deveria ocorrer e os julgamentos teriam de ser meramente técnicos. Mas, Melo destaca que o país passa por um momento de “muita paixão” na política e que o debate da pressão externa sobre o Judiciário está colocado.

Força-tarefa da Lava Jato aponta chefe do esquema, mas está longe de terminar

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Ele lembra que, em 2013, no julgamento de recursos de réus mensalão, os ministros do STF Marco Aurélio Mello e Luís Roberto Barroso divergiram publicamente sobre o papel da opinião pública naquele caso. Marco Aurélio não queria acatar os recursos e argumentou que a sociedade pedia o fim do julgamento. Barroso rebateu dizendo não se pautar pela voz das ruas.

Paradoxo

O jurista e professor Luiz Flavio Gomes, especializado em Direito Penal, concorda que a acusação da força-tarefa tem um peso “institucionalmente político, mas não necessariamente partidarizado”. “O tempo todo a denúncia [do MPF do Paraná] faz referência ao comando da corrupção. É um paradoxo [a força-tarefa] não denunciar o Lula por isso”, diz o jurista.

Essa situação, segundo Gomes, cria uma saia-justa para o Supremo, a PGR e a Polícia Federal de Brasília, instâncias responsáveis pela investigação de formação de quadrilha por envolver políticos com foro privilegiado. “Há uma pressão para acelerar a investigação por lá”, diz. Ele afirma que hoje existe um clamor popular para punir políticos corruptos. Mas o Supremo costuma ser lento em seus julgamentos. “Pode ficar a impressão de que só o [Sergio] Moro julga rápido. Isso é ruim para o Judiciário.”

A morosidade de Brasília em comparação com Curitiba, aliás, foi alvo de recente troca de farpas entre a PGR e o próprio Supremo. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em entrevista sobre a Lava Jato disse que o STF tinha um “ritmo mais lento”. O ministro do Supremo Gilmar Mendes retrucou: “Eu acho que há morosidade nas investigações na Procuradoria-Geral da República. Curitiba é muito mais célere que a Procuradoria-Geral da República. Isso é evidente”.

Visão diferente

Professor de Direito Constitucional na FGV do Rio de Janeiro, Ivar Hartmann entende que a acusação da força-tarefa da Lava Jato de que Lula comandou o petrolão não vai impor uma “saia-justa” para o STF e a PGR na condução da investigação de Brasília. Segundo ele, nos processos judiciais é corriqueiro que haja discordâncias entre instâncias diferentes de julgamento. E as conclusões de Curitiba podem ser juntadas e complementadas por Brasília. “Os procuradores fizeram algo saudável: explicar para a sociedade o contexto que eles entendem que embasa a denúncia contra um ex-presidente.” Formalmente, Lula só foi denunciado à Justiça por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP) e da armazenagem de seus bens.

Domínio do fato

Doutor em ciência política pela Universidade de Brasília (UnB), Leonardo Barreto entende que a forma como a força-tarefa apresentou a acusação contra Lula sugere que o MPF pretende “pressionar ou sensibilizar” o Supremo a adotar a teoria do domínio do fato no caso envolvendo o ex-presidente. Durante a entrevista em que acusou Lula, o procurador da força-tarefa Deltan Dallagnol afirmou que, após o caso do mensalão, o ex-presidente não pode mais dizer que nada sabia sobre a corrupção na Petrobras.

A teoria do domínio do fato afirma que a pessoa que decidiu ou ordenou outros a cometerem um delito também é autor do crime mesmo não tendo praticado diretamente a infração penal. Foi usada como argumento para condenar o ex-ministro José Dirceu no processo do mensalão. Apesar disso, segundo Barreto, haveria uma tendência de os ministros do STF não recorrerem novamente a ela em outros casos – como os da Lava Jato.

Barreto levanta ainda outras duas hipóteses para o MPF do Paraná acusar Lula de ser o chefe da corrupção mesmo sem denunciá-lo formalmente por esse crime. “A desconstrução do ‘mito Lula’ pode ser uma estratégia da acusação para facilitar sua condenação”, diz o cientista político. Outra possibilidade é de que a força-tarefa tenha procurado estimular Lula a se pronunciar sobre o assunto para que ele revelasse algum elemento que falta à investigação. O ex-presidente falou no dia seguinte à acusação da Lava Jato.

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