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Preciso esperar para aprender?
| Foto: pexels.com

Você está preocupado com a educação? Pois é, eu também. Tenho uma carreira de pouco mais de 25 anos na educação e confesso que, nos últimos 5 anos, essa preocupação tornou-se mais intensa.

Percebo no meu vai e vem de palestras, workshops e consultorias, que há movimento, ainda tímido, rumo a caminhos inovadores para o ato de ensinar de um jeito diferente, que resulte em verdadeiro aprendizado por parte dos alunos e, arrisco a dizer, também por parte do professor. Porém, vejo que muitas dessas mudanças são motivadas por interesses econômicos, e até políticos, do que efetivamente para se tornarem pilares sólidos para uma transformação duradoura. Tenho notado muita pirotecnia, holofotes, fotos para redes sociais e site da instituição, palanques, verdadeiros poleiros e muros de arrimo para o mais do mesmo. O parecer ser, mas não ser. E isso me incomoda muito!

Defendo que muitas dessas mudanças estão na direção errada. Infelizmente a cultura da padronização ainda existe e posso afirmar que isso, a médio ou longo prazo, irá afetar diretamente você ou alguém próximo.  As mudanças estão acontecendo a passos largos no mundo todo e, ainda bem, já respingaram em muitos espaços educacionais onde é possível ver e se encantar com professores efetivamente inspiradores e transformadores.

Que tal se voltássemos à origem de tudo e nos perguntássemos: para que serve a educação? Ou ainda: se você fosse construir uma escola hoje, ela teria a mesma configuração daquelas já existentes? O que você faria diferente?

Recentemente visitei a Brightworks School na cidade de San Francisco (Califórnia – USA). Em menos de 15 minutos eu já estava com uma sensação de querer voltar no tempo para estudar ali! Para começo de conversa o lema da escola é algo do tipo: aqui tudo é interessante, aqui dizemos sim! E ainda tem mais, há uma curiosa questão motivadora por lá: por que esperar até que você seja adulto para fazer contribuições significativas para o mundo? A Brightworks reimagina a educação básica como um momento para aumentar sua capacidade de impactar a comunidade ao seu redor. Ao optar pelo uso de ferramentas e materiais concretos, para a resolução de problemas reais, o impacto é realmente impressionante. Por meio de uma estrutura daquilo que eles chamam de três arcos (exploração, expressão e exposição), o tão falado protagonismo do aluno acontece de um jeito natural. Há uma ajustada combinação entre ambiciosos projetos e a paixão pelo aprender fazendo.

Está bem. Eu sei. Vamos voltar para o lado de cá e questionar: como fazer isso (ou parte disso) em minha escola? Como é que a minha instituição e professores poderiam se apropriar dessas novas estratégias? Vamos ver o que nos dizem algumas referências sobre Aprendizagem Baseada em Projetos, também conhecida por Project Based Learning: trata-se de uma estratégia de ensino que consiste em deixar que os alunos confrontem questões e problemas do mundo real, que sejam significativos, determinando como abordá-los e agindo de forma colaborativa em busca de uma solução inovadora.

Com base em tudo o que tenho lido, pesquisado, conversado e fuçado, posso afirmar (sem medo de errar) que a Aprendizagem Baseada em Projetos (ou apenas ABP) está muito bem cotada para se tornar o principal modelo de ensino deste século. Portanto, recomendo que educadores e gestores educacionais iniciem rapidamente um movimento de entendimento desses novos conceitos e ideias. A ABP se utiliza de projetos autênticos e aderentes ao mundo real, para ensinar conteúdos acadêmicos aos alunos, a partir de uma questão ou tarefa altamente motivadora onde os alunos, organizados em pequenas comunidades de aprendizagem em sala de aula, usam e abusam da criatividade para a resolução do problema proposto.

E como organizar tudo isso? A estrutura que recomendarei a seguir é uma boa trilha a ser seguida:

1. Âncora

É a preparação do cenário com elementos que provoquem os alunos e chamem a atenção deles para a ação. Esses elementos podem ser: vídeos, podcasts, artigos, charges, músicas, ou seja, uma coleção de itens recheados de informações úteis. Algo como passo inicial antes da pesquisa própria e efervescência de ideias. É a base ou fundamentação para a questão motriz.

Sem dúvidas, por si só a ABP é uma incrível metodologia ativa de ensino. E, por ser muito abrangente e nada engessada, é possível pensar que ao disponibilizar materiais prévios aos alunos, o professor está utilizando elementos do Flipped Classroom (Sala de Aula Invertida), para o posterior resgate desses ingredientes com os alunos. Sendo assim, é possível combinar metodologias dentro de um grande projeto.

2. Questão Motriz

É a questão principal a ser respondida. Também chamada de meta explicita, ela deverá ser bastante clara e altamente motivadora. Precisa ser algo que os alunos considerem significativo e que desperte a paixão deles para desejarem buscar as respostas.

3. Web

Aqui acontecerá a pesquisa intensa. De posse da questão motriz e dos elementos âncora, os alunos estão livres para buscarem outras informações, pontos de vista, novos elementos, tudo o que considerarem relevante trazerem para a tempestade cerebral que está por vir.

4. Brainstorming

Muitos insights, conversas, reuniões presenciais ou videoconferências, a fim de iniciarem o caminho para uma proposta consistente sobre como a questão principal será respondida e como chegarão a uma resposta. Aqui cabe o uso de estruturas já consagradas como o Design Thinking, Design Sprint ou Moonshot Innovation Learning.

Uma forma de organizar esse troca de ideias pode ser feita por meio de outra metodologia ativa de ensino: o Think, Pair, Share. Esse método consiste em três passos: cada aluno, individualmente, anota o que ele entendeu sobre o que precisa ser resolvido e o que pode ser compreendido dos materiais enviados pelo professor. Depois, cada aluno deverá conversar com mais um ou dois colegas da sua equipe a fim de ouvir o que o colega entendeu e descobriu nos materiais prévios e, também, deve expressar o seu ponto de vista sobre tudo isso. Ambos precisam anotar tudo o que foi conversado de relevante. Deverá ser anotado o que foi dito pelo outro e que complementou aquilo que já tinha sido descoberto sozinho. E por fim, presencialmente ou por meio de uma vídeoconferência, os alunos devem compartilhar tudo o que foi entendido e explorado. É uma estratégia bastante ativa!

5. Escolha do Aluno

Aqui o tão falado protagonismo do aluno fica evidente. Os alunos é que decidirão o que fazer, apresentar, prototipar e construir para apresentar e defender a resposta encontrada para o problema que está sendo resolvido nesse projeto.

6. Artefatos

São todos os elementos produzidos pelos alunos e que deverão ser entregues. São os itens que foram criados ao longo de toda a execução do projeto e que levaram os alunos a construírem uma resposta para o problema inicial. São exemplos de artefatos: portfólios, vídeos, podcasts, cartazes, banners, websites, artigos, músicas, poemas, jornais, aplicativos, protótipos em impressão 3D ou cortadora a laser, história em quadrinhos, entre outros.

7. Defesa do Projeto

Exposição oral dos alunos pertencentes às diversas equipes. Presencial ou via web. Aqui a resposta ao problema inicial deve ser apresentada com clareza e, além disso, os alunos precisam compartilhar o que foi aprendido ao longo de todo o projeto. Esse momento deve acontecer com boas doses de interferência do professor no que se refere a realizar perguntas, questionar e extrair dos alunos o máximo de elementos que foram explorados, aprendidos e usados para a resposta ao problema da questão motriz, origem de todo o projeto.

8. Rubricas

As rubricas são usadas para estruturar a experiência de ensino e para avaliar os diversos artefatos entregues pelos alunos. O uso da rubrica permite ao professor criar e sistematizar critérios e indicadores que o ajudarão avaliação do que foi feito, reduzindo uma possível subjetividade ao compor a nota ou conceito do aluno. Sendo assim, a rubrica funciona como instrumento formal de avaliação. Algo bastante inovador seria envolver os alunos no processo de construção desse instrumento. A elaboração dessa espécie de check-list, com a participação de todos, também faz parte do aprendizado. Rubricas em forma de tabelas e gráficos coloridos, e com espaços para observações, costumam ser bastante úteis e visualmente agradáveis.

Cabem aqui mais duas sugestões para a construção de toda essa trilha de aprendizagem:

9. WebQuest

A partir do momento que o professor percebe a movimentação e envolvimento dos alunos em seus projetos, ele pode elaborar questões relativas ao conteúdo do próprio projeto. Algo que seja dinâmico e via Web. No formato de quis, por exemplo, fica bem interessante. Sugiro aqui as plataformas Socrative e Kahoot, bem como os Google Forms com as devidas parametrizações para correção automática. Essas três opções são simples, fáceis de programar e geram um banco de dados bem interessantes para o professor.

10. O que pode ser melhorado?

Essa pergunta cabe tanto para os alunos quanto para o professor. O que poderia ter sido feito diferente para que o resultado fosse melhor. Em que podemos inovar, surpreender e impactar nos próximos projetos? As respostas encontradas realmente resolveram o problema inicial? Pode ser aplicada para outras situações? O conteúdo aprendido pode ser transferido para outros problemas reais que já existem ao seu redor? Nesse ponto o pensamento crítico merece um bom exercício!

Ufa! Quanta coisa incrível não é mesmo? É possível perceber, após tudo o que foi colocado até aqui, que esse tipo de aprendizagem, exige que os alunos trabalhem em equipes, formando verdadeiros Team Works e de forma bastante colaborativa. Espera-se que eles criem significado para os conteúdos a partir do caos e do excesso de informações existentes nos diversos canais de acesso aos assuntos e temas abordados no projeto. Diante dessa superabundância e com a adequada mediação do professor, é possível os alunos se articularem e apresentarem uma solução para a questão motriz de forma criativa e eficaz.

Em uma Sociedade 5.0, também chamada de Sociedade Superesperta, onde as mídias digitais permitem uma comunicação instantânea e há informação quase ilimitada na internet, defendo que a Aprendizagem Baseada em Projetos é uma metodologia que ajuda a impulsionar a construção do conhecimento que todo aluno no mundo de hoje precisa dominar.

Sabemos que, para resolver as grandes questões da educação no século XXI, não há cartilhas prontas. Porém, há relatos e evidências sólidas de que, tudo o que foi apresentado aqui nessa reflexão é um caminho possível e real para uma grande transformação. Faz-se necessário ousar, testar, acertar e errar, aprender e ressignificar. A educação é um movimento feito a várias mãos. Porém, essas mãos precisam se mexer constantemente.

E como eu digo sempre: que esse mexe e remexe não demore muito pois, O Futuro é Agora!

*Texto escrito pelo Professor José Motta, engenheiro, gestor educacional, especialista em Principles of Technology, Mestre em Tecnologias Emergentes em Educação e Consultor em Metodologias Ativas de Ensino, Inovação Educacional e Tecnologias Educacionais. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no Blog Educação e Mídia.

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