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Montadoras estão entre os setores tradicionalmente beneficiados com renúncias fiscais.
Montadoras estão entre os setores tradicionalmente beneficiados com renúncias fiscais.| Foto: Volkswagen/Divulgação

É fácil criar, mas difícil acabar com elas. A máxima é recorrente em Brasília para explicar por que o governo não consegue cortar as renúncias tributárias – uma montanha de dinheiro que retira, todos os anos, 4% do PIB dos cofres públicos. Para 2021, a previsão do Orçamento é de perda de arrecadação de R$ 307,9 bilhões com isenções tributárias e benefícios financeiros e de crédito. Incluída na PEC Emergencial, a redução das renúncias é apontada como uma medida de contrapartida para ampliar a rede de proteção social pós-auxílio emergencial – que será pago só até este mês.

A proposta é ousada: cortar nos próximos cinco anos o que levou 15 anos para montar. Em 2005, os chamados subsídios tributários estavam em 2% do PIB. Bateram a marca de 4,5% no biênio 2014-2015, caíram para 4,2% do PIB em 2019 sem nenhuma mudança significativa, apesar do discurso de parlamentares e autoridades do governo de que é preciso diminuir esses benefícios – a maior parte deles apontada como privilégios para setores e grupos específicos de contribuintes.

Antes mesmo de o relatório do senador Márcio Bittar (MDB-AC) ser protocolado oficialmente, a proposta já enfrenta resistências. O parecer encaminhado pelo senador aos colegas na semana passada deixava de fora da tesourada as renúncias com o Simples, a Zona Franca de Manaus, os fundos regionais e produtos da cesta básica. Na sexta-feira, depois de pressão dentro e fora do Congresso, Bittar afirmou que deixará o relatório da PEC emergencial para 2021. A votação ficou para o ano que vem porque um dos pontos sem consenso é, justamente, a velocidade dessa tesourada. Um argumento contrário que vem ganhando força é o de que a retirada dos incentivos, na prática, forçaria um aumento dos impostos.

Apesar de sensível ao lobby dos setores, o Congresso encampou o discurso de rever subsídios ao ver nisso uma oportunidade de usar o corte de renúncias como forma de neutralizar a repercussão negativa que teria uma flexibilização no teto de gastos (que limita o avanço das despesas à inflação). O teto é considerado hoje uma superâncora de credibilidade de que o governo fará o ajuste nas contas.

“Com esse Congresso, isso não passa porque os maiores beneficiados dos privilégios estão lá. Eles não vão aprovar uma norma que vai tirar deles mesmos”, diz o presidente da Associação Nacional dos Auditores da Receita Federal (Unafisco), Mauro Silva. Para ele, os parlamentares vão tentar jogar essa conta para a classe média. “Eles vão querer tirar redução de despesas médicas, educação, aposentados. Esses não têm representação no Congresso”, diz Silva, que lançou o Privilegiômetro Tributário, ferramenta que aponta, no dia da consulta, o valor que governo deixou de arrecadar em razão da concessão de benesses tributárias.

Reforma tributária abrangente é melhor que atacar caso a caso, diz especialista

Para o presidente do Insper, Marcos Lisboa, a proposta de redução dos benefícios é uma “carta de intenções” porque, para reduzir cada um dos benefícios, será preciso propor e conseguir aprovar novas leis. Segundo ele, não há como cortar de forma linear as renúncias. Além disso, o economista lembra que ficaram de fora do relatório preliminar da PEC emergencial quase metade dos benefícios listados pela Receita como renúncias. Só o montante de que o governo abre mão em tributos do Simples e da Zona Franca de Manaus, que foram poupados no parecer, soma R$ 100 bilhões.

“A discussão de fundo é se vamos para um regime tributário com regras uniformes, comuns, em que as famílias com a mesma renda vão pagar a mesma tributação”, avalia Lisboa, que considera que o melhor caminho é buscar uma reforma tributária eficiente em vez de tentar reduzir tudo no caso particular. “Cada setor vai falar ‘primeiro começa com os outros e não comigo’”, afirma.

O governo constituiu em 2018 o Comitê de Monitoramento e Avaliação dos Subsídios, que lançou em maio do ano seguinte um plano formal de análise de políticas em vigor. Mais de um ano e meio depois, o comitê – que não tem poder para alterar as políticas – concluiu a análise de apenas dois programas: o Fies e as filantrópicas de educação. Nos demais casos, os relatórios ainda estão em elaboração.

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