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O historiador, escritor e político inglês Lord Acton.
O historiador, escritor e político inglês Lord Acton.| Foto: Reprodução/Domínio público

Nas páginas da história, há indivíduos cujo legado transcende seu tempo, deixando uma marca indelével nas mentes das gerações futuras. John Emerich Edward Dalberg-Acton, conhecido como Lord Acton, foi uma dessas figuras notáveis do século 19 que influenciaram tanto o pensamento político quanto a compreensão da moralidade religiosa, a ponto de ser conhecido como “o magistrado da história”.

Nascido em 10 de janeiro de 1834 em Nápoles, na Itália, Lord Acton cresceu em um ambiente de erudição e cultura. Sua educação privilegiada lhe concedeu uma base sólida em literatura, filosofia e história, moldando-o em um intelectual perspicaz desde cedo. Sua mente inquisitiva e natureza questionadora logo o conduziram a explorar questões que transcendiam as fronteiras convencionais do conhecimento. Seu desejo era ingressar na Universidade de Cambridge; porém, a entrada lhe foi negada devido à sua fé católica (Cambridge somente aceitava protestantes). Como resultado, ele foi encaminhado a Munique, na Alemanha, onde teve a oportunidade de estudar sob a orientação do renomado teólogo Johann Joseph Ignaz von Dollinger. A influência de Dollinger despertou nele um profundo entusiasmo pela pesquisa histórica.

Uma das contribuições mais marcantes de Lord Acton foi sua observação de que “o poder tende a corromper e o poder absoluto corrompe absolutamente”. Essa sentença captura a essência de sua preocupação com os perigos do poder descontrolado, inspirando futuros pensadores e líderes a considerar a importância de limitar e equilibrar o poder para evitar abusos. Sua visão se apoiava em uma compreensão profunda da história e da natureza humana, enfatizando a necessidade de freios e contrapesos para salvaguardar a liberdade e a dignidade individuais.

O legado de Lord Acton se estendia além das questões políticas. Sua ênfase na liberdade individual estava enraizada em uma compreensão profunda da natureza humana

A propósito, Lord Acton coleciona uma série de frases muito importantes, tanto para liberais do passado quanto para a sociedade atual. Rodrigo Constantino colacionou muitas destas frases aqui na Gazeta.

No entanto, o legado de Lord Acton se estendia além das questões políticas. Sua ênfase na liberdade individual estava enraizada em uma compreensão profunda da natureza humana. Ele acreditava que cada indivíduo possuía uma dignidade inata e que a liberdade era essencial para permitir que essa dignidade florescesse. No entanto, Acton também reconhecia que a liberdade não poderia existir isoladamente. Ele via a moralidade religiosa como uma força necessária para orientar o uso responsável da liberdade, evitando excessos e abusos que poderiam comprometer a sociedade.

Enquanto muitos liberais atuais pensam que os únicos pontos a serem discutidos na sociedade são o tamanho do Estado, privatizações, impostos ou mesmo corrupção, os liberais clássicos se preocupavam justamente com a força impulsionadora da alma humana: a fé religiosa. Ali, no recôndito da consciência, reside o ímpeto que leva o ser humano a transcender. É aí, justamente, que vai acabar por servir ao próximo – mesmo que conscientemente esteja buscando um interesse próprio – ao solucionar problemas, de forma simplificada, a um baixo custo. Diferentemente do que os franceses buscaram, construir uma civilização que prescindisse da fé religiosa, os ingleses mantiveram intacto o direito humano fundamental de agir conforme a consciência lhes indicava, não apenas conforme seus desejos.

Isto também mostra o apelo à visão antropológica sobre a vida humana. Quem somos, de onde viemos, para onde vamos? Somos bons ou maus por natureza? Se observamos nossa tendência “totalitária”, como limitar as arbitrariedades (o exercício da vontade de uns sobre os demais), especialmente daqueles investidos de autoridade política?

Sua visão foi profundamente influenciada por sua fé católica e sua crença na importância da moralidade como um alicerce para a liberdade. Lord Acton argumentava que a religião, ao fornecer princípios éticos sólidos, poderia servir como um contrapeso à tendência humana ao egoísmo e à corrupção.

Em seu A História da Liberdade no Cristianismo, magnífica obra de síntese histórica, descortinou quase dois milênios em uma única narrativa que gradualmente revela a evolução da liberdade humana. Lord Acton contrariou o enredo do Iluminismo que ele havia herdado. O advento do cristianismo não reprimiu a luz da liberdade que resplandecia intensamente na Grécia e em Roma, apenas para ser reacendida quando o dogmatismo medieval cedeu espaço à razão benevolente de figuras como Voltaire, Hume e Kant. Em vez disso, o cristianismo resgatou as brasas da liberdade, que tremeluziam timidamente em um cenário antigo caracterizado pelo domínio dos fortes sobre os fracos, e, com uma progressão gradual e cuidadosa, reacendeu-as em uma chama que emancipou a humanidade de suas correntes, tanto internas quanto externas.

Lord Acton argumentava que a religião, ao fornecer princípios éticos sólidos, poderia servir como um contrapeso à tendência humana ao egoísmo e à corrupção

Embora sua vida tenha sido curta – Lord Acton faleceu em 19 de junho de 1902 –, seu impacto continua a ecoar. Sua obra, incluindo correspondências com pensadores contemporâneos, revela um compromisso apaixonado com a verdade, a justiça e a sabedoria. Lord Acton nos lembra que a liberdade não é um fim em si mesma, mas deve ser acompanhada pela responsabilidade e pela moralidade para ser verdadeiramente significativa.

Lord Acton permanece como uma voz sábia e atemporal. Seu apelo por limitar o poder, valorizar a liberdade e preservar a moralidade religiosa como um guardião da liberdade continua a ressoar, lembrando-nos de nossa responsabilidade coletiva de moldar um mundo onde a liberdade, a dignidade e a sabedoria caminhem de mãos dadas.

Se você quiser conhecer mais sobre sua história, e como inspira gerações até hoje, convido-o a conhecer o Acton Institute, entidade da qual tenho orgulho de ser conselheiro para o Brasil, juntamente com Marcel van Hattem, Richard Lark e Karine Amorim, e que busca honrar o legado de seu patrono na busca pela promoção de uma sociedade livre, sustentada por princípios e valores de virtude.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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