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Opinião

Hélio Augusto Camargo de Abreu é especialista em Direito Digital.

Regras para rádio e tevê valem para a web?

O Seminário Internacional de Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias, encerrado nesta quarta-feira em Brasília, explorou os desafios que as nações enfrentam para regulamentar as comunicações no mundo.

A Unesco apresentou seus indicadores de desenvolvimento da mídia e regulações para a radio fusão, defendendo o livre fluxo de idéias por meios verbais e visuais. Outros indicadores foram discutidos com base nas atividades de diversos países, por meio de exposição de estudos e experiências.

No Brasil, a Anatel é vinculada, porém não subordinada, ao Ministério das Comunicações. Seus dirigentes são indicados pelo Presidente da República, sabatinados e então aprovados pelo Senado Federal. Os artigos 220 a 224, do capítulo V da Constituição Federal, tratam da Comunicação Social. Em 2006, o Conselho Intergovernamental do Programa Internacional para o Desenvolvimento da Comunicação (IPDC), definiu um marco para a avaliação do desenvolvimento da mídia no país.

Fato, a democracia existe apenas quando há um ambiente livre e independente para a mídia, a fim de levar todo o tipo de informações aos cidadãos, auxiliando na tomada de decisões e aprimoramento das condições de vida. Apesar do artigo 220, da Constituição Federal, principiar a regulação das comunicações, a internet não pode ser equiparada aos demais tipos de mídia. A web independe de concessão estatal para existir, consumando-se sem a interferência do Poder Público – daí não poder ser submetida às regras definidas para a radiodifusão.

Deve-se ter cautela ao falar de normatização da internet, por conta da especificidade do meio. As leis devem existir, porém adaptadas à web ou o desenvolvimento da tecnologia, cada vez mais essencial à população, será cerceado. Logo, é razoável avaliar a elaboração de diretrizes para complementar o previsto no Código de Defesa do Consumidor, garantindo a continuidade das atividades online.

Dependemos da web para trabalho e relacionamento. Um jovem da geração Z, nascido a partir de 1984, tem vários amigos digitais. Se houver um apagão da web ele perde toda sua rede de contatos. O mesmo é aplicado ao meio corporativo. Assim, é imperativo pensar em garantias de Privacidade e Segurança da Informação e discutir a classificação etária de conteúdos, já que na Internet não há restrição de horários como em outros meios.

Um dia depois de o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, declarar que a regulamentação sobre a mídia será feita mesmo que num clima de enfrentamento, as entidades do setor deixaram claro que o tema deve ser tratado com diálogo e não com con­­­fronto. Dirigentes da Asso­­­­ciação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e da Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e outras ligadas a empresas de telecomunicações evitaram polemizar com o ministro e afirmaram que pretendem contribuir com a discussão.

Na abertura do seminário internacional Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias, terça-feira, Martins disse que nenhum setor ou grupo pode interditar a discussão sobre a regulação da mídia. "Vamos nos desarmar. A discussão está na mesa, está na agenda. Ela terá de ser feita e pode ser feita num clima de entendimento ou num clima de enfrentamento. Eu acho que é muito melhor fazer num clima de entendimento", disse Franklin Martins.

Antes de deixar o governo, Franklin vai encaminhar ao presidente Lula um anteprojeto com proposta de regulamentação da mídia. A decisão de encaminhar ao Congresso Nacional será da presidente eleita Dilma Rousseff.

Para Daniel Slaviero, ex-presidente da Abert, não há clima de embate entre o governo e as empresas de comunicação. Slaviero afirmou que a entidade gostaria até de participar de um grupo de trabalho para contribuir na elaboração do texto do anteprojeto de lei sobre o setor, antes que fosse enviado ao Congresso.

"O seminário mostrou que há vários modelos e que temos uma legislação, de 1962, que precisa ser atualizada. Estamos prontos para esse diálogo e a sentar e conversar. Só que vamos reagir fortemente se houver interferência no conteúdo de rádios e tevês, no cerceamento da liberdade de imprensa", disse Slaviero.

Ele não considerou ofensiva as declarações de Franklin. "Acho que o ministro não carregou na tinta, como se diz. Foi dentro da sua linha."

O presidente da Associação Brasileira de Televisão por Assina­­­tura (ABTA), Alexandre Annenberg, afirmou que não há "discrepâncias insanáveis" entre o setor e o governo. Para ele, a discussão tem o objetivo de encontrar o modelo mais adequado ao Brasil.

"Não chamaria de embate para não caracterizar posições antagônicas. Não creio que deva ser esse o ponto de partida. Temos que, agora, partir para aprofundar a discussão. Num nível de franqueza, mas de entendimento como foi colocado aqui", disse Annenberg.

O presidente da associação disse que cabe ao governo a regulação do setor, mas isso precisa ser feito despido de posições ideológicas.

"A regulação é um instrumento do estado e ponto final. Não existe você ser contra ou a favor do marco regulatório. Ele tem de existir."

Ricardo Pedreira, da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), considerou positivo a realização do seminário e que o Brasil tenha um marco regulatório, como existe em países europeus e nos Estados Unidos. Mas ele tem receio da ameaça a liberdade de imprensa.

"O que não cabe é qualquer controle prévio aos meios de comunicação", afirmou Pedreira.

O diretor-executivo do Sindicato Nacional das Empresas de telefonia e de Serviço Móvel e Celular e Pessoal (SindiTelebrasil), Eduardo Levy, afirmou acreditar que em qualquer mudança de marco regulatório os interesses de todos os envolvidos são lícitos. Levy alega que o anteprojeto a ser elaborado pelo governo será negociado com todos os segmentos.

"Não tem como ser imposta. Não é rápida, é lenta. E qualquer mudança tem que ser debatida a exaustão e no fórum adequado, que é o Congresso", disse.

O presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Ronaldo Sardenberg, considerou o seminário útil para coleta de informações sobre o que está ocorrendo em outros países nessa área e afirmou que os meios de comunicação não podem ficar fora desse debate.

"A questão está posta e os meios de comunicação precisam dar sua contribuição. Com o silêncio ou a simples crítica não vai sobreviver", disse Sardenberg.

Ontem, no discurso de encerramento do seminário, Franklin Martins evitou críticas às empresas de comunicação, disse que a regulação da mídia não é um "bicho de sete cabeças" e que esse debate ainda vai durar algum tempo.

"É normal a oposição ao projeto. Este é um tema complexo e sensível. Natural também que seja controverso. Mas o Brasil quer discutir esse tema", disse o ministro.

Conteúdo

As experiências internacionais de regulamentação de conteúdo dos meios de comunicação passam lon­­­­­ge de qualquer tipo de controle editorial. As regras aplicadas em paí­­­ses como França e Inglaterra têm objetivos genéricos, como evitar que rádios e tevês veiculem programas com conteúdo obsceno, e exi­­gem uma grande de programação ampla, imparcial e equilibrada.

"O Conselho Superior de Audiovisual [CSA] não é um organismo de censura. Não podemos determinar o que será transmitido, os canais não precisam nos mostrar com antecedência o conteúdo de seus programas", afirmou ontem Emanuel Gabla, conselheiro do CSA, durante o seminário.

O último dia do encontro foi voltado para a discutir as experiências de regulamentação de países como França, Inglaterra, Estados Unidos e Argentina. Somente no caso norte-americano não há regras fixadas sobre conteúdo. A exceção, vale apenas para as transmissões de tevês abertas e rádios, que são proibidos de veicular qualquer tipo de programa com conteúdo obsceno e indecente.

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