
Ouça este conteúdo
O papa é o líder mais intrinsecamente internacional que haja. Dado que o Vaticano é o menor Estado-nação do mundo, que a comunidade de fiéis católicos é internacional e dado o caráter de evangelização da religião, o olhar para fora é uma prioridade.
O catolicismo é universalista por definição, mas universalista não significa internacional e nem globalizado, mas estão se adoperando para isso.
A Santa Sé tem missões diplomáticas (os núncios apostólicos) em mais de 180 países (com tanto de imunidade, isenções fiscais, inviolabilidade etc.) e representações na ONU, UNESCO, FAO, OMS, UNCHR, OIT, OCDE, etc. Claro, o Vaticano não tem Exército, o tipo de poder que exerce é soft power.
Nas relações internacionais, existe uma tendência comum do Vaticano e existem diferenças de um papa para outro. De modo geral, pontífices mais “conservadores” tendem a usar mais sua autoridade moral, a condenar mais duramente regimes autoritários e quem inicia guerras; papas mais “progressistas” mantêm uma posição mais pragmática com regimes autoritários e uma posição mais neutra sobre os países em guerra.
Papa Francisco, de forma específica, foi do segundo tipo e operou uma mudança de rota importante em comparação com Ratzinger e Wojtyla. Esses dois tinham um olhar mais positivo sobre os EUA, um como país mais religioso que a secularizada Europa, o outro em chave anticomunista.
Francisco criticou o “muro de Trump”; visitou Cuba, conversou com os irmãos Castro e os definiu “íntimos”; fez só criticas leves ao regime nicaraguense que persegue padres, fecha TVs e rádios católicas e expulsou o núncio apostólico; sempre se posicionou contra a guerra na Ucrânia, mas nunca culpou explicitamente a Rússia pela invasão e começou a expansão para a Ásia.
Em 1999, ao limiar do novo milênio, Papa João Paulo II escreveu (em Eclésia em Ásia) que o 1º milênio foi para levar a cruz na Europa, o 2º para se difundir nas Américas e o 3º será orientado à Ásia.
África e Ásia são os continentes mais populosos, com o maior crescimento demográfico, onde podem ganhar mais fiéis. Não por acaso, em 2018, teve o famoso acordo secreto entre Vaticano e China: o regime chinês indica os cardeais e o Vaticano se limita a aceitar ou vetar.
Esse acordo é muito criticado pelos mais conservadores e o mesmo Vaticano reclamou em 2024, mas a ideia é ceder agora para ganhar no longo prazo: o tempo é maior que o espaço. A igreja pensa em milênios.
Além disso, Papa Francisco fez várias viagens na Ásia (diferentemente de Bento XVI) no Japão, Indonésia, Timor-Leste, Singapura, Myanmar, etc., nomeando novos cardeais em vários desses países ao redor da China.
Foi também o primeiro papa a visitar a Mongólia e os Emirados Árabes Unidos; ele também telefonava todos os dias para a comunidade de católicos em Gaza; Francisco foi também o primeiro papa a encontrar o Patriarca de Mosca e de todas as Rússias (Kirill) em 2016.
Uma das grandes reformas de Francisco foi exatamente o reequilibro geopolítico do Conclave (o órgão que elege o papa), que ficou muito mais internacional, e não por acaso agora tem 17% de cardeais asiáticos, não obstante, a Ásia tenha 10% dos católicos do mundo.
Francisco sempre dedicou muita atenção às questões internacionais. Para descrever a situação global atual, ele até cunhou o conceito de “Terceira Guerra Mundial em pedaços”, que agora está sendo usado por internacionalistas do mundo inteiro.
Nas suas primeiras palavras como Bispo de Roma, Francisco falou que veio “quase do fim do mundo”. De fato, foi o primeiro pontífice da América Latina, o primeiro não Europeu depois de 1700 anos.
É o papa da periferia do mundo, com aquele que o prof. Lucio Caracciolo definiu o “olhar de Magalhães” como o ponto de vista da periferia que não olha somente a Europa e que vê o Centro desde fora e, vamos adicionar, que vai em direção leste.
VEJA TAMBÉM:
Conteúdo editado por: Aline Menezes




