Mercadinho em Havana em 2013, início do período de expansão da abertura da economia cubana.| Foto: Célio Martins/Gazeta do Povo
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Na mídia cubana não se usa o termo ‘setor privado’. Mas, nas duas últimas décadas, o governo vem tomando medidas para impulsionar o que classifica como ‘setor não-estatal’ e a abertura econômica. Agora, com a crise provocada pela pandemia do novo coronavírus, Cuba pretende dar mais um passo rumo a mudanças na economia.

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As medidas que ampliam a abertura do modelo econômico foram confirmadas em uma sessão extraordinária do Conselho de Ministros na semana passada. Uma parte das mudanças entrou em vigor nesta segunda-feira (20).

Entre os pontos da estratégia anunciada estão abertura de lojas que aceitarão moeda estrangeira livremente conversível; eliminação do imposto de 10% sobre o dólar; autorização para o setor não-estatal exportar; e variação de preços de eletrodomésticos e automóveis de acordo com as cotações de preços internacionais.

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Integrantes do governo de Cuba em mesa redonda para explicar as novas medidas econômicas, na quinta-feira (16).| Foto: Divulgação/Presidência de Cuba

O ministro da Economia e Planejamento, Alejandro Gil, disse que está sendo desenvolvido um trabalho para criar um mercado atacadista com ofertas em moeda estrangeira livremente conversível. “Se não dispomos de todos os recursos, é preferível ter uma oferta em MLC (moeda livremente conversível) antes que nada. Uma maneira de termos ofertas estáveis é fechar circuitos e usar a receita da MLC para abastecer esses mercados”, comentou.

Quanto à eliminação do imposto de 10%, que até agora era aplicado ao dólar americano que entrava no sistema bancário, é uma tentativa de facilitar a entrada de moeda norte-americana no país, que sofreu forte redução com a paralisação do turismo, um dos principais motores da economia da ilha, além do endurecimento do bloqueio econômico por parte do presidente dos EUA, Donald Trump. A medida entrou em vigor nesta segunda-feira (20).

Rodrigo Malmierca, ministro de Comércio Exterior e Investimento Estrangeiro, reforçou a defesa de maior participação do setor privado nas exportações. “Existem trabalhadores autônomos que não têm personalidade jurídica, eles terão quando tivermos a legislação pronta para a constituição de micro, pequenas e médias empresas. Mas não precisamos esperar essa etapa para que eles possam exportar ”, afirmou.

Salão de beleza no centro velho de Havana, em 2013, marca início da abertura econômica.| Foto: Célio Martins/Gazeta do Povo
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O presidente cubano, Díaz-Canel, disse que as medidas fazem parte do Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social até 2030 e constam nas estratégias aprovadas pelo Partido Comunista de Cuba.

Princípios das novas medidas

  • Manter o planejamento centralizado
  • Incentivar a competitividade, a economia, a motivação para o trabalho e a implementação da eficiência
  • Complementaridade dos atores econômicos
  • Defender a produção nacional e banir a mentalidade de importação
  • Regulação do mercado
  • Papel dinâmico da demanda doméstica pela economia
  • Proporcionar maior autonomia gerencial ao setor empresarial
  • Implementar os principais aspectos, aprovados e pendentes, principalmente no que diz respeito às formas de gestão
  • Política ambiental ativa em harmonia com os regulamentos do país

O processo de abertura econômica de Cuba sofreu maior impulso a partir de 2010, quando o país estava sob a presidência de Raul Castro, irmão de Fidel Castro, que se aposentou após problemas de saúde. A partir daquele ano, gradualmente, foram autorizadas atuação de alguns profissionais liberais - como cabeleireiros -, compra de automóveis, compra e aluguel de imóveis, além da abertura de oportunidades para que cubanos viajassem ao exterior. Nos anos seguintes foram dados mais estímulos ao setor privado com autorizações de licenças, como restaurantes e lanchonetes.

A chegada das marcas internacionais ao comércio cubano.| Foto: Célio Martins/Gazeta do Povo
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Houve ainda uma reforma agrícola com o afrouxamento de normas para favorecer forças do mercado e preços, mas em 2015 as mudanças foram revertidas e o sistema dominado pelo Estado foi restaurado, sob alegação de que os preços estavam sendo inflacionados devido à especulação.

Também foram feitas alterações na lei de investimento estrangeiro, em 2014, quando foram reduzidos impostos e proporcionado maior flexibilidade em termos de participação majoritária de investidores estrangeiros em empreendimentos em parceria com o Estado.

Em que pese os avanços, a economia cubana ainda é fortemente centralizada, condição que deverá ser mantida, segundo o anunciado pelo governo na semana passada.

***Em 2013 o jornalista Célio Martins produziu uma série de reportagens em Cuba para registrar o processo de abertura do país. Confira AQUI as reportagens.