Valor cobrado para fazer o boletim de ocorrência é pagar taxa em dobro, reclamam condutores| Foto: Felipe Rosa/Tribuna do Paraná

Quando se envolveu em um acidente de trânsito na noite de 19 de junho deste ano, a corretora de seguros Kellen de Barros Borges, 37 anos, não imaginava que teria tanta dor de cabeça para resolver as questões burocráticas relacionadas à colisão, que trouxe prejuízos materiais, mas não teve vítimas. Para conseguir dar entrada no seguro e iniciar o conserto de seu carro, a primeira providência tomada por ela foi registrar um boletim de acidente de trânsito. E foi justamente no momento de emitir o documento que a motorista teve uma ingrata surpresa: a cobrança de uma taxa pelo boletim de ocorrência, que no Paraná é emitido desde 2012, pelo sistema Boletim de Acidentes de Trânsito Eletrônico Unificado (Bateu).

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Leia: 5 razões pelas quais você deve registrar um boletim de ocorrência

“Eu me senti lesada de várias formas, pago meus impostos em dia e ainda tenho que pagar por um boletim de ocorrência, isto é como pagar duas vezes pelo mesmo serviço! Você tem que preencher o B.O. – que exige vários dados e ainda imprimir a guia de pagamento, além de ter que ter acesso à internet. Eu trabalho em um banco e tive ir a outro, para o pagamento da guia. Logo após o acidente, liguei no 190 e eles me orientaram desta forma, que o boletim teria que ser feito pelo Bateu. Na hora até passou uma viatura, que poderia ter resolvido tudo na hora, mas isso não aconteceu. Por não ter vítimas, recebi apenas orientações do policial”, reclama Kellen.

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Como fazer

Para fazer o Boletim de Acidentes de Trânsito Eletrônico Unificado (Bateu), o motorista pode acessar o site. Já a Secretaria de Acidentes de Trânsito do BPTran fica na rua Professora Antonia Reginato Viana, 411, no Capão da Imbuia.

Ter o boletim de acidente de trânsito permite ao motorista e aos envolvidos o acionamento do seguro do veículo, solicitação do Seguro DPVAT (Danos Pessoais causados por Veículos Automotores em vias Terrestres) e a documentação do fato para fins processuais, como nos casos em que há a cobrança dos danos na justiça. Atualmente, os valores cobrados no Paraná para o registro de acidentes de trânsito são de R$ 93,68 quando há vítimas e presença no local de uma viatura do Batalhão de Polícia de Trânsito da Polícia Militar (BPTran), e de R$ 65,57 quando não há feridos e o próprio motorista relata o ocorrido no site do Bateu, como aconteceu com Kellen.

No entanto, segundo o consultor especialista em trânsito Hugo Gabriel Xavier, a cobrança desta taxa é abusiva. “Qual é a origem desta taxa? Registrar a ocorrência é um direto do cidadão. E seu eu não tenho estes recursos? A impressão é que o motorista teve a intenção de causar o acidente. Isto é um pagamento vexatório. Qual é o trabalho ou os funcionários empregados no atendimento ao público pelo Bateu, no caso de acidentes sem vítimas, já que o próprio usuário lavra e imprime o B.O. Se for para ser cobrado, poderia ser um valor simbólico. E para onde vai este fundo?”, questiona Hugo. Ainda segundo ele, poucos estados brasileiros cobram por este serviço, entre eles, o Paraná e o Espírito Santo.

Outra dúvida apontada por Xavier é sobre as competências do Detran Paraná na cobrança por um serviço que é prestado pela Polícia Militar do Paraná, por meio do BPTran. “A atuação do Detran está ligada a questões de habilitação e de veículos. Não há serviços prestados por eles relacionados a acidentes de trânsito. Qual é a responsabilidade do Detran, já que o BPTran órgão do estado responsável pelo trânsito?”, indaga.

Parceria

De acordo com o soldado Edivaldo da Coordenação do Sistema Bateu do BPTran, a cobrança pelo boletim de acidente de trânsito acontece graças a um convênio firmado entre a Polícia Militar e o Detran Paraná. Assim, a PM executa os serviços relacionados aos acidentes de trânsito e o Detran recolhe e administra as taxas devidas, que são reajustadas anualmente. Condição que segundo o soldado que está prevista nas Leis estaduais 11.019 de 1994 e 16.943 de 2011.

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Com o Bateu, de acordo com ele, há três tipos de registros de acidentes. “Um deles é feito no local com acidente com feridos, feito por policiais, com perícias técnicas. O outro, feito na secretaria, no próprio BPTran e por último, o feito pela internet, pelo condutor”, diz. E quando há acidentes, ele esclarece que a prioridade de atendimento dos policiais é para as situações com vítimas. “Nestes casos, é feito o detalhamento e documentação do ocorrido, com croqui e análise de informações, já que a situação costuma envolver seguradora, seguro DPVAT, poder judiciário”.

Benefícios

“O registro pela internet por meio do Bateu facilita a vida do usuário. Após o pagamento da Guia de Recolhimento do Detran (GRD) o envolvido tem acesso virtual e imprime pelo próprio site, em qualquer lugar, sem ter que se deslocar. Também é possível emitir a segunda via do documento ou retificar as informações, sem custo. E todas estas informações ficam em um banco de dados, que pode ser acessado depois”, defende soldado Edivaldo.

Para o tenente Veiga do BPTran, a orientação é sempre fazer o boletim de ocorrência. “Você vai precisar deste boletim para questões de seguro, então, é interessante que o motorista faça”. E, se a pessoa tem dificuldade ou não tem computador, ele confirma que é possível se dirigir diretamente ao BPTran. “Com a vigência do Bateu, o sistema online, conseguimos colocar mais policiais na rua. Mas nós mantemos ainda certo número de policiais para atendimento ao público, justamente para este tipo de pessoa que não tem familiaridade com o computador, ou que não tem o computador e então procura o BPtran para fazer este boletim. No caso do interior ou região metropolitana, é possível procurar uma unidade da Polícia Militar”.

Para onde vai o dinheiro?

Questionado sobre os recursos arrecadados com confecção dos boletins de ocorrência pelo sistema Bateu, o Detran Paraná divulgou que, entre janeiro e junho de 2017, entraram nos cofres do órgão R$ 833.344,76. Com relação a legalidade das taxas cobradas, o Detran limitou-se a informar que elas são relacionadas aos serviços prestados.

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Sobre a destinação dos valores, o Detran informou que todas as taxas arrecadadas são repassadas da seguinte forma: 30% do valor é destinado para o Tesouro Estadual (DREN – Decreto 5158/2016). Os 70% restantes são divididos em: 40% para o Fundo Especial de Segurança Pública do Estado do Paraná FUNESP – Lei 16.944/2011) + 15% ao Departamento de Estadas e Rodagens DER – conforme Lei Orçamentaria Anual LOA. O saldo restante fica ao Detran para custeio das atividades.