O que o TSE, a bolsa Galleria da Prada e o Johnnie Walker Blue Label têm em comum? Se não fosse o TSE, a resposta seria fácil. Uma Galleria Prada grande, vermelhinha, em couro Saffiano, custa R$ 17.500,00 segundo o site da grife. O Blue Label, no site da Johnnie Walker, custa, com desconto, R$ 892,00. O preço normal, segundo o site, é R$ 976,00. A garrafa tem 750ml. Assim, podemos sem dificuldade dizer que dois dos três elementos citados têm em comum um público consumidor de alto luxo.
No Brasil, a maioria dos compradores deve ser concursado que ganha 40 mil por mês e gente de classe média sem bom-senso que abusa do cartão de crédito. (Afinal, o que não falta neste mundo é gente que se endivida comprando as coisas só por causa de status. Se botar uma Caninha da Roça na garrafa de uma bebida de dez mil reais, esse povo toma e jura que a bebida é de um sabor refinadíssimo, com notas de macadâmia selvagem e vestígios de carvalho holandês.) O uísque talvez atraia a turma da ostentação do tráfico, puxada por funkeiros propagandistas de facção que prometem fortunas aos jovens que ingressem no negócio. Tanto entre maloqueiros como entre hipsters, dondocas e nouveaux riches, a mentalidade é gastar para ser alguém na vida. De resto, deve existir uma meia dúzia de ricos equilibrados e refinados, capazes de comprar tais produtos sem comprometer as finanças e de apreciar-lhes a qualidade.
Pois muito bem. E se eu disser, então, que TSE, Blue Label e Prada têm em comum justamente a garota propaganda? E se eu disser, ainda, que a tal garota propaganda é uma militante do PT? Que tempos malucos, não é mesmo?
Trata-se de Djamila Ribeiro, uma Mulher Negra® do PT cujo primeiro feito digno de nota foi ocupar a secretaria de direitos humanos do prefeito Haddad. (Quanto à marca registrada, esclareça-se: nem todas as negras são Mulher Negra®. Mulher Negra® é a adepta do progressismo que passar pelo tribunal racial constituído por autoridades petistas como Djamila Ribeiro.) Depois ela foi transformada pela Companhia das Letras em intelectual. Já li e resenhei os livros dela neste jornal, aqui, aqui e aqui.
Djamila Ribeiro e o Blue Label
A Mulher Negra® estrelou na inédita campanha de dia das mães do Johnnie Walker. Em 2021, alguma publicitária resolveu que seu papel não é o de vender uísque, senão o de reeducar o povo para desconstruir estereótipos de gênero. Uma “campanha revolucionária”, segundo a Forbes. Por isso, lançou mundo afora a campanha Iconic Mothers, tendo escalado no Brasil um grupo que incluía Djamila Ribeiro. Ela aparece numa foto azulada fazendo cara de paisagem com uma frase tatuada da bochecha ao pescoço: “Mãe é ess resiliência.” Rasuradinho, com o “resili” escrito por cima do “ess” cortado. Frases como essa, de profundidade duvidosa, estampam garrafas de uma edição especial que custa R$1.049,00.
Muito bem. E o que a pensadora tem a dizer sobre isso? “A sociedade ainda enxerga a mãe nesse lugar do sacrifício, daquela que tem que abnegar de tudo, que tem que viver sempre em função dos filhos. E o que eu espero é que as mulheres possam ter escolhas de fato.” De fato, nem todas as mulheres têm a liberdade para escolher comprar garrafas de Johnnie Walker/ Blue Label. Assim, ficamos no aguardo de políticas públicas direcionadas à inclusão da Mulher Negra® no acesso ao Blue Label, um verdadeiro direito humano. Com o Meu Blue Label, Minha Vida, as injustiças históricas sofridas pela Mulher Negra® serão enfim reparadas.
Djamila Ribeiro veste Prada
Não achei o uísque da linha especial na loja da Johnnie Walker, muito embora lá constem produtos indisponíveis de outras edições limitadas. Com meus botões, chuto que não tenha vendido nem uma garrafa, que tenha sido retirado do catálogo e que a publicitária esteja desempregada (por culpa do patriarcado). Não obstante, Djamila passou a fazer propagandas em estilo mais convencional: tornou-se uma influencer no Instagram que fica fazendo postagens publicitárias, ou publiposts.
Ela fez dois da Prada, com a bolsa Galleria vermelhinha supracitada. Há este aqui, em que ela fica olhando e piscando, e que traz o seguinte texto: “A bolsa Galleria é um marco da Prada. Nomeada em homenagem à primeira loja da marca em Milão, a belíssima Galleria Vittorio Emanuele II, na qual tive a oportunidade de estar a convite da marca em 2019, a bolsa Galleria tem elegância e estilo. Para apresentar a campanha de 2021 da Prada Galleria Saffiano Lux, vocês, a Prada me convidou para fazer esse lindo ensaio. Obrigada, amei! @prada #PradaGalleria #Publi”
Como informam as hashtags, ela foi paga para fazer isso. Se não fosse, poderíamos imaginar mil problematizações contra essa branquitude estruturalmente racista, que pôs o nome da bolsa em homenagem a uma galeria que leva o nome de um rei nacionalista branco. Por que essa bolsa tão cara está ligada a Vítor Emanuel II, não a Zumbi dos Palmares? Por que não há uma linha Nzinga? Por que não há nenhuma bolsa com balangandãs de baiana? Racismo, óbvio. Mas, pagando, nenhuma pergunta cretina é feita.
Foram dois publiposts da Prada. O outro vem com o texto: “Amei tanto esse ensaio...best seller, professora, editora, mãe, candomblecista, premiada, preta e linda. Realmente o Brasil colonial não estava preparado ????????❤ Seguimos plenas ❤ ⚔” Há menos de dez anos, a noção de esquerda tinha algo a ver com uma rejeição ao consumismo e ao estilo de vida burguês. Hoje enfrentar o “Brasil colonial” é a militante posar com uma bolsa Prada. Bolsa vermelhinha, pra combinar com a ideologia.
Publipost de urna
Em meio a propagandas da Prada, de livros e das próprias colunas na Folha de São Paulo, qual a surpresa ao não encontrarmos uma propaganda da urna eletrônica? No texto, lê-se: “É nítido meu orgulho da Urna eletrônica! Chega a emocionar ❤. Nesse dia, a convite do @tsejus, gravei campanha nacional de combate à desinformação sobre o sistema eleitoral. Logo mais tá aí! #tbt❤️”
Chega de comentar. O TSE põe uma militante petista para fazer propaganda da urna. É deboche?
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