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O Ministério Público Federal (MPF) em Goiás ajuizou ação civil pública para que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) defina quais os protocolos clínicos específicos para tratamentos de pessoas com autismo. Se você não é um operador do direito e leu essa notícia em algum lugar, pode ter ficado confuso e se perguntando: isso é bom ou ruim? Mas “calma lá” que já vou explicar.

Em primeiro lugar, quem é o MPF – o “tal” Ministério Público Federal? Tenho certeza que, pelo menos uma vez na semana, você escuta no noticiário: “Ministério Público”, mas você sabe quais são as atribuições do MP?

A Constituição Federal reconheceu o Ministério Público como instituição permanente e essencial. O MP é independente e não se subordina ao Judiciário, Executivo ou Legislativo. O Ministério Público é dividido, a fim de garantir sua atuação adequada e organizada, em Ministério Público da União e Ministério Público dos Estados (que são independentes entre si).

Cada estado tem seu Ministério Público Estadual (ou seja, temos 26 Ministérios Públicos Estaduais, um para cada estado da União). Já o Ministério Público da União é dividido em quatro ramos: Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Ministério Público do Trabalho (MPT) e Ministério Público Militar (MPM). Cada um desses ramos tem função específica.

Não vou ficar falando da função de cada um dos quatro ramos do MPU, apenas me fixando no Ministério Público Federal, que é o que interessa para entendermos melhor a notícia. O MPF possui, em síntese, as seguintes funções: fiscal da lei (quando um processo em andamento na Justiça Federal envolve interesse público relevante; nesse caso, intervém no processo não como parte, mas como interessado, na condição de custos legis); ingressar com ações para defender interesses difusos (interesses de toda sociedade), interesses coletivos (de um grupo de indivíduos), individuais homogêneos (atinge as pessoas individualmente, mas são direitos que não podem ser considerados individuais); promoção de ação penal pública quando a competência do julgamento for na Justiça Federal. Agora, com isso em mente, vamos entender o segundo aspecto da notícia, qual seja: entender o que é ação civil pública.

Ação civil pública é uma ação que visa a reprimir um dano, em caso de defesa de direitos transindividuais, como, por exemplo, o interesse de direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos. Ela está prevista na Constituição Federal como função institucional do Ministério Público. “Mas, Hanna, você não pode entrar com ação civil pública já que é advogada?” Não! Porque há um rol taxativo de quem pode ajuizar essa ação: Defensoria pública, entes federativos, Conselho Federal da OAB, autarquia, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, algumas associações, entidades públicas destinadas a ajuizar ações coletivas – como o Ministério Público. Havendo sentença condenatória na ação civil pública, ela será benéfica a todo o grupo lesado, podendo condenar ao pagamento em dinheiro, uma obrigação de fazer ou não fazer.

Bom, agora que sabemos qual a função do MPF e o que é ação civil pública, precisamos entender o contexto atual da relação “plano de saúde” versus “consumidor com autismo”. É muito comum planos de saúde negarem tratamentos às pessoas com autismo por estes tratamentos não estarem previstos no rol da ANS, mesmo o médico definindo tais terapias como necessárias. Ainda, quando liberados há limitações de número de sessões em quantidades extremamente inferiores às geralmente recomendadas pelos médicos, já que a maioria dos protocolos terapêuticos indicados são intensivos e multiprofissionais. Tal situação tem gerado um número considerável de ações judiciais na busca de ordem judicial que obrigue o plano à oferta dessas terapias. A ANS, mesmo ciente deste contexto, resta-se omissa.

Não seria bom se a ANS colocasse em seu rol os tratamentos para autismo? Isso beneficiaria a todas as pessoas autistas que possuem plano de saúde e reduziria sobremaneira decisões judiciais sobre o tema. Diante disso, o MPF entrou com pedido requerendo para declarar a inaplicabilidade para o tratamento de autismo da limitação das sessões de psicoterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia. Ainda, foi realizado pedido para que a ANS supra a omissão (do rol da ANS) referente à falta de protocolos clínicos específicos e eficazes para o tratamento dos usuários de planos privados acometidos com TEA.

Se deferido o pedido, isso pode vir a beneficiar um número imenso de famílias! Porém, “nem tudo são flores”. É um pouco preocupante a questão de estipulação de quais os protocolos clínicos específicos e eficazes. Será que essa definição de quais são os protocolos eficazes será acatada de forma adequada? Estou confiante no MPF, acompanhando a demanda e torcendo pelo melhor.

Se você se interessou pelo tema, pode também escutar o podcast PARALEGAL (episódio #1): Clique aqui. Esse é um podcast que eu participo e, no episódio mencionado, tratamos sobre o assunto (dentre outros temas, como Autismo no censo e a lei de regulamenta a equoterapia). Então, “cola lá” para mais informações!

Quer sugerir um tema ou contar sua história? Quer partilhar como é ser autista ou sua vivência como pai/mãe de uma criança/adolescente com autismo? Vou adorar ouvir você! (contato@baptistaenascimento.com.br)

Hanna Baptista – redatora do Diário de Autista, advogada, e mãe de uma linda criança autista.

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