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12 passos para você passar a fase da indignação e entender por que os deputados ferraram com a proposta anticorrupção
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Indignação é algo bom: ainda mais quando a causa é justa. Mas se indignar sem entender o mecanismo daquilo que nos indigna é o caminho para cair na próxima armadilha. Por isso é besteira bater panela em frente à tevê – você tem que ouvir para entender, e entender para protestar sem falar asneira.

Então, por partes.

1- O que os deputados federais fizeram nesta quarta-feira é realmente uma afronta. A mim, a você, a todos nós. Depenaram um projeto que, apesar de suas falhas (e inclusive alguns trechos pouco democráticos) serviria, com pequenas modificações, para reduzir a impunidade. Ou, no mínimo, para reduzir a sensação de impunidade, o que não seria pouca coisa.

2- Pior que isso: ainda deram um jeito de frear juízes, possivelmente de amordaçar jornais e de livrar corruptos. Pacote completo da trairagem.

3- Ei, você achou que não podia ser pior? Mas foi: eles usaram, sim, a tragédia da Chapecoense para vandalizar o projeto – perceberam que o noticiário ia estar concentrado no desastre e acharam que iam sair impunes com isso. Sim, a palavra que define isso não cabe em um blog bem comportado como este.

4- Mas aí fica a pergunta: e por que eles fizeram isso?

5- A primeira resposta é meio óbvia: porque muitos deles devem. Têm rabo preso. E se não fizerem isso podem ir presos. Antes isso poderia parecer bem distante e portanto não havia motivo para fazer legislações que facilitassem a escapada. Mas agora, com Lava Jato e tudo mais, é bom ter rotas de fuga. E eles estão construindo isso.

6- A segunda resposta é a que mais tem a ver com você, comigo, e com o que a gente vai querer fazer sobre isso. A resposta é: eles fizeram isso PORQUE ELES PODEM. E podem não só porque foram eleitos e lhe deram mandatos – mas também porque, apesar de tudo, continuam achando que podem fazer de tudo e escapar incólumes.

7- O fato é que há um conflito de interesses brutal em jogo. Os deputados, muitos deles, quase todos, aprenderam a jogar um jogo em que as regras eram as melhores possíveis para eles – sem fiscalização oficial (das instituições) que prestasse, e sem eleitores muito atentos. A primeira parte mudou, embora ainda haja muito corporativismo e aliança entre membros de elites de diferentes poderes. A segunda, infelizmente, mudou menos, apesar de passeatas e alguns movimentos populares.

8- O conflito de interesses surge do fato óbvio: o interesse de um deputado corrupto em se manter no poder (e se reeleger) não bate com nosso desejo de ter um Congresso que coíba práticas venais. E há um segundo conflito, interno dos deputados. Eles querem também que o eleitor confie nele a ponto de votar de novo assim que possível – ou o poder dele simplesmente acaba.

9- O problema que ficou evidente nesta quarta é: os deputados ainda não se veem pressionados o suficiente para abrir mão de seus interesses pessoais. Eles continuam se sentindo confortáveis para colocar a construção da rota de escape em primeiro lugar – pelo simples motivo de acharem que vão continuar sendo eleitos mesmo assim.

10- Resumindo em uma frase: a pressão popular para evitar esse tipo de postura não é forte o suficiente.

11- Como resolver isso? Há várias respostas. Um “institucionalista” diria que o negócio é reforma política (voto distrital, por exemplo). Um partidário das manifestações populares diria que falta mobilização. Há quem ache que o que falta é uma população mais bem educada. E só um tolo diria que é o caso de fechar o Congresso.

12- O que não vale é simplesmente olhar e dizer: isso nunca vai mudar. Enquanto a gente não tentar entender e ficar só xingando os políticos, como se eles fossem algo separado do mundo, como se eles fossem tão diferentes de mim e de você, é verdade: nada muda. Disso não há dúvida.

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