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Mesmo que você não dê a mínima para gente esquiando na neve ou patinando no gelo, há um bom motivo para ficar de olho na Olimpíada de Inverno no mês que vem. É que além das disputas entre atletas, há algo mais acontecendo. Os jogos serão em Sochi, na Rússia, e estará em teste a capacidade do mundo de reagir à intolerância do governo de Vladimir Putin. O kaiser vem aprovando lei após lei com um intento claro: tirar direitos dos homossexuais.

A legislação mais famosa é a que bane qualquer ato que possa ser considerado como "propaganda de relações não tradicionais". Antes mesmo de os jogos começarem, a polêmica rendeu. A multicampeã Elena Isinbayeva, do salto com vara, deu entrevistas defendendo a lei e afirmando que na Rússia as pessoas são "normais". Depois se retratou. Barack Obama decidiu indicar Billie Jean King, uma atleta gay, para representar o país nos jogos – normalmente o próprio presidente compareceria.

Putin declarou recentemente que vê a Rússia como defensora de valores conservadores contra uma "tolerância estéril" que "faz equivaler o bem e o mal". As palavras não são casuais. Deliberadamente o homossexualismo é chamado de "mal". Como todo candidato a ditador, Putin precisa de um inimigo a ser combatido. É assim que funciona: quem quer muito poder precisa criar o clima de uma ameaça para dizer que está salvando o povo dela. Às vezes, o culpado é o judeu, às vezes o negro.

Putin já usou o artifício outras vezes. E não está sozinho. O mundo está cheio de novas leis punindo a sexualidade alheia. Ontem mesmo a Nigéria colocava na cadeia dezenas de pessoas por serem gays ou por participarem de associações ou grupos que defendem homossexuais. A lei chamada informalmente de "Encarcerem os gays" acaba de ser aprovada no país. John Kerry, secretário de Estado norte-americano, reagiu dizendo que não se trata apenas de uma ofensa aos direitos de uma minoria – o próprio direito de livre associação fica ameaçado.

No fim do ano, o Parlamento de Uganda foi mais longe e aprovou uma lei que prevê prisão perpétua para os gays. Tratou-se de um abrandamento. Na versão original, antes da pressão internacional, a proposta era de pena de morte. Novamente, a defesa do projeto passa pela ameaça que os gays representariam para a cultura do país.

No caso da Rússia, cogitou-se um boicote aos jogos de Sochi, como ocorreu nos anos 80 em função da Guerra Fria. Aparentemente, não prosperou. O protesto até agora se resumiu a um selinho dado por atletas que participaram do campeonato mundial de atletismo em Moscou. Certamente não ficará nisso. Defensores dos direitos gays dizem torcer para que surja neste inverno um novo Jesse Owens – o negro que obrigou Hitler a assistir à sua vitória na Olimpíada de 1936, em Munique, com quatro medalhas de ouro.

Independente do resultado nas provas, será importante ver a reação da imprensa e das autoridades. É preciso mostrar que a tolerância com os direitos alheios não é estéril e que o governo de Putin – ou qualquer outro – não tem o direito de tirar direitos de pessoas alegando que isso é necessário para evitar que o "mal" prevaleça. Encarar cidadãos como representantes do mal é o princípio do caos. Foi o que nos levou às maiores barbáries do século 20. Ontem foram os judeus. Hoje são os gays. Quem será a vítima amanhã?

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