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Plenário do Congresso Nacional.
Plenário do Congresso Nacional.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O sentido de um mandato é a representação democrática. Nós, políticos, não somos nós mesmos, mas a população que representamos. Não devemos ser prepostos de nossos próprios interesses, mas atender as necessidades reais de quem precisa do Estado. Não há a minha voz por ela mesma, mas as causas e a visão de mundo que a minha voz defende. Não são apenas as minhas ideias, mas os valores que motivaram os eleitores a me escolherem. Portanto, não sou eu; somos nós.

Mais do que atores individuais, somos instrumentos da política. Foi justamente por quebrar esse valor central – o da representação – que a política perdeu grande parte da credibilidade no Brasil. Quando eclodiram as manifestações de 2013, a sociedade reclamava exatamente disso. “Não me representam”, diziam as pessoas, e com toda a razão. Não há, para um parlamento ou um governo, recado mais duro, visceral e provocativo do que esse. Se perdemos a capacidade de representar, é porque antes perdemos a capacidade de ouvir, de unir, de agregar – e, principalmente, de liderar.

Os representantes precisam se reconectar à vida real – e, assim, aos representados

E quando os representantes perdem significação social, a própria democracia estará instabilizada. Quando me candidatei a deputada federal, depois de exercer um mandato como deputada estadual, tudo isso me veio à mente. Eu não queria merecer um voto apenas por descarrego, por obrigação de votar. Desejava que meu mandato encontrasse um sentido concreto para a representatividade.

Foi desafiada por essas reflexões que consolidei uma iniciativa pioneira no Brasil. Criamos o Você Decide, uma ferramenta para discutir lá no chão das cidades, próximo das pessoas, a destinação de parte dos R$ 11 milhões de reais das emendas individuais. Por meio desse projeto, realizamos encontros em 24 cidades do Rio Grande do Sul, envolvendo, em média, uma centena de pessoas em cada uma delas. Cerca de 2 mil pessoas foram consultadas. Como manda a boa representação, mais ouvimos que falamos, em um exercício pleno de cidadania e democracia.

Criamos um método, selecionamos prioridades e desenhamos um modelo de votação. Tudo muito claro, transparente e democrático. Sem fisiologismo, proselitismo ou privilégios. Foi uma experiência incrível e inovadora – de participação e de proximidade. Na era da tecnologia e do distanciamento, optamos pela presença, pelo olho no olho, pela troca em vez da entrega, pelo debate em vez da decisão individual.

Destaco algo muito especial: em três municípios – Erechim, Ijuí e Pelotas –, os projetos com a maioria dos votos solicitaram a construção de espaços para crianças e adultos com Transtorno do Espectro Autista. Um alerta que poderia passar batido se não fossem os encontros presenciais. A partir dessa provocação, nosso mandato ampliou a abordagem do autismo, e o tema passou a ter espaço permanente em minha atuação. É um tesouro dentre tantos que encontramos andando por este Brasil profundo – o das pessoas simples, que querem e precisam ser efetivamente representadas.

Tenho dúvidas se o atual corpo parlamentar compreendeu bem o que significa a atual crise de representação. Mas não podemos desistir de evoluir e de buscar essa reaproximação com a sociedade. É o que os brasileiros esperam de nós. A experiência do Você Decide é uma resposta concreta a um problema concreto. Vejo como um ponto de partida: os representantes precisam se reconectar à vida real – e, assim, aos representados.

Liziane Bayer é deputada federal (PSB/RS).

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