Bolsoanro deseja pagar um auxílio de R$ 400 para as famílias carentes em 2022, ano eleitoral, e determinou que o ministro Paulo Guedes encontre espaço no Orçamento: saída será mudar correção do teto de gastos| Foto: Julio Nascimento/PR
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Os últimos dias têm sido de tensão no Palácio do Planalto. As alas política e econômica do governo de Jair Bolsonaro têm quebrado a cabeça para encontrar uma forma "legal" de financiar o programa Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família — tido como carro-chefe para o presidente em 2022, ano de eleição.

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A solução mais recente, apresentada nesta quinta-feira (21) e incluída no relatório da PEC dos precatórios, é mudar a fórmula de correção do teto de gastos, que hoje é a inflação medida pelo IPCA acumulado em 12 meses até junho do ano anterior ao de sua vigência. A ideia é adotar a correção de janeiro a dezembro. Isso, aliado à limitação do pagamentos de precatórios previsto pela PEC, abriria um espaço fiscal de R$ 83 bilhões no Orçamento de 2022.

O martelo foi batido um dia após o ministro da Economia, Paulo Guedes, falar em "furar" o teto para viabilizar o programa, uma declaração que foi muito mal recebida pelo mercado financeiro e, por consequência, afetou os indicadores econômicos.

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Do jeito que está hoje, o cobertor é curto para tirar do papel um auxílio de R$ 400, conforme deseja o presidente da República. O cenário econômico no país é desfavorável e não há espaço no Orçamento de 2022 para aumentar o aporte financeiro ao programa de modo considerável. Para piorar o cenário, Bolsonaro cogitou nesta quinta incluir os caminhoneiros autônomos entre os beneficiários do novo programa, que irá substituir o Bolsa Família.

Veja a seguir o que se sabe sobre o financiamento do Auxílio Brasil de R$ 400 e como ele afeta o teto de gastos:

O que se sabe até agora sobre o valor a ser pago pelo Auxílio Brasil?

A intenção do governo é elevar a média do tíquete-médio pago pelo Bolsa Família, de R$ 189, para, "no mínimo", nas palavras de Bolsonaro, R$ 400. Não está claro, contudo, se o valor será a média ou o piso do benefício. Procurado, o Ministério da Economia não respondeu aos questionamentos da reportagem.

O governo também anunciou um reajuste de 20% no montante médio hoje pago no Bolsa Família que, com isso, saltaria para R$ 226,8. O reajuste não se dará em cima de um valor unitário, mas sobre a execução de todo o programa permanente. Apenas essa parte seria contabilizada dentro do Orçamento.

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Para chegar aos R$ 400, o governo estuda criar um benefício temporário, com vigência até dezembro de 2022, e que tem sido chamado de "renda básica familiar". Fazendo isso, o Executivo também obedeceria à ordem do Supremo Tribunal Federal (STF) para que o governo cumpra, obrigatoriamente a partir do ano fiscal de 2022, a Lei 10.835/2004, aprovada há 17 anos, mas nunca regulamentada.

A decisão do STF determina que o governo crie e execute uma política de transferência incondicional de renda básica para o estrato da população brasileira em situação de vulnerabilidade (extrema pobreza e pobreza). A lei é de autoria do ex-senador e atual vereador de São Paulo Eduardo Suplicy (PT).

Quem será atendido pelo programa?

O Auxílio Brasil, com previsão de início em novembro deste ano, deve atender famílias em condição de pobreza e extrema pobreza. Atualmente, 14,7 milhões de famílias são beneficiárias do Bolsa Família. A expectativa do governo é aumentar esse número para 17 milhões com o Auxílio Brasil. O governo também pretende zerar a fila de espera do Bolsa Família até dezembro de 2021.

Nesta quinta-feira, o presidente Jair Bolsonaro disse em discurso no interior de São Paulo que decidiu pagar uma "ajuda" a cerca de 750 mil caminhoneiros autônomos. Seria uma forma de compensar os trabalhadores pela alta no preço do diesel, por exemplo. A categoria está em estado de greve desde o último sábado (16) e pode paralisar suas atividades a partir do dia 1º.

Bolsonaro não entrou em detalhes nem revelou de onde sairão os recursos para a ajuda, mas, segundo reportagem do Valor, a intenção é incluí-los no Auxílio Brasil, pagando o benefício de R$ 400 até dezembro de 2022. Nesse caso, se todos os 750 mil forem beneficiados, haverá uma despesa orçamentária adicional de R$ 3,6 bilhões em 12 meses.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]

Qual será a fonte de recursos para financiar o programa?

Até a manhã desta quinta, não havia resposta clara quanto à fonte de financiamento do Auxílio Brasil. Sabia-se que parte dela seria contabilizada dentro do Orçamento, e o governo contava com a aprovação da PEC dos precatórios para isso.

A proposta, que prevê o parcelamento das dívidas da União, liberaria um espaço no Orçamento, permitindo ao governo direcionar recursos para o programa social. Os precatórios em 2022 diminuiriam de R$ 89 bilhões para cerca de R$ 40 bilhões.

A PEC está em discussão em uma comissão especial na Câmara dos Deputados e deve ser colocada em votação ainda nesta quinta-feira. O parecer apresentado pelo relator, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), indicou a nova fonte de recursos com a proposta de mudança na forma de correção do teto de gastos.

O orçamento destinado ao Auxílio Brasil em 2022 é de R$ 34,7 bilhões, ligeiramente inferior aos R$ 34,9 bilhões programados para o Bolsa Família em 2021. Até o fim do ano, o governo deve enviar ao Congresso Nacional uma mensagem modificativa para alterar os valores.

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O que sugere Guedes?

A fim de viabilizar maior orçamento para o programa, o ministro Paulo Guedes já havia defendido recentemente a antecipação da revisão do método de correção do teto de gastos, prevista para 2026. Na prática, em vez de utilizar como referência o IPCA, ou seja, correção pela inflação acumulada em doze meses até junho, o governo consideraria a inflação acumulada de janeiro a dezembro. Esse movimento permitiria um maior aporte ao programa Auxílio Brasil, já que a inflação disparou nos últimos meses.

O titular da Economia também aventou pedir "waiver", uma espécie de licença para furar o teto, de cerca de R$ 30 bilhões. Na prática, trata-se de uma renúncia da regra do teto de gastos, e permite que o governo gaste mais do que é previsto no teto de forma temporária. Mas essa ideia acabou ficando para atrás com a proposta de mudança na correção do teto.

A ideia inicial da equipe econômica era financiar o programa, em parte, por meio de um espaço no teto que pode vir com a aprovação da PEC dos precatórios, que autoriza o parcelamento dessas dívidas, e outra parte através da reforma do Imposto de Renda, já aprovada na Câmara dos Deputados. Mas a reforma do IR enfrenta resistências no Senado e não há garantias de que será aprovada.

O que é o teto de gastos?

O teto de gastos entrou em vigor em 2017, sob a gestão do ex-presidente Michel Temer, por meio da Emenda Constitucional (EC) 95. Trata-se de uma regra que limita o crescimento das despesas públicas à inflação (IPCA), registrada em 12 meses até junho do ano anterior.

Quando aprovado, estabeleceu-se que o teto teria vigência até 2036, podendo o presidente da República, por meio de projeto de lei, revisar o método de correção do Orçamento em 2026.

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A PEC estabeleceu que sempre que as despesas obrigatórias da União superarem 95% da despesa total sujeita ao teto de gastos, alguns gatilhos de contenção, para evitar descontrole fiscal, serão automaticamente acionados.

Furar o teto é ruim?

Sim. Uma vez que a regra é tida como a principal âncora fiscal do país, toda vez que gestores ameaçam descumpri-la, o mercado financeiro reage mal. Na prática, investidores estrangeiros acabam retirando o investimento no país e aberturas de capital são paralisadas, por exemplo.

Nesta quinta, após Guedes defender antecipar a revisão do teto e pedir uma licença para furá-lo e emprestar R$ 30 bilhões, o dólar comercial abriu em alta, R$ 5,659 — maior valor dos últimos seis meses. Às 9h48, era cotado em R$ 5,632. O Ibovespa caiu mais de 3%.

Em evento na terça-feira (19), o presidente Jair Bolsonaro afirmou que não haveria "furo no teto" quanto ao pagamento do Auxílio Brasil. “Temos a responsabilidade de fazer com que esses recursos venham do próprio Orçamento da União. Ninguém vai furar teto. Ninguém vai fazer nenhuma estripulia no Orçamento", disse o chefe do Executivo.

João Roma, ministro da Cidadania, reforçou o argumento, dizendo que a equipe não está aventando que o pagamento do benefício se dê através de "crédito extraordinário" e que o governo está "buscando dentro do governo todas as possibilidades para que o atendimento às famílias siga de mãos dadas com a responsabilidade fiscal".

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