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Meus Malvados Favoritos ®
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O malvado favorito voltou. Após longo e tenebroso inverno, o ex-presidente da Câmara e artífice do impeachment de Dilma Rousseff, Eduardo Cunha, está de volta ao jogo político. Liberto do jugo da operação Lava-Jato — tornada pecado mortal no vocabulário político nacional — Cunha aparece serelepe no Twitter comentando sobre o Flamengo, sua velha paixão, e tecendo loas ao presidente Bolsonaro, sua nova namoradinha.

A rápida percepção por parte do emedebista de que o presidente é um tapado político, um bufão microfonado que entrega o essencial do seu governo ao rebotalho do congresso — Lira à frente —, é sinal não apenas da rápida deterioração moral do atual governo, mas do estado de abandono que a presidência da república transmite aos demais agentes políticos do país.

O primeiro a perceber a fraqueza do presidente e a incrível submissão de seu eleitorado fiel foi o ex-mensaleiro Roberto Jefferson, presidente do PTB. Precursor no cargo de "Malvado Favorito”, o petebista compreendeu que o uso de retórica absurda somado à defesa inconteste do presidente rende não apenas votos, mas militância ativa e acrítica. 

Jefferson ocupou o papel de anti-herói na mitologia bolsonarista, o famoso ex-inimigo que busca purgar seus pecados utilizando-se de suas habilidades obscuras à serviço do “lado correto”. Ganhou militância ferrenha, passou a articular o projeto nacional de Bolsonaro para 2022 e negocia com ares de enxadrista o partido que irá abrigar o atual presidente no próximo pleito.

Perceba: em condições normais de temperatura e pressão, Bob Jeff seria apenas mais um cacique de legenda decadente no cenário político nacional. Não teria forças para pleitear ministérios ou sequer participar com altivez do debate público. O instinto de sobrevivência que lhe fez perceber as fraquezas políticas do presidente permitiu ao mensaleiro alçar vôos inimagináveis para seu tamanho. E não parou aí! Com eloquência invejável, tornou-se metralhadora de besteirol — mais bolsonarista que o próprio presidente —, angariando apoio nas hostes mais radicais da militância governista. Precisa chamar ministro do STF de “boca de veludo”? Roberto Jefferson lá estará. Precisa pedir golpe militar? Conte com o presidente do PTB.

Bob Jeff, obviamente, possui limitações nas entregas que pode oferecer. Não seria ele a garantir governabilidade ao presidente, tampouco trânsito com STF ou empresariado. Esta posição foi ocupada, duplamente, pelos dois Malvados Favoritos mais poderosos do universo expandido: o ministro do STF, Dias Toffoli, e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira.

Ambos operam a linha tênue de atuação do presidente, entre o livramento de seu filho e sua viabilização eleitoral; ambos exercem efeitos diferentes dentro da militância, seja no silêncio com Dias Toffoli, seja nos elogios pragmáticos para Arthur Lira.

São estes dois, em bom português, que mantém Bolsonaro vivo em meio ao incêndio institucional por ele conduzido. São os barqueiros do inferno, nos carregando para o colo de Lula, sob os auspícios do presidente “anti-sistema” e “conservador”. Bolsonaro, ao seu modo, não quer saber. A eles se entregou — nos entregou — pois com eles seus destinos óbvios, o impeachment e a cadeia, não são tão óbvios assim. Ossos do ofício.

Mas não termina aí. Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, foi por semanas um queridinho do bolsonarismo nas redes. Seu antecessor, Davi Alcolumbre, converteu-se em articulador do tratolão e conta com fiel rebanho na região norte do país. Foi de “Batoré” para “viabilizador de reformas”(reformas?) em questão de meses. E quer saber? Certo — dentro desta lógica — está ele. Político da velha estirpe, pretende sugar o que puder da carcaça do ex-governo. Já não é parasita, mas abutre. 

Num cenário em que tais figuras se fazem donos do Brasil, Eduardo Cunha vê apenas planícies desocupadas. Todos os homens aqui listados foram, cada um à sua maneira, ferramentas do Malvado Favorito® entre 2014 e 2016. Seu aceno a Bolsonaro, antes de tudo, é um pedido de convocação para liderar a massa de malfeitores que administram seu governo. É o papel de gestor qualificado de abutres, de primus inter pares entre fisiológicos, que Eduardo Cunha almeja em seu retorno à política.

O cálculo é simples. Os arranjos políticos para 2022 apontam certa construção de consensos ao redor da candidatura de Lula — especialmente no Nordeste — e uma fragmentação de apoios entre os nomes que disputam a terceira via (e a vaga de Bolsonaro). Ao presidente restam duas coisas: franquear seu apoio ideológico em candidatos puro-sangue ao redor do Brasil, e dinheiro, obras e tratores aos aliados favoritos nas legendas que pretende cooptar.

É isso que interessa seus malvados, e é nisso que Cunha se encaixa. Fora ele, anteriormente, o hábil administrador de baixo clero a derrotar a máquina petista pela presidência da Câmara. Imagine este homem com a chave do cofre do governo?

Aguardem as cenas dos próximos capítulos. Bolsonaristas estão prontos para se apaixonar, e Cunha é o amante perfeito. Só nos resta acompanhar a ciumeira dos Bob Jeffs país afora, obsoletos que ficarão diante da provável aproximação do galante emedebista. Será Cunha a engoli-los e administrá-los caso Bolsonaro tenha um pingo de inteligência.

Cara de pau — outra qualidade fundamental para o casamento — já sabemos que ele tem.

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