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Região da Estrada do Colono, em registro de junho de 2013.
Região da Estrada do Colono, em registro de junho de 2013.| Foto: Christian RIZZI / Arquivo Gazeta do Povo

De iniciativa do deputado federal Assis do Couto, o Projeto de Lei 61/2013 almeja modificar o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. Com a alteração, haveria uma nova modalidade de unidade de conservação: a estrada parque. Tida como uma via de acesso dentro de uma unidade de conservação, ela promete integrar o homem à natureza, mas é uma ideia equivocada.

A captura das áreas públicas por interesses privados é revelada no artigo 2º do projeto, ao determinar a criação da Estrada Parque Caminho do Colono no Parque Nacional Iguaçu. Trata-se de tentativa de reabertura do histórico Caminho do Colono.

A referida passagem teria sido implementada na década de 1920 e operado até 1986, quando o Ministério Público Federal buscou a interdição da estrada por intermédio de Ação Civil Pública. A cautelar deferida foi posteriormente confirmada em sentença, ratificada no acórdão do Tribunal Regional Federal (TRF) e mantida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em abril de 2020, a decisão que determinou o fechamento transitou em julgado. Dessa forma, o PLC 61/2013 pretende a um só tempo criar uma espécie de unidade de conservação, instituir a primeira delas na Estrada do Colono e modificar as condições jurídicas sobre as quais decidiu a Justiça brasileira.

Justamente pelo longo histórico processual, repleto de perícias, estudos técnicos e audiências, há hoje amplo material sobre os efeitos ocasionados pelo funcionamento da Estrada do Colono. A Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) debruçou-se detidamente sobre cada espécie de impacto em nova Nota Técnica divulgada no final de maio de 2022, um ponto, porém, merece destaque: o prejuízo econômico resultante da nova empreitada contra o meio ambiente.

Como colocado na justificativa institucional do projeto de lei, a reabertura da Estrada do Colono almeja a resolução de um problema de logística, supostamente favorecendo a agricultura da região e contribuindo para as relações comerciais do Centro-Oeste e Sudeste. O raciocínio está equivocado.

A perícia realizada no bojo do processo judicial de fechamento do trecho foi categórica ao concluir que, após a interdição da passagem, o desenvolvimento regional foi semelhante ao que ocorria até então, evidenciando a não-essencialidade da Estrada do Colono para a região.

Relativamente à importância logística da área, a alegação está novamente afastada das evidências. O desenvolvimento estratégico das rotas paranaenses é calculado pelo Plano Estadual de Logística e Transportes do Paraná (PELT).  Atualmente na edição 2018-2035, o plano estadual despreza a exploração da eventual rota. Disso se concluiria que a abertura possui efeitos econômicos nulos. Há, no entanto, mais prejuízos que agravam a negatividade da medida.

Ainda em 2014, quando houve mais uma tentativa de reabertura da estrada, a Unesco alertou o Brasil que a atitude implicaria perda do título de patrimônio natural mundial ao Parque Nacional do Iguaçu. A derrogação do certificado, para além de sinalizar o prejuízo ambiental, reflete gravemente na demanda turística propiciada pelas paisagens da região. Igualmente, muitos municípios que dependem de repasse de ICMS ecológico sentiriam impactos refratários ao desenvolvimento local.

Uma possível reabertura da Estrada do Colono também seria motivo de alerta para as autoridades policiais. A antiga passagem era utilizada para tráfico internacional de drogas e armas, que encontram na proximidade com a tríplice fronteira um ponto de escoamento estratégico. Ao lado da alta criminalidade, o circuito era ainda eixo do contrabando e descaminho. Com o aumento do fluxo de pessoas na área, também cresce a criminalidade ambiental. Valendo-se da rica flora local, a medida atrairia caça e pesca predatória, além do tráfico de animais.

Não se trata de futurologia. A identidade entre a ampliação de estruturas rodoviárias e o agravamento dos impactos ambientais no entorno é amplamente documentada. A título de exemplo, estudos da região amazônica apontam que cerca de 95% do desmatamento da Amazônia ocorre em um raio de 5,5 km das estradas ou a 1km dos rios.

Finalmente, o impacto hídrico do desenvolvimento local assusta – ou deveria assustar – a produção agrícola. A preservação dos remanescentes da Mata Atlântica previne a escassez hídrica e a desertificação do solo, requisitos para o desenvolvimento econômico do agronegócio. No caso do Paraná, a perda de água de qualidade significa redução direta nas safras de feijão, café, laranja, cana-de-açúcar e milho.

Muito se tem falado acerca dos efeitos ecossistêmicos negativos que a reabertura da Estrada do Colono irá acarretar. Apesar das denúncias serem completamente acertadas, permanece a conhecida oposição entre sustentabilidade versus desenvolvimento econômico. Além de ultrapassada por desconsiderar o ideal de desenvolvimento sustentável, essa oposição carrega a impressão de que o atentado ao meio ambiente produz bons resultados econômicos.

O exemplo do PLC 61/2013 demonstra o contrário. Tem-se aí uma proposição que, além de seguir na contramão dos compromissos de proteção ambiental, piora o cenário econômico. Como destaca o presidente da Abrampa, Alexandre Gaio, “não se trata, portanto, de proposta legislativa apta a conciliar a preservação ambiental e os interesses econômicos imediatos de uma parcela pequena da população. Trata-se, pura e simplesmente, de retrocesso na proteção ambiental, o que não se pode admitir”.

Tentam reabrir a Estrada do Colono, mas esqueceram de que quem segue por este caminho chega atrasado.

Gustavo Martinelli é advogado e mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento. Pesquisa a captura de interesses públicos por interesses privados.

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