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Em 2006 e durante o primeiro semestre deste ano organizei oficinas voltadas ao público infantil, de 7 a 12 anos. Para atrair os pequenos participantes à leitura e à escrita adotei uma estratégia: a pesquisa oral sobre as brincadeiras de antigamente e o confronto com as de hoje, mais próximas para eles, tanto na prática, quanto na teoria. Foi muito interessante esse trabalho – e hoje quero compartilhar com os leitores essa experiência e também refletir sobre os rumos que estamos oferecendo à infância – época tão querida, inesquecível e decisiva à construção das pessoas de bem, de caráter e integras.

A pesquisa

A busca pelas informações foi oral. Pedi aos pequenos alunos que perguntassem aos pais quais as brincadeiras que participavam à época de criança. Vejam o que surgiu: futebol, basquete, ioiô, brincar de coleção, faz-de-conta, esconde-esconde, pião, soltar pipa, casinha, pular corda, miniaturas, comidinha, andar de bicicleta, cabo de guerra, carrinhos, bolinha de gude, futebol de botão, pingue-pingue, roda e de boneca.

As crianças fizeram também uma lista com as brincadeiras atuais e logo descobrimos que alguns itens acima ainda continuam no gosto da meninada, mas outros foram incorporados à lista, tais como: jogos eletrônicos, andar de patins e de skate.

A descrição

Explicadas no caderno, através de descrições minuciosas, as brincadeiras foram uma após outra ganhando o espaço nas folhas. Como se brincava? Quais as regras? Além desse retrato detalhado as crianças prepararam ilustrações para todas as brincadeiras. O resultado foi um trabalho muito interessante, quase um livrinho artesanal e elas, só ao final, se deram conta de que estavam a trabalhar conteúdos de língua portuguesa, pois paralelamente a esse trabalho eu lhes oferecia o suporte teórico com a utilização das categorias gramaticais. Substantivos, verbos, adjetivos, pronomes, artigos, numerais, conjunções, advérbios e interjeições tiveram vez em todos os textos e passaram a ser entendidos, finalmente, na prática – e no texto!

Lembrei hoje- meu prezado leitor – dessa experiência ao perceber que as comemorações do dia da criança estão a todo vapor. O comércio já está assanhado e esquentando as vendas dos presentes, afinal o Dia das Crianças, não pode ficar sem comemoração, mas será que estamos realmente incentivando os nossos pequenos à vivência das brincadeiras? Não sou 100% saudosista, mas recordo do quanto nós, adultos, temos subtraído das nossas crianças o direito de brincar e ser uma criança feliz. Temos lhes imposto tantos encargos e tantas antecipações! Essa antecipação e precocidade da adolescência, marcada por atitudes pouco infantis deveria nos preocupar bastante. As meninas mais parecem pequenas moças, com saltos e roupas impróprias às brincadeiras e os meninos, afeitos às típicas atitudes de irreverência dos rapazes. Ao vê-los, assim, tão cheios dessa adolescência antecipada nos esquecemos de que são, ainda, crianças.

As descrições

Sobre brincar de esconde-esconde o Eder, 11 anos escreveu o seguinte: “É uma brincadeira muito divertida. Enquanto alguém conta de 1 a 10, o grupo se esconde. O desafio é encontrar os integrantes do grupo, antes que todos cheguem ao ponto de encontro. Podemos brincar de esconde-esconde em casa, na praça ou no mato, quando estamos no sítio ou no interior das cidades. Eu acho bacana essa brincadeira, porque nos ensina estratégias de fuga.”

A Carol, de 10 anos, declarou sobre brincar de boneca: “Adoro brincar de boneca. Tenho um monte. De todos os tamanhos. Eu fico trocando as roupas delas e brinco, às vezes sozinha ou com minhas colegas, vizinhas de casa. Fazemos com que elas tenham vida e emprestamos as nossas vozes para elas, assim vamos imitando um pouco a vida real.”

O Patrick( de 12 anos) disse gostar de brincar de faz- de-conta e começou assim: ” É uma brincadeira que fingimos ser coisas ou pessoas que queremos ser. É legal brincar de faz-de-conta, porque somos o queremos ser. Usamos a nossa imaginação e podemos ser o ladrão, a polícia, imitar lutinhas ou mesmo brincar de super-heróis.”

De que brincam as crianças que você conhece?

Não sei se você, meu querido leitor, convive com crianças, mas na rua onde fica a minha Casa da Linguagem apenas a minha filha, de 12 anos, é a única menina existente. Nas demais moradias, só adultos. Vez por outra recebo alunos, ainda crianças – e parece que a vida entra com mais ânimo com a chegada desse pequeno bando ruidoso, alegre. No pequeno espaço ajardinado deixo que brinquem um pouco durante um curto intervalo. Brincam de bola, de mini-golfe, de bolinha- de- gude, de boliche e outras que inventamos. Muitas dessas crianças não brincam mais em casa. Umas porque não têm tempo para brincadeiras, pois vivem ocupadas com tantos encargos e cursos no turno contrário ao da escola; outras por falta de espaço e ainda algumas por se sentirem constrangidas em se mostrar ainda como crianças entre os colegas de sala. Ser criança parece “pegar mal”; é preciso agir como “mocinha” ou um “rapaz”. Que coisa maluca…

Se você tem crianças em casa, por favor, deixe-as brincar enquanto ainda há tempo para que vivenciem a infância. Não lhes subtraia esse direito e nem lhes ofereça como primeira opção os jogos eletrônicos, pois ela ficará tão dependente e não achará graça alguma em jogar bolinha-de-gude ou mesmo soltar pipa, brincar com bonecas ou ainda jogar boliche com os amigos.

A minha infância

A rua da minha infância está ainda cheia de crianças. Ela não tem saída, só entrada. Lá ainda é possível empinar pipa, correr em pega-pega, brincar de queimada, subir em árvore e algumas meninas ainda brincam de roda e as vezes desfilam com as suas Barbies, Polys e Susis ; as calçadas e os jardins recebem cadeiras à noitinha, onde se cumpre um ritual de apreciar as primeiras horas da noite, mesmo que das casas venha aquele ruído de novela das sete ou qualquer coisa parecida. Essa rua é quase real – e se não é de todo assim é porque adultos como nós têm retirado da infância o direito de ser infância, simplesmente.

Sugestões para melhor viver o Dia das Crianças:

1- Leve as suas crianças aos parques desta querida Curitiba – e brinque com elas. Não esqueça da bola, da corda de sisal e outros apetrechos divertidos.

2- Fuja de lugares fechados, tais como shoppings, cinemas e espaços de lazer cobertos; aproveite o dia ao ar livre.

3- Organize um dia para elas na cozinha;faça um bolo comemorativo.

4- Reveja fotos da família e conversem bastante sobre o que lhe interessava quando criança.

5- Tire os brinquedos do armário e redescubra com as crianças a alegria de simplesmente brincar com eles – e faça com que todos fiquem muito, muito cansados de tanto brincar.

6- Não esqueça de fotografar esses momentos;eles poderão ser os últimos dessa fase.

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