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O ministro do STF Gilmar Mendes.
O ministro do STF Gilmar Mendes.| Foto:

De nada adiantaram os votos de Marco Aurélio Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, e de Luiz Fux, presidente da corte, no encerramento do julgamento que confirmou a suspeição do ex-juiz Sergio Moro no caso do tríplex do Guarujá, em que o ex-presidente Lula havia sido condenado por corrupção e lavagem de dinheiro. Quando os dois votos finais, favoráveis a Moro, foram proferidos, já havia maioria formada pela suspeição – o placar apenas mudou de 7 a 2 para 7 a 4. No entanto, o encerramento da votação e a proclamação do resultado já tiveram consequências extremamente deletérias para a Operação Lava Jato, para o combate à corrupção e, por que não dizer, para o Brasil. Afinal, a “vingança dos corruptos”, como bem afirmou Luís Roberto Barroso, ainda não está concluída.

Atendendo a um pedido da defesa de Lula, o ministro Gilmar Mendes, declarado adversário de Moro e da Lava Jato, desferiu mais um golpe na operação já no dia seguinte ao fim do julgamento sobre a suspeição no caso do tríplex. Em caráter liminar, Gilmar estendeu a suspeição também para os processos do sítio de Atibaia e do Instituto Lula. O ministro passou a ser o relator de recursos ligados à suspeição por ter sido o autor do voto vencedor na Segunda Turma, derrotando Edson Fachin, que vinha relatando todos os casos da Lava Jato no Supremo.

A composição atual do STF vai colocando seu nome na história de forma triste, como o Supremo que está enterrando o combate à corrupção no Brasil

A liminar não tem nenhum impacto imediato sobre o status do petista: desde que o ministro Edson Fachin havia retirado da 13.ª Vara Federal de Curitiba todos os processos envolvendo Lula, remetendo-os a Brasília, o ex-presidente já não estava mais condenado no caso do sítio; o processo do terreno do Instituto Lula, por sua vez, nem havia chegado a ter sentença em Curitiba. No entanto, ela praticamente enterra qualquer esperança de ver Lula novamente condenado caso acabe confirmada pela Segunda Turma ou pelo plenário da corte. A decisão de Fachin ainda permitia que todas as provas levantadas quando os processos corriam em Curitiba pudessem ser usadas quando a Justiça do Distrito Federal analisasse a denúncia. Mas a decisão de Gilmar torna inválidos todos os atos de Moro, incluindo aqueles ligados ao conjunto probatório: tudo precisará ser refeito do zero, inclusive os depoimentos.

O ministro, assim, dá sequência à grave anomalia jurídica que a Segunda Turma criou. Assim como os zumbis da ficção se multiplicam, também estão se proliferando os “recursos zumbis”: aqueles que são impetrados dentro de ações nulas, ou seja, que não existem, e por isso também eles seriam nulos, embora continuem sendo julgados. A lógica básica diz que, no momento em que Fachin anulou o processo do tríplex, o habeas corpus que pedia a suspeição de Moro perdera o objeto, pois a ação toda já não existia mais. Da mesma forma, como também os processos do sítio e do Instituto Lula haviam sido anulados, o recurso sobre a suspeição também deixava de existir. Mas, quando resolveu julgar o HC da suspeição mesmo assim, a Segunda Turma e, depois, o plenário criaram a figura do recurso que sobrevive à extinção do processo onde ele está inserido. Sendo Gilmar Mendes o autor intelectual da bizarrice no caso do tríplex, não surpreende que ele não visse problema algum em seguir adiante nos casos do sítio e do Instituto Lula.

E assim, de decisão em decisão, a composição atual do STF vai colocando seu nome na história de forma triste, como o Supremo que está enterrando o combate à corrupção no Brasil. Desde os embargos infringentes do mensalão, passando pelo fim da prisão após condenação em segunda instância, pelas anulações de condenações da Lava Jato baseadas na ordem de entrega de alegações finais, e chegando à extinção dos processos de Lula e à suspeição de Moro, é raro o ministro que não tenha contribuído ao menos com algum voto, isso quando não foi decisivo para o resultado – caso, por exemplo, das mudanças de opinião de Gilmar Mendes, que era favorável à prisão em segunda instância em 2016 e se tornou contrário em 2019; ou de Cármen Lúcia, contrária à suspeição de Moro em 2018 e favorável em 2021. Ainda que os ministros não sejam movidos por nenhuma intenção espúria e acreditem estar fazendo o que é certo, o fato é que o conjunto das recentes decisões do STF está inegavelmente desmontando o combate à corrupção no Brasil e fazendo da instância máxima da Justiça brasileira uma promotora da injustiça e da impunidade.

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