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De um púlpito num centro paroquial no interior de Cuba, Roberto Veiga González e Lenier González Mederos se revezavam diante de 60 intelectuais e ativistas para falar sobre o valor do diálogo político, em outubro.

"Visões plurais podem coexistir", disse Veiga, advogado e ex-editor de uma revista que, com González, passou a representar uma nova abordagem, de menos confronto, para a política cubana.

Pode ser um caminho difícil de ser seguido em Cuba, onde o Estado há décadas sufoca o debate e onde o governo e seus opositores estão agudamente divididos.

"Nós, cubanos, somos inimigos da moderação", disse González, ex-jornalista, por telefone de Havana.

González, 33, e Veiga, 49, são tachados por alguns membros da oposição de serem excessivamente cautelosos. Mas seus esforços para conseguir dar voz aos cubanos renderam um forte apoio na minúscula sociedade civil cubana.

Eles são lideranças em uma cultura de debate ainda incipiente, mas que vem se arraigando nos últimos anos, em grande medida porque o presidente Raúl Castro permitiu um maior acesso aos celulares e à internet, além de revogar algumas restrições para viagens.

Trabalhando até recentemente como editores de uma revista católica, a dupla criou um espaço onde dissidentes, comunistas, artistas, exilados, blogueiros e acadêmicos podem discutir assuntos domésticos, tanto em artigos quanto em seminários realizados em um centro cultural católico no bairro da Havana Velha.

O novo projeto de González e Veiga, o Cuba Posible ―parte fórum, parte revista on-line, parte instituição de pesquisa, pretende fazer o mesmo.

A dupla carece da eloquência sarcástica de Yoani Sánchez, cujo blog Geração Y tem milhões de leitores, e da ousadia de alguns outros dissidentes. Eles defendem uma mudança política sem ruptura e mantêm certa distância dos adversários mais combativos dos Castro.

Ambos são católicos e dizem se alimentar da fé na busca por soluções.

Quando assumiram a revista católica "Espacio Laical", em meados dos anos 2000, Veiga e González decidiram mudar o foco da publicação para incluir ensaios de acadêmicos, economistas e cientistas políticos. Escreveram editoriais sobre a timidez das reformas econômicas do governo e as opções para uma transição para a democracia.

Veiga e González não são os únicos cubanos discutindo política. Publicações como a "Palabra Nueva", revista da Arquidiocese de Havana, têm exigido mudanças econômicas mais rápidas. A "Temas", uma revista cultural, há anos promove debates mensais abertos ao público.

O físico Antonio Rodiles ganhou projeção ao realizar debates e sessões de jazz que são transmitidos on-line sob o nome Estado de Sats ―atividade pela qual já foi preso mais de uma vez.

Ficar no meio-termo também pode ser perigoso.

González causou polêmica entre blogueiros e intelectuais no ano passado por defender, numa conferência em Miami, uma oposição leal ―que considere o governo como adversário, não como inimigo.

Walfrido López, crítico do governo que se mudou para os Estados Unidos há seis meses, disse que, apesar de reconhecer os esforços de Veiga e González, considera que a dupla é excessivamente tímida e deveria ter um relacionamento mais aberto com os dissidentes.

"Um espaço ou é livre e aberto, ou não é um espaço", disse por telefone.

Em maio, Veiga e González deixaram a "Espacio Laical" alegando divergências com "certos setores da comunidade eclesiástica".

A tempestade que se instalou foi um termômetro da popularidade deles: blogueiros e acadêmicos reagiram consternados, insinuaram que Veiga e González teriam "sido saídos" e questionaram o que a mudança significaria para a sociedade civil.

A reação surpreendeu Veiga e González e os convenceu de que valia a pena continuar o trabalho. Não que González goste particularmente de chamar a atenção.

"É bom ser parado na rua e cumprimentado por um artigo que você escreveu", disse.

"Mas, na verdade, somos muito tímidos."

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